Folha de S. Paulo
Guerra econômica contra Putin começa a
afetar também países do Ocidente
Estados
Unidos, União
Europeia e aliados declararam guerra
econômica contra a Rússia. Mas tentaram evitar tiros que saíssem pela
culatra, como proibir a compra de petróleo, gás e grãos russos, o que faria o
preço dessas commodities explodir.
Não daria certo, em geral. Algum tumulto
econômico mundial haveria. Mas não está dando certo também no caso de energia e
comida.
Os preços de petróleo, trigo,
milho, por tabela o da soja e das carnes, estão subindo muito não apenas por
medo do futuro. Estão subindo porque empresas
e bancos do "Ocidente" evitam negócios com a Rússia por
conta própria, mesmo sem sanções de seus governos.
EUA, UE e aliados confiscaram o dinheiro que os russos guardam no exterior, as reservas internacionais que qualquer país tem. Proibiram os negócios de suas empresas e finanças com os maiores bancos russos. Vão até comprar armas para que ucranianos matem russos. Mas permitem negócios com energia, agricultura, remédios, equipamentos médicos etc.
Por conta, empresas deixam de comprar
energia na Rússia. O barril do Urais, "marca" de petróleo russo, está
sendo vendido a 11% menos que o Brent, "marca" negociada em Londres e
preço de referência mundial. Isso quer dizer que tem petróleo russo sobrando,
mesmo em um mercado mundial apertado.
Por falar nisso, o Brent subiu mais de 9%
nesta terça, para US$ 107, alta de 38% só neste ano.
Empresas e bancos americanos e europeus
temem negócios com a Rússia. Temem fazer operação que possa ser considerada
ilegal pelos governos de seus países. Temem calote, pois a Rússia pode ficar
sem moeda "forte" para pagar as contas; asfixiada, impõe cada vez
mais controles de capitais: medidas para impedir a saída de dólares, euros etc.
Por vezes, as empresas não conseguem crédito
para financiar suas compras. Ou não podem pagar o seguro contra calotes ou o de
transporte ou o frete marítimo, carésimos. Navios nem passam pelos portos de
Ucrânia e Rússia no Mar Negro, bloqueados pela marinha de guerra; navios
mercantes já levaram tiro. As maiores fretadoras do mundo já disseram que vão
evitar portos russos.
As exportações bloqueadas de grãos pelo mar
Negro, embora pequenas nesta época, pressionam os preços. Mais importante, há o
risco de que grãos russos saiam do mercado, de que a Ucrânia não consiga fazer
seu plantio ou de que falte fertilizante no mundo inteiro.
Rússia e Ucrânia vendem 30% do trigo no
mercado mundial, 20% do milho. A Rússia é o maior exportador de fertilizante.
Tem quase 8% do mercado de exportações de petróleo (dado de dezembro). A
asfixia financeira russa pode dar em calote da dívida externa, o bastante para
causar acidentes.
As taxas de juros da dívida de governos dos
EUA e da Europa caíam muito nesta terça-feira. Isto é, investidores mais
compram do que vendem esses títulos. Procuram um ativo seguro, no tumulto.
Também acreditam que a guerra vai conter o crescimento econômico, levando os
bancos centrais de EUA e da União Europeia a serem mais comedidos na campanha
de alta de juros para combater a inflação já bem alta.
Mas a inflação não vai subir mais, dado o
choque de preços? Não subiria mais, sem alta de juros? A desaceleração
econômica provocada pela guerra será suficiente para conter a carestia? Os
argumentos parecem disparatados.
Em suma, mesmo tratando apenas do
curtíssimo prazo, o mundo virou do avesso em poucos dias e ainda vai ser muito
retorcido nos tempos por vir. De mais imediato, o que se pode dizer é que os
tiros da guerra contra Putin em parte são um bumerangue contra o
"Ocidente".
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