O Globo
Economistas de bancos e consultorias esperam
um corte de pelo menos R$ 35 bilhões nas novas medidas a serem anunciadas pelo
governo
O que seria um bom resultado para as medidas
de ajuste a serem anunciadas? Um número que ouvi em um grande banco foi de R$
35 bilhões de corte, desde que não incluísse o que foi cortado anteriormente no
orçamento do ano que vem, ou seja, os R$ 25 bilhões já anunciados. Mas há
economistas que esperam R$ 50 bilhões. O que se deseja é que a trajetória da
dívida, em algum momento, se inverta. No dia de ontem, de expectativa do
anúncio das medidas de ajuste, a bolsa subiu, o dólar e os juros futuros
caíram, apesar da alta da Selic que acontecerá na quarta-feira. Mas, em relação
aos indicadores financeiros, tudo pode mudar. Ou seja, a queda de ontem é parte
da volatilidade.
Uma medida aguardada é que o acesso ao Abono Salarial seja pela renda familiar e não pela renda individual. Isso aumentaria o foco do programa, que sempre foi criticado pelos economistas como pouco focado. Outra medida aventada é o aumento da parcela do Fundeb incluída no cálculo do piso da educação, que hoje é de 30% e poderia ir para 50% ou 60%. Isso não é corte em si, mas uma flexibilidade maior do orçamento.
Outra proposta discutida com frequência é a
de estabelecer o teto de 2,5% de aumento real de todas as despesas porque isso
adequaria a dinâmica dos gastos àquela permitida pelo arcabouço fiscal, que
condiciona esse aumento a uma elevação ainda maior da receita. Isso seria
estrutural, positivo, mas com ressalvas.
— É importante definir o que entra ou não
nesse sublimite de 2,5%. Se a despesa com pessoal for incluída, há risco de
aumento. Hoje, essas despesas nem chegam a esse percentual, mas, se forem
incorporadas, podem estimular novos reajustes além dos já concedidos este ano,
abrindo espaço para mais aumentos nos próximos anos. O ideal seria que saúde e
educação, que atualmente crescem 100% da receita do governo, estivessem dentro
desse limite de 2,5% — explica um economista de um grande banco.
O Benefício de Prestação Continuada (BPC)
está crescendo a 15% este ano. Se ele for submetido ao novo limite, esse
aumento explosivo de concessão de novos benefícios poderia ser contido. Desde
que venham a funcionar as medidas anunciadas anteriormente como controle das
fraudes com uso de biometria e cruzamento mensal de dados.
— Do contrário, as despesas seriam apenas
adiadas. Simplesmente adia-se esse acesso ao BPC e pode gerar uma fila — disse
outro economista.
Os economistas de bancos e de consultorias
não querem comentar sobre o assunto enquanto aguardam as medidas, que foram
mais uma vez discutidas ontem em reunião no Palácio do Planalto.
O grande ponto para o qual todos olham é a
dívida pública. Em agosto, estava em 78,5% do PIB, mas a Instituição Fiscal
Independente estima que continue subindo e encerre o ano em 80%. Segundo Marcus
Pestana, diretor da IFI, se não houver mudanças estruturais nas finanças
públicas, pode chegar a 90% em 2029.
— Longe de nós acharmos que estamos à beira
do precipício, uma situação perto de Venezuela ou Argentina. Não se trata
disso. Há governabilidade, é uma situação delicada mas sob controle. Mas os
indicadores econômicos apontam nessa direção — disse Pestana.
Um dos economistas que ouvi, talvez um mais
otimista, disse que, pela primeira vez, nota-se na sociedade brasileira, e no
Congresso, um amadurecimento da percepção de que é preciso mexer na rigidez
orçamentária. Há vários grupos mesmo de diferentes tendências olhando essa
questão, até porque quem não é governo, espera ser um dia. E essa rigidez tira
a possibilidade de administrar o país.
Outro economista me alertou que o país vai
terminar o ano com um resultado primário melhor do que o mercado esperava no
início do ano, mas lembra que é preciso tirar a incerteza em relação ao
cumprimento dos 2,5% de limite para o crescimento da receita acima da inflação.
A torcida, disse ele, é para que “as medidas mostrem que o arcabouço fiscal
será respeitado e que tenhamos apoio político para aprovar as medidas”.
Pelo que ficou demonstrado ontem, a
preparação do conjunto de medidas de ajuste está na sua reta final. No governo,
o que se ouve é que serão medidas que terão efeito mais prolongado no tempo e
que vão mexer na estrutura do crescimento das despesas públicas. Mas prefere-se
não adiantar nem confirmar as medidas específicas, para que não haja reação
antes de serem anunciadas e explicadas.
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