Folha de S. Paulo
Um espectro sempre acompanhou o bolsonarismo,
o de que a força pode se impor sobre as instituições
Realisticamente, contudo, ele ainda detém uma
carta poderosa: a escolha de seu sucessor em 2026
Foi um anticlímax. Veio num momento em que
ninguém esperava, cedo da manhã
do sábado, dias antes do aguardado "transitado em
julgado". Flávio
Bolsonaro conclamara os militantes
para uma vigília, uma "luta" espiritual pedindo ao
"Senhor dos Exércitos" que corrija os erros da Justiça humana.
Mas não deu tempo
de colocar as tropas em posição. As câmeras da mídia também não
estavam prontas. A prisão de Jair
Bolsonaro em nada lembrou o espetáculo da prisão de Lula em
abril 2018 na sede dos metalúrgicos, quando uma multidão veio defender o
ex-presidente e dificultar o trabalho da polícia.
A ordem de Alexandre de Moraes foi correta. A aglomeração de defensores fora do condomínio poderia gerar tumulto e violência. Além disso, Bolsonaro tentou violar a tornozeleira com um ferro de solda. Não está claro se houve algum plano mirabolante ou se —o que é mais provável— foi puro fruto de um surto psiquiátrico. Seja como for, o mais seguro para todos os envolvidos —especialmente Bolsonaro— é o que aconteceu: sua transferência para a superintendência da PF com o devido acompanhamento médico constante.
Em todos os casos, o desfecho foi o mesmo: o
bolsonarismo teve que engolir a derrota. Agora com a prisão do ex-presidente,
quem sabe sua legião de seguidores possa finalmente entender: o Brasil tem
instituições sólidas; elas podem errar, mas há caminhos legítimos internos a
elas que permitem a correção dos erros. Tentar derrubá-las pela força das armas
ou das multidões é uma estratégia fadada ao fracasso e que cobra um preço alto
de quem tenta.
A prisão preventiva neste momento só piora as
chances de Bolsonaro conseguir a transferência para a prisão domiciliar uma
vez que comece a cumprir a pena. Caso se verifique que sua saúde segue estável
na cela, será um motivo para mantê-lo lá. O exemplo recente de bolsonaristas
fugitivos —Carla
Zambelli, Eduardo
Bolsonaro, Alexandre
Ramagem— também pesa sobre a credibilidade de nosso Judiciário.
Que Bolsonaro cumpra sua pena em paz e consiga sua progressão de regime no
tempo certo. Minha torcida pessoal é que a direita brasileira vire essa página
e busque outras lideranças. Realisticamente, contudo, ele ainda detém uma carta
poderosa: a escolha de seu sucessor em 2026. Todos os acontecimentos contra si
e contra seus filhos só aumentam nele o veio paranóico, que o leva a se fechar
no único núcleo duro em que confia: seus familiares, os mesmos que o empurram
cada vez mais fundo no abismo. Os eleitores de direita seguirão abraçados a
ele?

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