segunda-feira, 24 de novembro de 2025

Só a busca por blindagem une o bolsonarismo e o Centrão, por Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Grupo político mais renhido do entorno de Bolsonaro parece ter visto uma senha para a resistência

A perspectiva de que viesse a perder a possibilidade de uma prisão domiciliar, pelo indício de fuga, é suficiente para o ex-presidente ter mudado a versão sobre sua motivação para a violação da tornozeleira de “curiosidade” para “alucinação”. Se a mudança de versão não lhe devolverá, tão cedo, a chance de ficar preso em casa, tampouco será suficiente para arrefecer a resistência do bolsonarismo a uma candidatura única do campo da direita.

Por mais desmoralizante que a história da tornozeleira possa parecer, e o silêncio dos advogados sobre a violação é reveladora, a “paranoia” da qual Jair Bolsonaro se diz possuído reforça a vitimização como narrativa. Um dos poucos a se pronunciar sobre o tema, a partir do depoimento do ex-presidente na audiência de custódia, foi o influenciador Paulo Figueiredo.

Dos EUA, onde está foragido e, em parceria com o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), arrancou o tarifaço contra o Brasil, disse que ali estava a evidência da “tortura psicológica” a que Bolsonaro estava sendo submetido. Da apologia da tortura na ditadura a “vítima” dela, o ex-presidente é um personagem desnorteado sobre os rumos a tomar na preservação do seu legado.

O que tenderia a acontecer, com o apoio do ex-presidente a um nome do Centrão, é a diluição do seu grupo político com a absorção do 22 pelo candidato a presidente da República à direita que vier a representá-lo. O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, não cansa de oferecer a legenda ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Diluído na legenda, o bolsonarismo terá dificuldade de manter a identidade de sua bancada na Câmara e no Senado e as bandeiras que a têm motivado, como a anistia.

A prisão preventiva é mais uma provação no martírio que está passando”

— Ciro Nogueira

A volta à cena do pastor Silas Malafaia, um dos nomes mais resistentes à liderança do bolsonarismo por um nome do Centrão, é uma demonstração de que o grupo político mais renhido do seu entorno viu, no episódio, uma senha para a resistência. Malafaia, que andava afastado de Bolsonaro desde que virou alvo da ação que apura a obstrução de justiça no processo da tentativa de golpe, veio a público no fim de semana para defender a vigília com o escudo da “liberdade religiosa”.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que conclamou a vigília e foi o primeiro a esboçar esta tese, pode até virar alvo do ministro Alexandre de Moraes se comprovada a hipótese de que a pretendida aglomeração visava a facilitar uma fuga. Neste caso, porém, ainda sobraria a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, que veio a público no dia da prisão, a partir de Fortaleza, onde participaria de um evento do PL Mulher, para defender o marido.

Com uma camiseta cor de rosa estampada com a sigla do seu partido, Michelle gravou um vídeo sereno em que chegou a dizer que Alexandre de Moraes e sua família mereciam sua bênção. Neste vídeo, chamou Bolsonaro de líder do “exército do bem” e disse que travaria a “guerra do bem contra o mal” em sua defesa.

O Centrão continua a investir no apoio do bolsonarismo a um candidato do seu campo com o argumento de que, unidos, derrotariam a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Uma vez no poder, um candidato eleito deste campo concederia, de bate-pronto, um indulto. É isso que justifica a profusão de depoimentos de lideranças do Centrão em defesa de Bolsonaro e críticos à prisão, todos devidamente rebatidos pela militância bolsonarista com a cobrança sobre a contribuição de sua inação para aquele desfecho.

“A prisão preventiva é mais uma provação no martírio que está passando. Toda nossa solidariedade a ele e a seus familiares. Mitos não sucumbem a violências. São eternizados por elas”, escreveu o senador Ciro Nogueira (PP-PI) em suas redes sociais.

Com o avanço das investigações da Polícia Federal sobre a lavagem de dinheiro do crime organizado que vão da operação Carbono Oculto ao banco Master, a necessidade de blindagem do Centrão é quase tão robusta quanto aquela que acomete o bolsonarismo. Se o bloco tem no apoio de Bolsonaro a única chance de rivalizar com Lula, o avanço das investigações tornou a necessidade deste apoio ainda mais imperiosa.

Tome-se, por exemplo, o alerta da violação da tornozeleira eletrônica. Foi emitido pela diretora-adjunta da Secretaria de Administração Penintenciária do Distrito Federal, Rita de Cássia Siqueira, sem nenhuma interferência do governador Ibaneis Rocha. No 8 de janeiro de 2023, Rita de Cássia também tentou cumprir seu dever, e foi até condecorada por isso, mas, naquela ocasião, a atuação de alguns policiais no cumprimento do seu dever não foi capaz de reverter a omissão do governador e de sua Polícia Militar, cujo ex-comandante está preso, que facilitou a invasão dos Poderes.

Alvo potencial da operação do Master, pela tentativa de compra deste banco pelo BRB, Ibaneis, desta vez, está recolhido. O Centro Integrado de Monitoração Eletrônica da Secretaria de Administração Penitenciária fez seu trabalho sem óbices. Não dá para negar que as instituições estão funcionando. E não apenas porque Jair Bolsonaro está para começar a cumprir os 27 anos de prisão a que foi condenado.

 

Nenhum comentário: