O tempo está cada vez mais curto para o Congresso responder à pergunta que continua posta: depois de tudo que houve nas ruas, nas eleições do ano que vem teremos alguma mudança nas regras ou apenas mais do mesmo? Os movimentos em torno da reforma política foram retomados esta semana, dentro e fora da Casa, pelos que defendem uma coisa e outra. No sentido inercial, a comissão interpartidária criada pelo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, fará reunião hoje tentando definir o pouco que será votado. De fora para dentro, o Movimento Eleições Limpas, composto por 51 entidades, começa a ganhar adeptos para o projeto de reforma política do juiz Márlon Reis, o mesmo que deflagrou a campanha que levou à votação da Lei da Ficha Limpa.
Nesta altura, já ninguém acredita que o Congresso, depois de refugar o plebiscito proposto pela presidente Dilma, tomará a iniciativa de aprovar mudanças fundamentais que vigorem já em 2014, o que teria de ser feito antes de 4 de outubro. O próprio PT, que oficialmente levanta a bandeira da reforma política, saiu rachado de reunião anteontem. Metade da bancada ficou com o deputado Cândido Vaccarezza, coordenador da citada comissão e defensor da chamada minirreforma eleitoral. Na prática, mudanças para que tenhamos mais do mesmo com mais facilidade. Outros se perfilaram com o deputado Henrique Fontana, relator da reforma que a Câmara enterrou em abril, para quem o partido devia cobrar do presidente da Câmara a votação de pontos cruciais, como o financiamento de campanhas. Ele é um dos que foi ontem à reunião do Eleições Limpas na Câmara e passou a apoiar a proposta do juiz Márlon Reis e seus pares. “Por que o presidente da Câmara não pauta o projeto do Eleições Limpas para a primeira quinzena de setembro? Teríamos a reforma possível. Quem quiser que vote contra ou aprove e destaque”, diz Fontana. Outro que foi à reunião e abraçou a proposta foi o deputado Miro Teixeira: “A proposta é boa, mas a Casa terá que levar um empurrão de fora”, diz ele. Quase 30 parlamentares de diferentes partidos apoiam a proposta, já apresentada a Dilma, que continua pregando a favor da política.
A proposta de Márlon Reis, o juiz maranhense que, como um Quixote, começou a coletar assinaturas garantindo a votação da Ficha Limpa pouco antes do prazo para a eleição do ano passado, é diferente de tudo o que já tramitou no Congresso sobre o tema, mas ataca os principais vícios do sistema. Para começar, não seria preciso aprovar nenhuma emenda constitucional, só projetos de lei, o que é bem mais simples. Em relação ao financiamento de campanhas, o projeto proíbe doações de empresas e limita a R$ 700 as doações de pessoas físicas, que teriam de ser feitas por transferência bancária ou cartão, sem duplicidades. Haveria também um fundo público, que seria distribuído aos partidos, proporcionalmente ao tamanho das bancadas, reservando-se 5% dos recursos aos partidos sem representação no Congresso. Tal sistema misto talvez não evitasse o caixa dois, como diz Fontana, mas certamente favoreceria a renovação da classe política, permitindo a eleição de candidatos sem dinheiro ou sem amigos empresários para financiar suas campanhas.
O tempo de televisão continuaria sendo calculado como hoje, com base no tamanho das bancadas, mas cada coligação disporia apenas do tempo do partido que tem a cabeça de chapa. Isso já liquidaria com boa parte das alianças espúrias e dos negócios eleitorais ocultos.
O terceiro ponto mexe com o sistema eleitoral, o modo de eleger deputados e vereadores. Nem mantém o sistema atual nem adota a lista fechada, mas um caminho do meio. Os deputados seriam eleitos em dois turnos. No primeiro, cada partido apresentaria seu programa e uma lista de nomes equivalente ao dobro das vagas em disputa. Os eleitores votariam nos partidos, e os votos recebidos indicariam, como no sistema de lista fechada, quantas cadeiras o partido conquistou. No segundo turno, cada partido reapresentaria sua lista de nomes, equivalente ao dobro das cadeiras conquistadas. O eleitor voltaria à urna para escolher o nome de sua preferência. Os mais votados seriam os eleitos. Muito original. Vincula o candidato ao partido e permite ao eleitor exercer a preferência nominal. Os eleitos poderão mudar de partido, mas perderão o mandato. E nem pensar em levar para a outra sigla a fração de tempo de tevê e o fundo partidário.
Com essas mudanças, já teríamos um mundo eleitoral bem melhor. Mas, para que fosse aprovado, os manifestantes de junho teriam que voltar às ruas, levantando cartazes a favor da reforma política.
Pescoço de cada um
Muito já foi contado sobre o encontro de cúpula PT-PMDB, na segunda-feira, buscando meios para salvar a aliança entre os dois partidos. O PMDB foi duro ao apontar o desinteresse da presidente, que será a candidata, em tratar das questões eleitorais nos estados. Sobre o tema, o senador Jáder Barbalho, segundo participantes, soltou a frase mais cáustica da noite. “Nos estados, se for preciso escolher, ninguém deixara de cuidar do próprio pescoço para salvar o dela, por bonito que seja.”
Ganho na oposição
Na guerra dos vetos, que o governo venceu porque negociou, quem lavou um tento na oposição foi o deputado Mendonça Filho, do DEM-PE. Dilma vetou, na lei do Prouni, artigo de autoria dele, incluindo as faculdades municipais no programa. O Planalto negociou com ele o apoio ao veto sob a promessa de aprovar, em regime de urgência, projeto garantindo aos alunos dessas faculdades o acesso ao Fies. No Brasil profundo, as prefeituras mantêm centenas de faculdades. Não podendo bancá-las totalmente, cobram parte dos alunos. O deputado do DEM discursou a favor do veto.
Fonte: Correio Braziliense
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