Processo de impeachment tem força nas ruas, devido ao abandono em que está a cidade
A aprovação da abertura do processo de impeachment contra o prefeito Marcelo Crivella, algo inédito no Rio desde o fim da ditadura militar, há 34 anos, é mais um fato que reforça a ideia de degradação exposta pela política praticada na cidade e no estado.
Inquéritos, julgamentos e prisões têm sido frequentes, como nunca no passado na democracia. Algo salutar, porque significa que as instituições reagem, mas não deixa de ser reflexo do baixo padrão ético da administração pública.
O processo foi instaurado por 35 votos a 14, quórum de cassação, com base em denúncias de que o prefeito prorrogou indevidamente um contrato de exploração do mobiliário urbano por empresa privada. A incorreção está capitulada na legislação e pode ser punida com a perda de mandato.
Prosseguirá a discussão sobre a denúncia, em termos quase sempre distantes do entendimento da população, para a qual o que condena Crivella é o conjunto da obra de sua gestão: despreocupação com a cidade, descaso com suas raízes culturais, desprezo com projetos importantes de revitalização de áreas degradadas (o Porto e o Centro) e ausência de manutenção mínima dos logradouros. Faltam, também, iniciativas para enfrentar problemas financeiros sérios na saúde, setor estratégico, e até mesmo na coleta de lixo.
O delito na prorrogação de um contrato de empresa, inclusive em dívida com a prefeitura, é grave. Mas, para a cidade e os cariocas, o delito maior é terem sido abandonados pelo poder público.
Processo de impeachment tem ritos legais, necessita estar lastreado em fatos, mas depende da política. É o que aconteceu com a petista Dilma Rousseff no Congresso. Embora fosse flagrante e sério o crime de responsabilidade cometido ao manipular as contas públicas, a fim de escamotear o descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, foi ao desprezar o Legislativo que a petista queimou as naus que a levariam à terra firme.
No caso do Rio, a crise também deriva da imperícia do prefeito em gerenciar sua base. Não se desconhece que a Câmara de Vereadores, chamada de “Gaiola de Ouro”, é parte da degradação da política carioca e fluminense: milicianos eleitos e presos, infiltração do crime organizado em geral, corrupção e encarceramento de parlamentares etc.
Neste contexto, o pedido de impeachment, pela ótica do cidadão, deve ser visto como uma chance de melhorias na desastrosa administração da cidade. Mas não há esperanças de que, caso ocorra o impedimento de Crivella, seja feita uma faxina ética, e avancem os costumes no exercício da política.
É apenas uma oportunidade de troca de inquilinos no Palácio da Cidade. Não é pouco, porque, se ocorrer, será a reafirmação do estado de direito. Servirá de alerta aos próximos prefeitos, mas mudanças de fundo dependerão de eleições.
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