O Globo
O ministro da Defesa e os comandantes das
Forças Armadas publicaram dura nota criticando o senador Omar Aziz, presidente
da CPI da Covid, que disse que o “lado podre das Forças Armadas” estaria
“envolvido com falcatrua dentro do governo”. Na nota, os militares consideraram
a declaração de Aziz “grave”, “infundada” e “irresponsável”, porque seria
generalizante.
A resposta da Defesa é preocupante de
muitas maneiras. Em primeiro lugar, quando Aziz falou de “lado podre”, ele não
generalizou. Referiu-se apenas a uma parte das Forças Armadas. Aparentemente,
os militares não aceitam que se fale de banda podre; quando muito, admitem que
existam “casos isolados”.
Além disso, a nota da Defesa conclui com
uma ameaça, totalmente fora de tom, dizendo que “as Forças Armadas não
aceitarão qualquer ataque leviano”. Em entrevista ao GLOBO, o brigadeiro
Baptista Junior, comandante da Força Aérea, preferiu deixar no ar o que quis
dizer com “não aceitar”.
Por fim, os militares preferiram atacar os críticos da corrupção a tomar distância daqueles que parecem ter tentado desviar dinheiro da compra de vacinas. É difícil entender como essa nota autoritária, arrogante e corporativa ajude a preservar a imagem das Forças Armadas.
Quando um grande número de militares entrou
no governo em 2019, argumentou-se que havia nas Forças Armadas uma grande
quantidade de talentos que não vinham sendo aproveitados pelo serviço público
brasileiro por puro preconceito dos governos civis pós-1985.
O argumento dizia que os militares poderiam
contribuir para o país muito além das áreas de defesa e segurança, emprestando
suas competências para a infraestrutura ou para a comunicação —mais ou menos
como o Itamaraty vinha fazendo em áreas como economia e cultura. Essa
participação em governos civis poderia ajudar a superar os traumas do regime
militar e normalizar a participação de ex-militares na vida nacional, como
acontece nos EUA.
O que aconteceu com o governo Bolsonaro foi
outra coisa. Ele trouxe um grande número de militares para o governo — cerca de
6 mil, mais do que o dobro de governos anteriores — e apresentou essa elevada
participação como se a corporação estivesse diretamente engajada em seu projeto
político.
Se as Forças Armadas não querem ser
estigmatizadas como corruptas, não fazem um bom serviço publicando notas
arrogantes e corporativas como a da última quarta-feira.
É do interesse de todos os brasileiros que
as Forças Armadas tenham uma imagem consolidada como confiáveis e
profissionais. Para isso, os militares precisam dissociar sua imagem daquela de
parceiros e garantidores das aventuras radicais e autoritárias do governo
Bolsonaro. Têm ainda de estar preparados para cortar na carne se confirmarem-se
as gravíssimas acusações de que Pazuello ou Elcio Franco estiveram envolvidos
em corrupção no Ministério da Saúde.
Quem tão efusivamente se indignou com a corrupção de governos passados não pode passar a mão na cabeça de escroque que desviou dinheiro de vacina.
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