Folha de S. Paulo
Destruição institucional avança com reação
tímida a ameaças de Bolsonaro e militares
Em fins de 2017, donos do dinheiro e outras
elites normalizavam
Jair Bolsonaro.
O capitão da extrema direita não se tornou apenas uma variável política do
cálculo financeiro, mas uma alternativa aceitável, a segunda opção para
derrotar o PT, e foi então tratado como alguém que pudesse integrar o convívio
democrático.
Em meados de 2021, corremos o risco de
normalizar a ideia de golpe contra a democracia, graças à omissão, à conivência
ou à militância de parte dessas elites e também a outros problemas de uma
sociedade politicamente desorganizada.
Não é o caso de alertar para a gestação de um golpe de fato, da mudança de instituições pela força bruta ou do fim da possibilidade de alternância de poder. Não há condições políticas, sociais e talvez nem mesmo militares para tanto, por ora. Trata-se de notar a inclusão definitiva da promessa de golpe no projeto bolsonarista de destruição do Estado. É mais do que desgoverno. Basta dar o exemplo da tentativa de Bolsonaro de arruinar duas competências emblemáticas do país, o sistema de vacinação e o voto pela urna eletrônica. Mais do que tentativas, já há sucessos, vide a partidarização das Forças Armadas.
Além dos oficiais embarcados no governo,
agora também os comandantes militares subscrevem a baderna e a subversão de
Bolsonaro, que engaja a tropa com salários, boquinhas e promoção da ditadura
militar e da tortura. Como será possível governos democráticos conviverem com
um Partido Militar?
O risco de normalização da ideia de golpe
ficou evidente na fraqueza da reação à ameaça de Bolsonaro contra a eleição de
2022 e dos militares contra o Senado. Foram três dias de arreganhos
autoritários. A única reação maior veio de Luís Barroso, ministro do Supremo e
presidente do TSE. Rodrigo Pacheco (DEM-MG), presidente do Senado e
colaboracionista contumaz, levou uma prensa de senadores e foi obrigado a dar
uma “declaração de repúdio”.
Afora o caso de Barroso, que falou em “crime de
responsabilidade”, não houve atitude enérgica e menos ainda prática
contra a promoção do golpe. Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara e ora
cúmplice maior de Bolsonaro, sumiu até este sábado (10) para então aparecer com
a desconversa hipócrita de que “o Brasil será sempre maior do que qualquer
disputa política” (para Lira, golpe é “disputa política”).
Não houve reação organizada dos partidos,
afora uma nota protocolar pusilânime de legendas em geral colaboracionistas. As
elites das “cartas de repúdio” e os “empresários que articulam” calaram-se e
nem têm organização para reagir.
Na semana passada, articulavam apenas a
derrubada de mais uma incompetência grosseira de Paulo Guedes, essa reforma
grotesca e daninha do Imposto de Renda (com o que querem,
também, derrubar alta de impostos para ricos, item central do “Pacto do Pato
Amarelo” que ajudou a depor Dilma Rousseff).
As “ruas” estão prejudicadas pela epidemia,
mas também pela divisão partidária ou eleitoreira dos protestos. Além do mais,
a ruína da intermediação política tradicional desorganiza ou dificulta a
mobilização contra autoritarismos e abusos. A militância microcapilarizada nas
mídias sociais ou de organizações sociais muito descentralizadas não dá conta
de formar um movimento prático contra a maré autoritária.
Por um motivo ou outro, o Brasil se acomoda
à ideia de que é possível empurrar com a barriga a ameaça golpista, até a
eleição. Bolsonaro e militares, por sua vez, promovem a ideia de que o país
deve “andar na linha” se não quiser levar um tiro. Isto já é golpe, destruição
institucional, crime.
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