sábado, 6 de dezembro de 2025

Opinião do dia – Antonio Gramsci

“Referências ao senso comum e a solidez de suas crenças encontram-se frequentemente em Marx. Contudo, trata-se de referências não à validez do conteúdo de tais crenças, mas sim a sua solidez formal e, consequentemente, à sua imperatividade quando produzem normas de conduta. Aliás, em tais referências, está implícita a afirmação da necessidade de novas crenças populares, isto é, de um novo senso comum e, portanto, de uma nova cultura e de uma nova filosofia, que se enraízem na consciência popular com a mesma solidez e imperatividade das crenças tradicionais."

Antonio Gramsci (1891-1937), Cadernos do Cárcere, 4ª Edição, v,1, p.118. Editora Civilização Brasileira, 2006.

 

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Descaso com crise fiscal contamina Orçamento de 2026

Por O Globo

Acordo entre Congresso e governo amplia gastos em ano eleitoral, desprezando custo para o país

O descaso do governo e do Congresso com a crise fiscal ficou flagrante na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2026 aprovada nesta semana. É como se, em Brasília, as leis gravitacionais que regem a economia tivessem sido revogadas, e a classe política vivesse num universo paralelo, onde as despesas pudessem subir até a estratosfera, o dinheiro crescesse feito mato em meio à grama da Praça dos Três Poderes, e o contribuinte estivesse sempre disponível para arcar com tudo, sem custo para o crescimento e o desenvolvimento do país.

O Judiciário mais forte do mundo, por Thaís Oyama

O Globo

Faz tempo que ‘forte’ deixou de ser adjetivo inocente. Passou a servir de aposto a políticos como Trump, Putin, Orbán, Erdogan

Alexandre de Moraes disse que “não há no mundo Poder Judiciário tão forte quanto o do Brasil”. O devaneio napoleônico do ministro do STF foi proclamado em evento nesta semana para explicar à plateia por que motivo o Judiciário sofre ataques contínuos de seus “inimigos”. É, segundo Moraes, uma reação proporcional à grandeza da instituição — que ele poderia ter enaltecido como “atuante", “independente”, “inquebrantável” ou outra dezena de adjetivos de que seu vasto vocabulário de juiz certamente dispõe. Preferiu dizer que é porque o Judiciário brasileiro é “forte” — segundo ele, o mais forte das galáxias.

Faz tempo que “forte” deixou de ser um adjetivo inocente. Na tradição da ciência política que fala em “Estados fortes” e “Estados fracos”, os Estados Unidos da Guerra Fria eram o modelo de Estado fraco, por ser descentralizado e baseado no sistema de freios e contrapesos. O Estado forte por excelência era a União Soviética: centralizado, opaco, autoritário.

A crise mais urgente, por Flávia Oliveira

O Globo

O país sempre foi território hostil às pessoas do sexo feminino, mas a brutalidade alcançou patamar inaceitável neste 2025

A despeito do esforço dos homens dos Poderes em buscar holofotes para o permanente estado de crise entre Executivo, Legislativo e Judiciário, não há nada mais urgente no Brasil do que a epidemia de violência contra mulheres. O país sempre foi território hostil às pessoas do sexo feminino, mas a brutalidade alcançou patamar inaceitável neste 2025, em que agressões e assassinatos, em vias públicas, são filmados e exibidos em looping sem que Lulas, Alcolumbres, Mottas e Gilmares interrompam as picuinhas de Brasília em socorro ao grupo populacional que é maioria na população, no eleitorado e no comando das famílias. O Ministério da Justiça registra quatro feminicídios, sete homicídios, 196 meninas e mulheres vítimas de estupro a cada dia. E o país segue funcionando como se violentadas elas não fossem.

Quatro mortes e uma prisão, por Eduardo Affonso

O Globo

Instituições psiquiátricas, não para prender, dopar ou isolar, mas para socorrer, teriam salvado João e Gerson de si mesmos

Os personagens desta crônica se chamam Leona, Layse, Allane, Gerson e João. Deveria haver também um anjo, mas este só costuma aparecer nas narrativas sobrenaturais, e estamos no Brasil, no âmbito do surreal. Desses cinco, quatro estão mortos — e a sobrevivente continua condenada à prisão perpétua, sem ter jamais cometido crime algum.

Layse e Allane morreram por ser mulheres — o que, pela legislação, não é conduta passível de pena capital. Mas calhou de seu caminho profissional cruzar o de João, que padecia de uma doença severa e não tratada — cujo nome foi tão banalizado que perdeu a gravidade: misoginia.

Flávio Bolsonaro se lança à Presidência com aval do pai

O Globo

Por Luísa MarzulloLauriberto PompeuGabriel Sabóia e Jeniffer Gularte 

Centrão frustrado, apoio da família e silêncio de Tarcísio: tudo sobre o anúncio da candidatura de Flávio Bolsonaro

Senador diz ter sido escolhido por Bolsonaro para disputar o Planalto em 2026

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) anunciou nesta sexta-feira (5) ter sido escolhido pelo pai, Jair Bolsonaro, para concorrer à Presidência da República em 2026. Com o movimento, o ex-presidente passa a centralizar, da cadeia, o projeto político de parte da oposição, além de frustrar partidos do Centrão, que buscam uma união em torno do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), para enfrentar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Na sexta, dirigentes de partidos como PP, União Brasil, Republicanos e PSD avaliavam que a indicação de Flávio, caso seja concretizada, irá isolar o bolsonarismo, levando essas legendas a adotar a neutralidade no ano que vem.

O entendimento, contudo, é que esse cenário pode ser revertido. Integrantes desses partidos acreditam que Flávio não possui musculatura para decolar em uma campanha presidencial e a iniciativa servirá para testar o sobrenome Bolsonaro na pré-campanha. Essa é a mesma leitura do Palácio do Planalto, que por enquanto comemora a desarticulação da direita.

Ungido pelo pai, Flávio Bolsonaro anuncia pré-candidatura, por Vinicius Doria

Correio Braziliense

O filho de Jair Bolsonaro, preso na Polícia Federal, anuncia candidatura à Presidência da República e diz que conta com a bênção do ex-presidente. Mercado, que torce por Tarcísio, reage, com Bolsa caindo 4,31% e dólar subindo a R$ 5,43

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) anunciou, nesta sexta-feira (5), que será o nome da família na disputa à Presidência da República, no ano que vem. Ele assegurou a aliados que a decisão foi tomada pelo pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro, que o orientou a viajar pelo país para consolidar a pré-candidatura. A escolha foi definida na última terça-feira, após Flávio visitar o pai na Superintendência da Polícia Federal em Brasília, onde cumpre pena de 27 anos de prisão por liderar uma conspiração golpista.

"É com grande responsabilidade que confirmo a decisão da maior liderança política e moral do Brasil, Jair Messias Bolsonaro, de me conferir a missão de dar continuidade ao nosso projeto de nação. Eu não posso, e não vou, me conformar ao ver o nosso país caminhar por um tempo de instabilidade, insegurança e desânimo. Eu não vou ficar de braços cruzados enquanto vejo a esperança das famílias sendo apagada e nossa democracia sucumbindo", anunciou Flávio, em uma rede social.

Convocação à classe média, por Bolívar Lamounier

O Estado de S. Paulo

É essencial que as faixas mais altas da classe média ponham mãos à obra, dando a partida para uma grande reforma de fora para dentro

Caros leitores e leitoras, penso que o Brasil tem condições de resistir a Lula e ao senador Davi Alcolumbre (União-AP), um de cada vez, mas aos dois juntos, francamente, me parece difícil.

O sr. Alcolumbre, atual presidente do Senado Federal, encarna à perfeição uma das facetas tragicômicas do nosso presidencialismo. Um único membro do Congresso ameaça derrubar ladeira abaixo todo o ajuste fiscal que a duras penas vem sendo feito. Por quê? Ao que me consta, porque ficou melindrado por Lula não lhe ter dado ciência prévia do nome que pretendia indicar, como de fato indicou, para o Supremo Tribunal Federal (STF). No sistema parlamentarista, como todos sabem, o comportamento do senador Alcolumbre seria razão suficiente para o chefe de governo (o primeiro-ministro) solicitar ao chefe de Estado (o presidente da República) a dissolução da vigente legislatura e convocar novas eleições. Tal decisão nem precisaria ser consumada. A simples ameaça levaria no mínimo 400 congressistas a enquadrar o nobre senador pelo Amapá. Digo mesmo que essa hipotética situação nem faria sentido, porque o presidente do Senado, ciente da possibilidade da convocação de eleições antecipadas, não adotaria tal comportamento.

Populismo penal, Miguel Reale Junior

 O Estado de S. Paulo

A exasperação das penas não leva a qualquer efetiva intimidação. Mais importante do que a dureza da pena prometida é a certeza de sua aplicação

O publicitário Roberto Medina, criador do Rock in Rio, foi sequestrado em 6 de junho de 1990, mantido em cativeiro até o pagamento de resgate.

A relevância social da vítima levou à reação do Congresso Nacional, editando a Lei dos Crimes Hediondos, Lei 8.072/90, que qualificava como hediondo o crime de extorsão mediante sequestro, cuja pena seria cumprida em regime fechado. As extorsões mediante sequestro, todavia, aumentaram após a edição da lei.

Mas o populismo penal prevalecia. A cada crime impactante, nova lei repressora. O assassinato de Daniela Perez levou a se criar movimento nacional reclamando-se maior rigor na apenação do homicídio, atendido pela Lei 8.930/1994, ao introduzir o homicídio qualificado no rol dos crimes hediondos.

O autoritarismo virtuoso de Gilmar, por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

Não há dúvida sobre o que fez Gilmar Mendes. Tomou prerrogativa do Congresso e desarranjou o sistema de freios e contrapesos para interditar qualquer possibilidade de processo de impeachment contra ministro do Supremo. Não deixará de ser forma de proteção a minoria. Tudo pela democracia. Blitz corporativista que apregoaria como se promovida em defesa do equilíbrio entre Poderes.

Sob o espírito do 8 de janeiro permanente, que já autorizou censura em nome de nos proteger de golpe eternamente à espreita, Mendes – de modo a salvaguardar o estado democrático de direito – criou um estado de direito específico para ministro do STF. Forjada modalidade de proteção à autonomia que garante a independência do Poder tornando-o inalcançável.

Senador dá troco em Michelle e prejudica economia de Lula, por Raquel Landim

O Estado de S. Paulo

Os dirigentes do PL repetem que, se Jair Bolsonaro indicou, está resolvido: o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) é o candidato do partido à Presidência da República. Mas será mesmo?

Tem muita gente colocando em dúvida por alguns motivos.

Primeiro, o timing. O anúncio veio após uma briga pública na família Bolsonaro em que os irmãos saíram humilhados pela madrasta Michelle Bolsonaro. Ser o escolhido pelo pai como candidato à Presidência parece o troco perfeito. Segundo, a maneira. O senador diz ter consultado o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e ter comunicado o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP). Mas foi um anúncio sem pompa e circunstância. Por uma nota na imprensa e depois uma publicação nas redes.

Terceiro, o aval. Flávio visitou Jair Bolsonaro na terça-feira na sede da Polícia Federal, onde o ex-presidente cumpre pena. Na quinta-feira, quem esteve por lá foram Michelle e Laura. Em que momento Jair passou o bastão?

O drama familiar do bolsonarismo, por Juliana Diniz

O Povo (CE)

Ela tem se mostrado mais carismática, ativamente engajada com os eventos do partido por todo o país, falando em nome de um Jair Bolsonaro agora inteiramente ausente, recolhido à prisão

A aliança entre o bolsonarismo e o grupo político de Ciro Gomes está em estado de espera desde que Michelle Bolsonaro deixou claro seu descontentamento em visita ao Ceará. Como escreveu Gualter George, é surpreendente que um político dado a respostas prontas tenha engolido a rejeição pública em silêncio.

Eduardo e Flávio Bolsonaro tentaram reagir e André Fernandes até ensaiou uma resposta, invocando a liderança de Jair. A verdade é que, com o líder preso e filhos tão incapazes, coube a Michelle Bolsonaro ocupar uma posição estratégica dentro do campo.

Ex-presidente tenta manter controle da direita diante de racha públicos na família, por Ana Luiza Albuquerque

Folha de S. Paulo

Anúncio vem na esteira de movimento de independência de Michelle Bolsonaro

Candidatura do senador não agrada ao centrão e dificultaria vitória sobre Lula, mas poderia engajar militância bolsonarista

Três hipóteses podem explicar o anúncio do senador Flávio Bolsonaro (PL) como o indicado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para a corrida presidencial de 2026.

A primeira delas, mais certeira, diz respeito à tentativa de Bolsonaro de manter sua influência e controle sobre a direita mesmo da prisão.

O anúncio desta sexta-feira (5) vem em um momento em que se escancaram os rachas no grupo —desde os ataques do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL) ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) até a união dos filhos do ex-presidente contra a madrasta, Michelle Bolsonaro (PL).

Nesse sentido, a indicação de Flávio é um recado para mostrar quem manda e um direcionamento para unir a direita sob a tutela de Bolsonaro.

Dois presidentes na prisão, por Demétrio Magnoli

Folha de S. Paulo

Lula preso de 2018 definiu estratégia clara para o PT

Bolsonaro preso de hoje administra o caos que engolfa seu movimento político

conflito crônico entre Michelle Bolsonaro e seus enteados eclodiu à luz do dia, destroçando a aliança do PL com Ciro Gomes no Ceará. O episódio ilumina um contraste: o Lula preso de 2018 definiu uma estratégia clara para o PT; o Bolsonaro preso de hoje administra o caos que engolfa seu movimento político.

Da sua sala na PF de Curitiba, Lula orientou as narrativas da resistência. À sua sombra, o PT insistiu na lenda do golpe parlamentar para esquivar-se das responsabilidades pelo fracasso do governo de Dilma Rousseff. Seguindo a linha traçada pelo líder, vestiu-se de vermelho, firmou alianças restritas ao campo da esquerda e enfrentou a batalha desigual.

O voo de Michelle, por Ana Luiza Albuquerque

Folha de S. Paulo

Presidente do PL Mulher reprovou publicamente aliança no Ceará a despeito de orientação do partido e aval de Bolsonaro

Se antes Jair conseguia tolher independência da companheira, hoje está isolado, fragilizado e depende de Michelle

Quando tinha 17 anos, Carlos Bolsonaro recebeu uma ingrata missão do pai: derrotar a mãe, a então vereadora Rogéria Bolsonaro, nas eleições para a Câmara Municipal do Rio de Janeiro.

Primeira mulher de Jair Bolsonaro, Rogéria se elegeu vereadora em 1992. Sua candidatura havia sido encampada pelo marido, com a premissa de que ela deveria consultá-lo e seguir suas orientações.

Eduardo Paes sai da sombra, por Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Prefeito entra de vez na campanha ao Palácio Guanabara em 2026

Principal adversário está preso, acusado de vazar informações de operação contra o CV

A impressão é que de vez em quando Eduardo Paes se lembra de que será candidato a governador do Rio de Janeiro em 2026. Na verdade, ele trabalha na sombra, como gosta.

Gato escaldado pela derrota em 2018, procura fazer alianças no interior do estado, onde sua rejeição é maior do que na capital, e, sobretudo, negociar o voto evangélico, tarefa nada fácil para quem tem um perfil abertamente carnavalesco. Em 2022, o bolsonarismo levou, à exceção do Rio, a maioria entre as mais importantes prefeituras fluminenses.

Messias no Supremo, por Pedro Serrano

CartaCapital

A indicação favorece o propósito de chancelar novas etapas do processo de amadurecimento do Judiciário como instrumento democrático

A indicação de Jorge Messias, advogado-geral da União, ao Supremo Tribunal Federal ocorre em um momento singular da história do Poder Judiciário no Brasil. Sufocada pelo autoritarismo do Executivo durante o período ditatorial, nossa Corte, mesmo durante a retomada da democracia, seguiu atada a ditames de uma elite conservadora que, invariavelmente, se agarra à manutenção de seus privilégios nas tratativas de poder no País. Por longo tempo, muitos, equivocadamente, enxergaram o Judiciário como um apêndice do Executivo, algo característico de regimes totalitários. Com o fim da ditadura, nossa Corte aos poucos precisou retomar a ciência de seu verdadeiro papel de guardiã dos princípios constitucionais de um Estado Democrático de Direito.

A democracia ameaçada, por Marcus Pestana

No século XX, tínhamos convicções e princípios sólidos – seja qual fosse a matriz de pensamento de nossa preferência – sobre o horizonte estratégico a perseguir. Não ficou pedra sobre pedra. “Tudo que é sólido desmancha no ar”. Socialistas viram sua utopia esfarelar junto com a poeira do Muro de Berlim. Liberais depararam-se com a falta de Estado gerando, em 2008, a maior crise global do capitalismo desde a Grande Depressão de 1929. Socialdemocratas assistiram o Welfare State encontrar seus limites fiscais.

Gilvan aos noventa, por Luiz Sérgio Henriques

Nenhum de nós é capaz, “na solidão de indivíduo”, de se situar no mundo, vasto mundo, e nem sequer no cotidiano mais simples. Precisamos de figuras de referência que, sem perder a serenidade, enfrentaram com imensa dignidade os altos e baixos, os desafios e as atribulações, as vicissitudes da condição humana. Não somos ilhas – elas que, segundo o poeta, perdem os homens –, tecemos lentamente, e muitas vezes de modo penoso, um acidentado mapa dentro do qual avaliamos sistematicamente o que fazemos e o que pensamos. 

Poesia | Na casa defronte de mim e dos meus sonhos, de Fernando Pessoa

 

Caetano Veloso - Reconvexo

 

sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna*

“Não se pode contar a história do pensamento e das práticas da democracia brasileira contemporânea sem que se considere a influência exercida pela obra de Antonio Gramsci tanto na política quanto na vida cultural. Vale o registro de que o ponto de partida para sua difusão não nos veio da academia, mas de círculos intelectuais que faziam parte da resistência ao regime ditatorial e que encontraram nele fonte de inspiração para a formulação de uma nova forma de pensar e de agir na política, em um movimento de rejeição crítica às concepções dominantes na esquerda brasileira. Foi a partir de suas obras, editadas por iniciativa de notáveis intelectuais, como Ênio Silveira, Leandro Konder, Carlos Nelson Coutinho e Luiz Gazzaneo, até então conhecidas por poucos, que a reflexão da esquerda teve acesso a categorias e a um sistema de pensamento que lhe permitiu descortinar os rumos em que se deveria empenhar na sua oposição ao regime militar.”

*Luiz Werneck Vianna (1938/2024) foi um sociólogo, pesquisador, professor universitário e escritor brasileiro. A guisa de um prefácio, do livro Modernidades alternativa – O século XX de Antonio Gramsci.

 

O que a mídia penas | Editoriais / Opiniões

Poderes precisam voltar a zelar pelo equilíbrio institucional

Por O Globo

Cabe ao plenário rever decisão do decano que estabeleceu impeachment especial para os ministros do STF

A democracia brasileira tem demonstrado resistência tenaz aos desafios que lhe têm sido impostos nas últimas quatro décadas. O arcabouço institucional criado pela Constituição de 1988 se mostrou eficaz para promover o impeachment de presidentes e governadores, punir políticos e empresários corruptos e, recentemente, condenar um ex-presidente e militares graduados por tentativa de golpe. Nos últimos tempos, contudo, o equilíbrio institucional tem sofrido abalos, com Poderes esboçando avanços incompatíveis com seus atributos e prerrogativas constitucionais.

A tensão do Legislativo com o Executivo fica patente na multiplicação desarrazoada de emendas parlamentares, na derrubada constante de vetos presidenciais por mera vendeta ou nos embates em torno da sabatina do indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF). Com frequência, decisões do Judiciário têm sido acusadas de invadir competências do Parlamento. O Executivo também virou alvo frequente de críticas por decretos e Medidas Provisórias considerados abusivos ou pela tentativa de aparelhar e interferir em decisões de agências reguladoras.

Como atacar a raiz básica da violência, por Fernando Luiz Abrucio*

Valor Econômico

É preciso priorizar o desenvolvimento integral de crianças e jovens, processo começa na chamada primeira infância

A violência é um fenômeno complexo e multifacetado, ainda mais numa sociedade tão desigual e marcada pelo patriarcalismo escravocrata como o Brasil. Não há uma bala de prata e várias políticas públicas devem ser acionadas para enfrentá-la. Mas, se tivesse um único pedido ao gênio da lâmpada, dando-me o poder de atacar a raiz mais profunda do problema, escolheria a maior proteção e a produção de melhores oportunidades às crianças e jovens do país. Seria sair de um presente cercado pela barbárie e a desesperança, indo para um lugar onde as sementes do futuro se tornariam a prioridade da agenda pública brasileira.

O público infantojuvenil brasileiro, especialmente nos lugares mais vulneráveis, conhece a violência desde cedo. Segundo pesquisa feita pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e o Ipea, 13 crianças e jovens sofreram alguma forma de violência por hora em 2023, num avanço de 36,2% em relação ao ano anterior. Muitas famílias, infelizmente, ainda são um lugar que desde cedo produz agressões contra meninos e meninas, inclusive as de cunho sexual, verdadeira barbárie que marca a nossa sociedade.

O lado oculto da prisão dos generais, por José de Souza Martins

Valor Econômico

A condenação tanto do ex-presidente da República quanto de oficiais superiores das Forças Armadas é uma espécie de último e tardio episódio da proclamação de 15 de novembro de 1889

O dia 25 de novembro de 2025 poderá ficar na história dos marcos de transformações e mesmo supressão de valores supostamente pétreos da organização política do país. Aqueles que preservaram, em nossa república anômala, exceções à regra da igualdade jurídica de todos. Concepções antimodernas e antirrepublicanas, disfuncionais. Não as de uma república de cidadãos.

Esta é uma sociedade com fortes resquícios, em sua estrutura política, da sociedade estamental do antigo regime. Nos livros do século XVIII, de uma ordem religiosa de São Paulo, encontrei registros de que a esmola para um nobre pobre era de 12 vezes a esmola de um simples pobre. Rigor da quantificação na definição do que era aqui a sociedade estamental, não a das diferenças sociais de classe. As diferenças eram de nascimento.

Mesmo não sendo propósito do STF, na condenação dos réus militares do processo do golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023, igualou ele, social e politicamente, todos os participantes do golpe já em andamento desde antes da eleição de 2022. Enfim, de fato, todos juridicamente iguais.

Janja cobra e Lula entra no combate ao feminicídio, por Andrea Jubé

Valor Econômico

Demorou, mas o governo resolveu se posicionar sobre a escalada dos feminicídio no país, diante dos episódios de barbárie dos últimos dias. Em meio a muito discurso e pouca ação, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse, na terça-feira (2), que a primeira-dama Rosângela da Silva (Janja) fez um apelo para que ele assumisse a responsabilidade de uma “luta mais dura contra a violência do homem contra a mulher”.

Durante evento da Petrobras em Suape (PE), no dia 2, Lula afirmou que estava lançando, naquele momento, um movimento para conscientizar esse país de que “homem não nasceu para bater em mulher”. Prometeu uma campanha diferente para mostrar que o enfrentamento ao feminicídio não é uma luta das mulheres, porque deve ser uma bandeira dos homens. Pediu que quem estivesse com ele, levantasse as mãos. A multidão obedeceu.

Congresso tem vocação para piorar, por José Joffily*

O Globo

Parlamento federal está fraco para causas de interesse público e forte para legislar em causa própria

Escândalos de verdade são votos de congressistas visando a apenas contrariar os interesses de “adversários”. Sem o espírito público alardeado no decorrer da candidatura, deputados e senadores, pagos pelos cidadãos, se manifestam sem outra preocupação que não seja demonstrar força e poder, defendendo interesses obscuros ou escusos.

Há mais de 20 anos fizemos “Vocação do poder” (codirigido por Eduardo Escorel), filme que registrava as intenções dos que desejavam seguir carreira política. Eram candidatos que ambicionavam, pela primeira vez, um cargo eletivo. Todos representariam a população da cidade do Rio de Janeiro na Câmara dos Vereadores. Queríamos identificar o que os conduzia a esse propósito e o que os orientava nesse desejo profundo de ser políticos profissionais.

Em comunidades pobres, as demandas de votos eram sempre repetidas com pleitos que iam de muros de arrimo contra inundações até dentaduras, laqueaduras, cadeiras de rodas e outras carências. Na Zona Sul, em contraste, candidatos pouco prometiam ou distribuíam, com exceção de santinhos e sorrisos. Os que ali moravam não precisavam nem mesmo de vereadores para intermediar providências. Esgotos entupidos, falta de iluminação pública adequada ou outras mazelas demandam providências de que os prefeitos, por morarem ou circularem por lá, se inteiram todos os dias. Para aqueles que moravam em bairros afastados, seria sempre necessária a intervenção de políticos — vereadores, de preferência — para que providências fossem tomadas.

Não há ‘Super Trunfo’ numa democracia, por Vera Magalhães

O Globo

Liminar de Gilmar Mendes abre mais um precedente perigoso de investida de um Poder nas atribuições de outro

Quem foi criança em qualquer época a partir dos anos 1970 certamente já jogou ao menos uma partida do jogo Super Trunfo. Trata-se de uma disputa de cartas com atributos, e uma única, que leva o nome do jogo, é capaz de vencer quase todas as demais. Pois é: nem o Super Trunfo liquida todas as demais, pois as cartas marcadas com um “A” se sobrepõem a ele.

O que o Supremo Tribunal Federal faz ao tentar limitar quem pode pedir impeachment de seus integrantes e aumentar na mesma tacada a votação necessária para abertura desses processos é buscar um Super Trunfo que lhe permita sobrepujar os dois outros Poderes, e isso não é aceitável numa democracia constitucional.

O inimigo agora é outro, por Bernardo Mello Franco

O Globo

Dos seis deputados que comandaram a Assembleia Legislativa do Rio desde 1995, só um nunca foi preso. A gangsterização está longe de ser um fenômeno recente na política fluminense. A novidade é a conexão explícita entre o crime do colarinho branco e o narcotráfico.

Conhecido como TH Joias, o deputado Thiego Silva foi em cana há três meses, acusado de fazer negócios com o Comando Vermelho. Segundo as investigações, ele intermediava compra e venda de drogas, fuzis e até equipamentos antidrones para a facção criminosa.

Nesta quarta, foi a vez do atual chefão da Alerj, Rodrigo Bacellar. Mensagens apreendidas pela Polícia Federal indicam que ele vazou informações sigilosas e orientou o aliado TH Joias a esconder provas que poderiam incriminá-lo.

Gilmar Mendes implode sistema de contrapesos, por Pablo Ortellado

O Globo

Se há um problema com o Judiciário brasileiro, é seu poder excessivo, não sua fragilidade institucional

“O Poder Judiciário no Brasil é o mais forte do mundo. Não há no mundo um Poder Judiciário tão forte quanto o do Brasil.” A afirmação, feita pelo ministro Alexandre de Moraes na última terça-feira, deveria servir de ponto de partida para qualquer debate sério sobre as relações entre os Poderes no país. Se há um problema com o Judiciário brasileiro, é seu poder excessivo, não sua fragilidade institucional.

Na quarta-feira, o ministro Gilmar Mendes concedeu medida cautelar que suspende e reinterpreta dispositivos da Lei do Impeachment, estabelecendo procedimentos restritivos para o impedimento de magistrados. A medida implode o sistema de freios e contrapesos, minando o controle externo do Judiciário.

Congresso avança sobre Orçamento e escancara uso eleitoral de emendas, por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Até julho de 2026, o governo será obrigado a quitar 65% das emendas individuais e de bancada destinadas à saúde e à assistência social e às chamadas emendas Pix

A aprovação do texto-base da LDO de 2026, nesta quinta-feira, em sessão conjunta do Congresso, escancarou um movimento já consolidado, mas agora assumido sem disfarces: em pleno ano eleitoral, a maioria dos parlamentares decidiu impor ao Executivo um calendário de liberação de emendas que prioriza interesses eleitorais imediatos, reforça o poder dos parlamentares que disputarão a reeleição e aprofunda as distorções do sistema político brasileiro. O Legislativo avança sobre o Orçamento da União com apetite ampliado, transformando em política de Estado um mecanismo tipicamente de aliciamento eleitoral.

Pelo acordo costurado entre o relator Gervásio Maia (PSB-PB) e o Planalto, o governo será obrigado a quitar até julho de 2026 nada menos que 65% das emendas individuais e de bancada destinadas à saúde e à assistência social, além de cumprir o mesmo percentual para as chamadas emendas PIX, modalidade sob investigação no STF pela opacidade e pelo risco de uso eleitoreiro. São aproximadamente R$ 52 bilhões em emendas, distribuídas entre 513 deputados e 81 senadores.

Renovar o Congresso, a grande tarefa de 2026, Fernando Gabeira

O Estado de S. Paulo

O Congresso tornou-se um desafio democrático. A começar pelo avanço que fez sobre o Orçamento nacional

Primeiro, é necessário convencer que o problema existe. Depois, a tarefa é reconhecer sua dimensão gigantesca, a ladeira que teremos de subir para resolvê-lo. No meu entender, esta é uma grande questão em 2026: como renovar o Congresso. Tudo na sua dinâmica atual conspira para que nada mude. O Congresso dispõe de mais de R$ 50 bilhões em emendas parlamentares. Além disso, os partidos recebem cerca de R$ 5 bilhões para financiar a campanha eleitoral. Como pessoas da sociedade, sem recursos especiais, apoiadas apenas por grupos de amigos, conseguirão romper essa montanha de dinheiro? De um ponto de vista numérico nunca se conseguirá maioria. Mas é possível constituir um pequeno grupo suprapartidário que se articule com a opinião pública, consiga algumas pequenas vitórias e evite, por seu turno, decisões calamitosas.

Uma irresponsabilidade, por Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Só no ambiente degradado de hoje é possível levar Michelle Bolsonaro a sério para a Presidência

Assim como só uma sensação tão forte de perplexidade, desesperança e falta de alternativa poderia alavancar e garantir a vitória de Jair Bolsonaro em 2018, só num ambiente institucional tão degradado como o de hoje seria possível levar a sério o nome da sra. Michelle Bolsonaro para a Presidência.

Michelle é uma mulher bonita, que produziu a melhor imagem da posse do seu marido, discursando em libras, mas que experiência e qualificação pessoal, política, administrativa e intelectual ela tem para presidir o Brasil? Articular uma candidatura assim é uma irresponsabilidade com o País.

*Os 90 anos do querido Gilvan*

Nosso querido amigo e companheiro de tantos anos de lutas sociais, Gilvan Cavalcanti de Melo está completando precisamente hoje 90 anos de vida.

Posso afirmar que raramente conheci, ao longo dos meus 73 anos, uma figura humana tão extraordinária quanto ele.

Sindicalista, engajado no Partido Comunista já em meados da década de 50, conhecendo como ninguém o pensamento revolucionário de Antonio Gramsci, Gilvan transformou sua existência em obra de arte.

O PIB morno por fora, frio por dentro, por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Resultado era esperado e PIB ainda deve crescer mais do que 2% neste 2025

Ritmo fraco aumenta ligeiramente as possibilidades de corte de juros em janeiro

A economia está ainda morninha por causa do desempenho daqueles setores que reagem menos ou pouco às andanças da atividade dita "doméstica" (mais nacional) ou às taxas de juros daqui. Isto é, indústria extrativa (petróleo e minérios), grande agropecuária e exportações. Por tabela, um setor que presta serviços a essas atividades, como transportes, logística, anda melhorzinho também, assim como a construção civil, empurrada por obras de infraestrutura e, menos, pelo Minha Casa Minha Vida. Mas, no geral, quanto à dita "absorção doméstica", o ritmo de crescimento baixou a níveis pré-Lula 3 ou pré-epidemia. É o que se depreende dos dados do PIB divulgados nesta quinta-feira (4) pelo IBGE.

Supertrunfo constitucional, por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Liminar de Gilmar Mendes blinda ministros do STF e escala catimba constitucional

Mesmo que Judiciário e Legislativo evitem confronto final, instituições sairão desgastadas

Brasileiros descobriremos em breve qual Poder detém o supertrunfo, se é o Judiciário, ao qual cabe sempre a última palavra em disputas legais, ou se é o Legislativo, que tem a prerrogativa de alterar as próprias regras do jogo.

O ministro Gilmar Mendes, do STF, deu mais uma esticada na corda da catimba constitucional ao decidir monocraticamente que só o procurador-geral da República pode propor o impeachment de ministros do STF, entre outras mexidas na lei 1.079/50.

De guardião à suprema exceção, por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Gilmar Mendes altera legislação e põe os magistrados na categoria de autoridades acima da lei

Supremo corre o risco de se igualar a parlamentares que atuam para ficar longe do alcance da Justiça

Não existe lei velha, lembra Gustavo Sampaio, professor de direito constitucional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Existe a lei e, como tal, deve ser respeitada até que os legisladores decidam mudá-la em deliberação do Congresso Nacional. É a competência conferida ao colegiado pela regra da República.

Na visão do ministro Gilmar Mendes, contudo, a norma pode ser adaptada à conveniência dos ministros do STF, que temem retaliações políticas.

Ibiaí, por Ivan Alves Filho*

As estrelas, de tão nítidas e próximas, pareciam estar ligadas ao solo por fios invisíveis, como se balões noturnos fossem. Impossível, era praticamente impossível acreditar que aqueles pontos luminosos estivessem simplesmente soltos, flutuando no universo! Onde estavam os fios então? Que mágica seria aquela? Mais: onde se escondiam os moleques travessos soltadores de balões naqueles sertões recuados? Ou tudo não passaria de uma miragem - uma poética e esplendorosa miragem? 

"Uma coisa na cidade se perde: são as estrelas", escreveu certa vez Rachel de Queiroz, uma admiradora do céu do sertão. De um céu tão bonito e iluminado que continuaria assim mesmo sem a lua, mesmo sem a Estrela d'Alva. Até sem o Cruzeiro do Sul.

Poesia | Síntese da Felicidade, de Carlos Drummond de Andrade

 

Fiel e produtiva longevidade, por Antônio Fausto do Nascimento

Nosso querido amigo e companheiro de ideais, Gilvan Cavalcanti Melo, completa hoje, 05/12/2025, noventa anos, bem vividos, de lutas por justiça social e pelo Socialismo com democracia e legalidade constitucional.

Militante do centenário Partidão desde jovem, líder estudantil, preso, perseguido, exilado, afastado do serviço público federal pela ditadura militar de 1964.

Retorna ao Brasil com anistia de 1979, incorpora-se às jornadas pelo fim do regime militar, reintegra-se à direção partidária e participa da luta interna, contra o dogmatismo burocrático, que culmina na fundação do Partido Popular Socialista-PPS, hoje Cidadania.

Desde então, edita o blog nacional "Democracia Política e Novo Reformismo", que recebe colaboração atual e diversificada de boa parte da melhor intelectualidade brasileira.

Leitura diária de milhões de leitores ao longo de muitos anos. Simultânea publicação do melhor da teoria marxista universal e renovada, que faz de Gilvan Melo um intelectual orgânico de nossa formação social.

Parabéns, vida longa, saúde e paz para toda família. Um abraço fraterno.

 *Foi sindicalista e Secretário do Governo de Pernambuco (1963/1964)