quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

Opinião do dia - Hannah Arendt* (preconceitos)

Mas os preconceitos contra a política - a ideia de que a política interna é uma teia de mistura e ardis tecida por interesses escusos e ideologias ainda mais escusas e a externa um pêndulo a oscilar entre a propaganda insulsa e o exercício da força bruta – remonta a uma época muito anterior à invenção dos artefatos capazes de destruir toda vida orgânica do planeta. No que tange à política interna, esses preconceitos são pelo menos tão antigos quanto a democracia partidária – isto é, pouco mais de um século -, que pela primeira vez na história moderna pretendeu representar o povo, algo em que o próprio povo nunca acreditou. A origem da política externa pode ser nas primeiras décadas da expansão imperialista da virada do século, quando o Estado nacional começou, não prol da nação, mas dos interesses econômicos nacionais, a estender o domínio europeu por todo o globo. Mas aquilo que hoje dá ao amplo preconceito contra a política a sua força real – a fuga na impotência, o desejo desesperado de exonerar-se da capacidade de agir – era naqueles dias preconceitos e privilégio de uma pequena classe que acreditava, nas palavras de Lorde Acton, que “o poder corrompe, e o poder absoluto corrompe absolutamente”. Ninguém, talvez, mais do que Nietzsche – em sua tentativa de reabilitar o poder – reconheceu mais claramente que essa condenação do poder refletia claramente os anseios ainda inarticulado das massas, embora também ele, bem ao espírito da época, identificasse, ou confundisse, o poder – que individuo algum é capaz de possuir, dado que só pode surgir da ação cooperativa de muitos – com o uso da força, cujos meios um individuo pode tomar e controlar.”

*Hannah Arendt (1906-1975), A promessa da política, p. 150. Editora Difel, 2008.

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Congresso e governo precisam esfriar os ânimos

Por O Globo

Lula e Alcolumbre têm de demonstrar maturidade institucional na indicação de Messias ao Supremo

Já foi longe demais o embate entre Executivo e Legislativo, deflagrado depois que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva indicou o chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), ministro Jorge Messias, à vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) aberta com a aposentadoria antecipada do ministro Luís Roberto Barroso. Contrariado porque o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) foi preterido na indicação, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), desde o primeiro momento tentou criar problemas para o governo.

Assim que Messias foi anunciado, o Congresso aprovou uma pauta-bomba com custo bilionário para as contas públicas e derrubou vetos presidenciais necessários, tomando decisões flagrantemente deletérias para o Brasil. Em retaliação, temeroso de não reunir a tempo os 41 votos necessários à aprovação de Messias no plenário, o Planalto não enviou ao Senado a mensagem de praxe oficializando a indicação, forçando Alcolumbre a cancelar a sabatina que marcara para a semana que vem.

Interesses não republicanos, por Merval Pereira

O Globo

Os ministros viraram entidades próprias, e cada um atua de acordo com seu pensamento e seu desejo, e não com a Constituição.

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu monocraticamente alterar a legislação que prevê o impeachment de ministros do Supremo, impondo vários obstáculos novos a que isso aconteça, num movimento político de blindagem própria e de seus colegas de plenário. Temem que, na próxima eleição, a direita assuma uma maioria no Senado que permitiria aprovar impeachment de ministros. No mesmo dia, outro ministro do Supremo, Dias Toffoli, também por decisão própria, avocou a si todo o processo que investiga o banqueiro Daniel Vorcaro e ações correlatas, decretando o mais alto grau de sigilo. Não à toa, a defesa dos implicados festejou a decisão.

A indicação do ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, também explicitou um racha dentro do plenário do STF. De um lado, o ministro André Mendonça, indicado por Bolsonaro, trabalhando arduamente a favor de Messias (ministro de esquerda apoiado por ministro da direita). Em comum, são terrivelmente evangélicos, adicionando à crise política um componente religioso que não deveria estar nesse jogo, pois o Estado é laico. Messias chama Mendonça de “irmão de fé”.

O golpe do Supremo, por Malu Gaspar

O Globo

O Supremo Tribunal Federal resolveu dar dois mimos de fim de ano aos brasileiros. No primeiro, o ministro Gilmar Mendes suspendeu numa canetada a possibilidade de qualquer cidadão apresentar denúncia contra os ministros por crime de responsabilidade. O decano do STF decidiu ainda que só o procurador-geral da República pode fazer isso, e a votação mínima no Senado apenas para deixar o caso seguir passa a ser de dois terços, e não mais maioria simples.

O Brasil no meio do redemoinho, por Míriam Leitão

O Globo

O ministro Gilmar Mendes tira direito de cidadão e convulsiona o país, mas Supremo está sob ataque pelos seus acertos e não pelos seus erros

Há mais de 40 pedidos de impeachment do ministro Alexandre de Moraes. Pela lei, em casos de impedimento de ministros do STF, o Senado, ao mesmo tempo, acusa e julga. Decide por maioria simples e, assim que o processo é iniciado, o ministro é afastado. É uma proteção institucional frágil, na visão de ministros do STF. Ontem, o ministro Gilmar Mendes tomou a controversa decisão de que apenas o procurador-geral da República pode pedir impeachment de ministros do STF. Um ministro que defende a decisão monocrática de Gilmar disse que os pedidos contra Moraes são “puramente perseguições e retaliações". O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, reagiu a Gilmar, acusando-o de tentar usurpar prerrogativas do Senado. Isso acontece 24 horas depois de um confronto direto entre o senador e a Presidência da República por conta da indicação do nome do ministro do STF. O Brasil pisca e nova crise institucional eclode. Ontem, foi mais um dia comum no Brasil.

Torniquete da direita não combate o crime, por Maria Clara R. M. do Prado

Valor Econômico

O efetivo combate ao crime organizado não envolve matanças e mais espetacularização, mas requer preparo técnico, conhecimento do mercado e expertise no complexo sistema financeiro

Segurança pública tende a ser o principal tema da campanha eleitoral no ano que vem. Representantes dos partidos de direita têm explorado o assunto com bastante antecedência, e aparente eficiência. Querem marcar posição no debate do combate ao chamado crime organizado, ainda que não tenham formalizado o nome (ou nomes) para a disputa à Presidência da República. Isso, aliás, não importa agora. O mais relevante para Tarcísios, Zemas e Caiados é colocar o governo em segundo plano no que diz respeito à matéria da segurança.

Na busca da visibilidade como defensores da ordem pública, aqueles políticos semeiam propostas e ações para colherem frutos a seu favor no futuro. Estão juntos nisso. Operam no estilo trator, com o apoio explícito do presidente da Câmara dos Deputados, deputado Hugo Mota. Não devem ser subestimados.

Duas perguntas sobre o protagonismo de Gilmar, por Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Ministro corre o risco de devolver discurso a extremistas que rumavam para ficar sem assunto

Duas perguntas sobre a decisão do ministro Gilmar Mendes que restringe ao PGR a proposição de impeachment no Supremo Tribunal Federal e eleva o quórum de maioria simples para dois terços atravessaram o dia sem respostas: Por que agora? Por que em liminar?

A ação foi impetrada pelo Solidariedade, partido presidido pelo deputado Paulinho da Força (SP). Um dos parlamentares com mais franco acesso ao decano do STF, Paulinho poderia ter apresentado esta ação ao longo de todo seu mandato, mas escolheu o 19 de setembro para fazê-lo. Onze dias depois, a ação era enviada para despacho do procurador-geral da República, que se manifestou há exatamente um mês. Incluído na pauta de julgamento na última terça-feira, ganhou liminar no dia seguinte.

Gilmar Mendes blinda ministros do Supremo e provoca forte reação do Congresso, por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

O excesso de poder judicial tende a se intensificar e alimentar a insatisfação de setores do Congresso que veem no STF não apenas um árbitro, mas um protagonista político

A decisão monocrática de Gilmar Mendes, que restringe à Procuradoria-Geral da República a legitimidade para apresentar denúncias por crimes de responsabilidade contra ministros do Supremo Tribunal Federal, não é um episódio isolado. Ela se inscreve numa longa trajetória de expansão da autoridade judicial sobre o sistema político. Esse fenômeno foi analisado pelo falecido sociólogo Luiz Werneck Vianna, que identificou, desde os anos 1990, a formação de um novo canal de organização política da sociedade no qual o Direito não apenas regula conflitos, mas ocupa, historicamente, funções que em outros países caberiam aos partidos, ao parlamento e à sociedade civil organizada.

Em Corpo e alma da magistratura brasileira (1997) e A judicialização da política e das relações sociais no Brasil (1999), Werneck demonstrou que a Constituição de 1988 ampliou competências do Judiciário, criou direitos e estabeleceu mecanismos de controle que transferiram para as cortes superiores uma porção crescente da vida pública. O STF deixou de ser um intérprete final da Constituição para se tornar um ator político estruturante, responsável por arbitrar desde políticas públicas até conflitos federativos, temas morais e impasses institucionais.

Gilmar Mendes impõe freio a impeachment de ministros e abre crise com Congresso

Por Vinicius Doria / Correio Braziliense

Decano do STF concede liminar que torna mais difícil o impedimento de magistrados da Corte

O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, decidiu de forma monocrática (individual) considerar inconstitucionais alguns pontos da Lei do Impeachment, de 1950, que regulamenta o afastamento de autoridades, incluindo ministros da Corte. No ponto mais polêmico, o magistrado considerou que apenas a Procuradoria-Geral da União (PGR) tem poder constitucional para apresentar denúncia contra ministros do STF por crime de responsabilidade. Um dos artigos da lei prevê que esse tipo de denúncia pode ser feito por "qualquer cidadão". 

A determinação de Gilmar Mendes também altera o quórum mínimo necessário para que o Senado — Casa responsável pelo julgamento de pedidos de impeachment — abra processo de afastamento de ministros. Pela decisão, que vale até o plenário do Supremo julgar o mérito da questão, o processo de impeachment de ministros, para ser aberto, precisa ser apreciado em sessão plenária com quórum mínimo de dois terços (54 dos 81 senadores), em vez de 50% mais um voto (41 senadores).

No caso da abertura de processo, Gilmar também entende que — ao contrário de processo semelhante contra o presidente da República — ministros do STF não podem ser afastados do cargo enquanto a ação estiver em curso. De acordo com parecer da PGR, seguido por Gilmar, como os magistrados não têm substitutos, a ausência de um deles pode prejudicar a rotina de julgamentos da Corte.

Caminho sem volta, por William Waack

O Estado de S. Paulo

O Supremo Tribunal Federal está a caminho de capturar de vez a esfera da política

Depois de se tornar mais uma instância política, o STF quer ser a única com a qual ninguém e nenhum Poder se mete. A Corte está chegando lá, com a liminar do ministro Gilmar Mendes alterando profundamente as regras de impeachment (portanto, controle) de ministros do Supremo – e o próprio equilíbrio entre os Poderes.

O pano de fundo para essa decisão monocrática é uma visão pessimista da política e de seus participantes como algo tenebroso. Mesmo antes de Bolsonaro, os “iluminados” do STF já enxergavam o Legislativo como um covil de espertalhões (para dizer o mínimo) de todo tipo, com motivos nada republicanos atrás de cada demanda disfarçada de projeto político. Ainda mais no circo para apreciar uma escolha do presidente para uma vaga aberta na Corte.

O Supremo se blinda, por Carolina Brígido

O Estado de S. Paulo

O sistema de freios e contrapesos estabelece independência e autonomia para cada um dos Poderes atuar, mas com capacidade mútua de limitar eventuais excessos. Esse equilíbrio entrou em colapso ontem, quando Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), reduziu a capacidade do Senado de abrir processo de impeachment contra ele mesmo e seus colegas.

Um exemplo de como esse equilíbrio funciona: o STF vota a constitucionalidade de normas aprovadas pelo governo e pelo Congresso, podendo derrubá-las. Em contrapartida, os parlamentares detêm o poder de abrir processo de impeachment do presidente da República ou ministros da Corte.

Na decisão, Mendes considerou que há trechos na Lei de Impeachment incompatíveis com a Constituição Federal. O ministro aumentou o quórum no Senado para a abertura de processo, declarou que apenas o procurador-geral da República pode entrar com a denúncia e estabeleceu que o mérito de decisões judiciais não pode ser considerado crime de responsabilidade.

O Estado empresário pede falência, por Felipe Salto

O Estado de S. Paulo

Há uma tarefa primordial: fortalecer, reestruturar e reorientar as agências reguladoras, resgatando sua proposta original

O episódio dos Correios é a parte mais visível de um problema maior. A ideia de um Estado empresário, como regra geral, que comanda atividades de produção de bens e de prestação de serviços, precisa ser revista.

A dívida pública atingirá níveis próximos a 85% do Produto Interno Bruto (PIB), até o final de 2026, muito acima da média dos países comparáveis. Os prejuízos acumulados por diversas empresas estatais alimentam esse quadro de fragilidade e de alto risco fiscal.

O problema dos Correios, por exemplo, não é novo. O setor de logística modernizou-se, novas empresas entraram no jogo e a estatal parou no tempo. Além disso, pratica-se uma política de pessoal questionável; não se sustenta. Os números informados pela própria companhia nos seus balanços contábeis e em relatórios de administração atestam essa conclusão.

A visão keynesiana da construção residencial, por Roberto Macedo

O Estado de S. Paulo

E este texto inclui também a abordagem de uma política monetária alternativa

John Maynard Keynes (1883-1946) foi um economista britânico considerado o pai da moderna análise macroeconômica. Seu livro mais conhecido foi publicado em 1936 e em português veio com o título de A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda (São Paulo, Editora Atlas, 1992).

Anteriormente a Keynes, a teoria macroeconômica predominante, de influência liberal, era a de que uma economia se reequilibraria automaticamente se os salários fossem flexíveis. Mas isso não acontecia e Keynes passou a pregar que uma economia em recessão exigia forte intervenção estatal mediante mais gastos públicos, inclusive via endividamento e emissão monetária, para estimular o crescimento econômico e o desenvolvimento social.

A abordagem expressa no título deste artigo não veio de Keynes nesse livro, mas sim de um artigo que ele publicou na revista mensal Red Book, dos EUA, em dezembro de 1934 – note-se que a economia ainda estava sob o impacto da crise de 1930 –, na qual respondeu à pergunta: “Pode a América gastar seu caminho na direção da recuperação?”. Ele respondeu sim, em contraposição a outro economista, Harold J. Laski, que respondeu não e não teve a fama de Keynes. Num debate sobre o assunto em São Paulo, soube da revista e consegui comprá-la num antiquário de publicações nos EUA, pelo correio.

Crepúsculo americano, por Maria Hermínia Tavares

Folha de S. Paulo

Se Trump obtiver êxito na Venezuela, será a legitimação da força bruta

Política externa trumpista não promoverá volta a um passado dourado

Donald Trump anunciou recentemente o fechamento do espaço aéreo sobre a Venezuela e ao redor dela.

Rondam o país o mais avançado porta-aviões do mundo; destroieres e mísseis teleguiados; navios anfíbios e lanchas de ataque rápido; um submarino nuclear; caças de última geração que executam bombardeios de treinamento a partir do porta-aviões; bombardeiros estratégicos fazendo demonstrações no espaço aéreo caribenho; helicópteros de operações especiais de vigilância e reconhecimento; e entre 13 mil e 15 mil militares em concentração.

Tudo isso a pretexto de combater o narcotráfico no Caribe e no Pacífico, mas, como é óbvio, para forçar Nicolás Maduro a deixar o poder.

Um país assolado por corrupção institucional, facções, crime empresarial e financeiro, por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Prisão do presidente da Assembleia Legislativa do RJ é apenas um episódio da crise

Parlamentares querem leis para fugir da polícia; há negociatas em tribunais

Desde 1995, a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) teve seis presidentes. Quatro foram presos, no comando da casa ou no comando de coisas ainda piores, como o ex-governador Sérgio Cabral Filho. Que tenham prendido mais um presidente da Alerj deveria causar surpresa? Ou tédio enojado?

Qualquer leitora de jornais dirá logo que essas perguntas estão erradas, pois não se trata de problema específico da Alerj ou do Rio de Janeiro, embora meus conterrâneos estejam de fato exagerando, por assim dizer. Há mais evidências de que a corrupção está mais disseminada, tolerada, perigosa e, agora, é motivo central de uma das maiores querelas institucionais do Brasil —parlamentares contra Supremo.

A corrupção é cada vez mais sistemática ou organizada em gangues políticas. O exemplo mais recente é o desse Rodrigo Bacellar (União Brasil), que presidia a Alerj. Foi preso nesta quarta pela Polícia Federal porque acusado de prestar serviços a um grupo criminoso, vazando informações a fim de ajudar um comparsa a fugir da polícia, no caso um deputado acusado de ser próximo do Comando Vermelho.

Sigilo no caso Master precisa de regra de controle, por Alexa Salomão

Folha de S. Paulo

Sigilo, por definição, não é bom ou ruim, mas demanda critérios para definir em que circunstância e por quanto tempo deve ser aplicado

Banco lesou muita gente e fez conexões políticas, o que redobra a exigência de investigação transparente e efetiva

Como envolveria um deputado, a defesa de Daniel Vorcaro, do Master, pediu que investigações sobre o empresário e o banco, que caíram na Justiça Federal do Distrito Federal, fiquem no STF. O ministro Dias Toffoli puxou tudo para a corte, aplicando alto grau de sigilo, do tipo que faz o processo praticamente desaparecer da cena pública —fica disponível a um número bem restrito de acessos, que vão depender de autorização e serão monitorados.

Sigilo, por definição, não é bom ou ruim. Uma investigação pode ser mais efetiva nessa condição. Quando o caso envolve criança ou estupro, é apropriado para resguardar a vítima. No extremo oposto, porém, ausência de transparência e de publicidade pode omitir e livrar criminosos. Resguardar a impunidade.

JusPorn Awards 2025: a magistocracia sem roupa, por Conrado Hübner Mendes

Folha de S. Paulo

Quer democracia? Aguenta a juspornografia!

Nossos candidatos baixaram o nível até onde a porno-justiça goza

JusPorn Awards fecha esse bonito ano de volúpia magistocrática com festa. Na juspornografia, não há nada que não possa ficar mais libidinoso. Se você acredita que o STF, ao aplicar a lei a criminosos bem-dotados, salvou a democracia, o JusPorn Awards te dá entrada de camarote para a entrega do prêmio. Quer democracia? Aguenta a juspornografia! O JusPorn firma esse pacto com seus premiados e pede respeito.

Nossos candidatos baixaram o nível até onde a porno-justiça goza.

Na cerimônia ecumênica dos 50 anos do enforcamento de Vladimir Herzog por militares, a presidente do STM, ministra Maria Elizabeth Rocha, pediu perdão pelas omissões judiciais na ditadura. O ministro Carlos Amaral Oliveira, bacharel, mandou a ministra, mestre e doutora em direito, "estudar um pouco mais". E completou: "discordo do conteúdo, acho que tenho pleno direito a isso aí".

País vive conflito entre abusos do STF e tirania parlamentar, por Marcos Augusto Gonçalves

Folha de S. Paulo

Supremo acirra disputa política e institucional em provocação monocrática de Gilmar Mendes sobre impeachment de seus ministros

Congresso, empoderado em novo contexto político e institucional, pode reforçar atitudes legislativas delinquenciais em defesa própria

Assistimos a um perigoso aprofundamento das disputas entre Poderes. De um lado, um Legislativo empoderado que, à diferença das regras de regimes parlamentaristas, não se submete a dissoluções e formações de novos gabinetes —tampouco à convocação de eleições pelo chefe de Estado. É um parlamentarismo sem ônus, que ameaça, chantageia e tumultua, como fez Davi Alcolumbre no episódio da indicação de Jorge Messias ao Supremo.

Bolsonaro inesquecível, por Ruy Castro

Folha de S. Paulo

Não prometi parar de escrever sobre ele; só quando finalmente estivesse preso

Bolsonaro já devia estar no currículo do ensino básico; as crianças precisam saber o que ele fez na Covid

Há uma semana, escrevi de novo aqui sobre Bolsonaro. Leitores estranharam e me cobraram por ter dito que não falaria mais dele. Mas eu nunca disse bem isso. O que prometi foi que, quando Bolsonaro fosse preso, deixaria de poluir este espaço com seu nome. E só naquela quinta-feira, com o jornal já nas ruas, foi-lhe dada a ordem de cumprimento da pena e Bolsonaro começou a contar com quantos dias se fazem 27 anos e três meses de cadeia.

Poesia | Três Coisas, de Paulo Mendes Campos

 

Música | Mônica Salmaso - Valsinha

 

quarta-feira, 3 de dezembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Por O Globo

Rigor é essencial ao regular uso de IA nas eleições

TSE precisa aumentar vigilância sobre tecnologias que disseminam mentiras de forma cada vez mais verossímil

Os avanços e o barateamento das ferramentas de inteligência artificial (IA) despertam a cada dia mais preocupação. São impressionantes os vídeos, imagens e áudio sintéticos. Eles se tornaram perfeitamente verossímeis e estão ao alcance de qualquer um munido de ferramentas digitais simples. De tão bem feitos, fica difícil determinar se são mensagens fraudulentas ou fidedignas. É enorme o potencial para abuso, desinformação e crimes eleitorais, com dano evidente à democracia. À medida que a eleição se aproxima, a situação só tende a piorar. Por isso o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), órgão regulador das eleições, precisa aumentar a vigilância e o rigor.

Ninguém fala para o eleitor não polarizado, por Vera Magalhães

O Globo

Derrapadas do bolsonarismo e de Lula têm tudo para afugentar o contingente decisivo de eleitores ainda em disputa

Falta menos de um ano para a eleição presidencial, e um livro lançado nesta terça-feira mostra que existem mais matizes no eleitorado brasileiro do que o termo polarização permite enxergar — e nenhum dos dois lados hegemônicos da política brasileira tem sido eficaz em falar com os grupos ainda não fidelizados. Pelo contrário: as recentes derrapadas de Lula e do bolsonarismo, a maioria delas provocada por barbeiragens próprias, têm tudo para afugentar o decisivo contingente de eleitores ainda em disputa.

Em “Brasil no espelho”, livro do cientista político Felipe Nunes que reúne as conclusões da maior pesquisa já feita pela Quaest para entender as ideias, os valores e as crenças dos brasileiros, fica mais nítida a divisão social do país — e, com isso, também a inclinação política de cada um dos grupos mais expressivos. A pesquisa classifica os brasileiros em conservadores cristãos (27% do total), dependentes do Estado (23%), ligados ao agro (13%), progressistas (11%), militantes de esquerda (7%), empresários (6%), liberais sociais (5%), empreendedores individuais (5%) e a extrema direita (3%).

Alcolumbre avacalha um ritual, por Elio Gaspari

O Globo

Uma crise sem um fiapo de interesse público

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, criou uma crise com o Planalto sem que haja nela um só fiapo de interesse público. Tudo por causa da escolha, por Lula, do advogado-geral da União, Jorge Messias, para a cadeira vaga no Supremo Tribunal Federal. Alcolumbre queria o ex-presidente do Senado Rodrigo Pacheco.

Aos fatos:

A prerrogativa constitucional de nomear ministros do STF é do presidente da República, e só dele. A preferência de Alcolumbre, como o pato ao tucupi, é uma escolha dele. A preferência de Lula por Messias é uma prerrogativa.

Faça-se de conta que Alcolumbre se aborreceu por não ter sido avisado. Essa manha é pueril.

A guerra da sabatina, por Bernardo Mello Franco

O Globo

Crises fabricadas pelo senador do Amapá independem de currículo dos indicados ao STF

Em 2021, Davi Alcolumbre retardou por longos quatro meses a sabatina de André Mendonça, indicado ao Supremo. Queria forçar o governo Bolsonaro a devolver o controle sobre a distribuição das emendas ao Orçamento.

Em 2025, Davi Alcolumbre marcou uma sabatina a jato para Jorge Messias, indicado ao Supremo. Quer forçar o governo Lula a negociar, mas jura não estar em busca em nenhum “ajuste fisiológico, com cargos e emendas”.

O presidente do Senado mudou a tática, mas joga o mesmo jogo. Usa uma atribuição da Casa, a de avaliar os candidatos à Suprema Corte, para barganhar interesses alheios aos currículos dos indicados.

A crise atual começou a ser fabricada em outubro, quando o ministro Luís Roberto Barroso antecipou sua aposentadoria. Alcolumbre tentou emplacar o aliado Rodrigo Pacheco, mas não foi atendido.

Ciência e soberania, Por Roberto Medronho

O Globo

O domínio de tecnologias críticas é decisivo para reduzir a dependência externa em setores estratégicos

O conceito de soberania evolui historicamente. Frequentemente, está associado ao controle do território, à capacidade militar e à autodeterminação política. Entretanto, no século XXI, a soberania não é garantida apenas com fronteiras bem protegidas, nem com a afirmação da personalidade independente do Estado, de sua autoridade plena e governo próprio. Em tempos de interdependência global e rápidas transformações científicas, a verdadeira soberania de uma nação depende, cada vez mais, da educação, da ciência, da tecnologia e da inovação.

O domínio de tecnologias críticas é decisivo para reduzir a dependência externa em setores estratégicos como saúde, energia, defesa e agricultura. Durante a pandemia de Covid-19, o mundo presenciou episódios que demonstraram de maneira cabal essa vulnerabilidade.

‘Vidas Secas’, o elo perdido entre o craque Reinaldo e o ator Wagner Moura, por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

O craque não participava de organizações de esquerda, era apenas um dos maiores atacantes de sua geração e comemorava seus gols com o punho cerrado

A decisão da Comissão de Anistia de reconhecer o ex-jogador José Reinaldo de Lima, ídolo do Atlético Mineiro e da Seleção Brasileira, como vítima da perseguição política da ditadura militar ilumina uma faceta menos lembrada, porém decisiva, da repressão brasileira: a violência cotidiana, difusa, que atingia não apenas militantes clandestinos, mas qualquer cidadão que ousasse romper o enquadramento simbólico e disciplinador imposto pelo regime.

Reinaldo não conspirava, não participava de organizações de esquerda. Era apenas um dos maiores atacantes de sua geração, um jovem negro, carismático, que comemorava seus gols com o punho cerrado, marca dos movimentos de direitos civis norte-americanos, que simbolizava autoestima, dignidade e autonomia. Para os generais e para a cúpula da antiga Confederação Brasileira de Desportos, aquele gesto era uma mensagem perigosa para os torcedores e demais jogadores.

1% mais rico concentra 37,3% da riqueza declarada no IR, aponta relatório da Fazenda

Por Bruna Lessa / O Globo

Levantamento integra informações da Receita Federal e da PNADC para medir a desigualdade de renda e patrimônio no país

A parcela equivalente ao 1% mais rico da população deteve 37,3% da riqueza declarada à Receita Federal em 2023, apontou relatório divulgado nesta segunda-feira pela Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Fazenda. O estudo consolida informações do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) e combina esses dados com pesquisas domiciliares para medir a distribuição de renda e patrimônio no país.

De acordo com o relatório, quando se observa somente a riqueza declarada ao IRPF, a concentração é ainda mais acentuada do que na renda. Entre os 10% mais ricos, a fatia chega a 64,2% do total do patrimônio informado pelos contribuintes. Já os 5% mais ricos concentram 54,7%.

Esses números, segundo a SPE, ainda podem subestimar a desigualdade real. Isso porque o estudo classifica os grupos a partir da renda declarada — e não do patrimônio acumulado —, o que pode deslocar parte dos contribuintes com grande volume de bens, mas baixa renda tributável, para faixas inferiores da distribuição.

Objetivos e consequências da estratégia de Michelle, por Fernando Exman

Valor Econômico

Lula é o principal beneficiário do racha na família Bolsonaro e, consequentemente, dentro no PL

Michelle Bolsonaro movimenta-se para obter, como enumera um arguto observador da política nacional, o segundo de dois requisitos para quem pretende concorrer à Presidência da República ou pelo menos interferir nas discussões sobre a vaga de vice.

O primeiro requisito, uma base eleitoral robusta, em tese ela já possui. Segundo pesquisas de opinião, a ex-primeira-dama apresenta uma potencial massa de votos maior do que a dos enteados. Personifica, portanto, a maior probabilidade de a família Bolsonaro estar na chapa vitoriosa nas próximas eleições presidenciais.

Ary Oswaldo, Itamar e a festa errada, por Lu Aiko Otta

Valor Econômico

O risco de o ano legislativo acabar sem votação do projeto que detalha a parte administrativa da reforma tributária está no radar do governo

Homem de hábitos refinados, Ary Oswaldo Mattos Filho soltava um raro e envergonhado palavrão, dos brandos, quando falava sobre o destino da reforma tributária que elaborou, a primeira pós-Constituição de 1988. O trabalho estava na reta final quando o então presidente da República, Fernando Collor, renunciou para escapar do impeachment. Era dezembro de 1992. Como se sabe, a reforma não andou.

Quatro anos atrás, quando a reforma tributária dava sinais de que poderia finalmente decolar, a coluna quis saber a opinião de Mattos Filho. Ele estava pessimista quanto ao andamento daquela proposta, como de outras reformas econômicas.

“É o presidente errado, com a maioria errada no Congresso, e com uma percepção errada de que só mexendo do lado da receita a coisa anda”, afirmou.

O retrocesso patrocinado por Motta, por Marcelo Godoy

O Estado de S. Paulo

Ministério Público pede socorro ao Senado: Câmara aprovou medida que ajuda os bandidos

Não adianta dizer que se trata de narrativa. Ou de que tudo é invenção do Planalto. Hugo Motta e os açodados deputados que votaram o projeto de lei Antifacção e buscam impor o mesmo ritmo frenético aos senadores deveriam ler o artigo do procuradorgeral de Justiça, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, e dos promotores Lincoln Gakiya e Aluisio Antonio Maciel Neto, do Ministério Público de São Paulo, publicado no Blog do Fausto Macedo.

Primeiro porque, entre os autores, estão alguns dos responsáveis pelas mais importantes ações contra o crime organizado no País. Não é à toa que Gakiya tem a cabeça a prêmio pelo PCC. Eles elogiam os avanços do projeto. Listam a ação civil autônoma de extinção de domínio, a criação do crime de domínio social estruturado, a repartição entre União e Estados dos bens apreendidos, o endurecimento da progressão de regime carcerário e os instrumentos de cooperação e inteligência. Só então abordam o retrocesso patrocinado por Motta.

Não é o Estado que estabelece a verdade, por Nicolau da Rocha Cavalcanti

O Estado de S. Paulo

Criticar o Poder Judiciário é um direito, mesmo que as críticas sejam duras ou injustas. Não cabe criminalizar a opinião

Ficamos todos um pouco obnubilados – incrédulos, há de se reconhecer – com a atividade de metalurgia artesanal de Jair Bolsonaro, curioso com sua tornozeleira eletrônica. Tenha qual sido o real motivo, o uso do ferro de solda sobre o dispositivo eletrônico conferiu legitimidade à prisão preventiva decretada horas depois por Alexandre de Moraes.

Mas a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) não falava apenas em violação da tornozeleira eletrônica como fundamento para a prisão. Dizia: “As manifestações do filho do réu no referido vídeo revelam o caráter beligerante em relação ao Poder Judiciário, notadamente o Supremo Tribunal Federal, em reiteração da narrativa falsa no sentido de que a condenação do réu Jair Bolsonaro seria consequência de uma ‘perseguição’ e de uma ‘ditadura’ desta Suprema Corte”.

Desaforo fiscal, por Fábio Alves

O Estado de S. Paulo

Se todos os gastos previstos saírem do papel, o ajuste exigido a partir de 2027 terá de ser muito maior

O cenário para o risco fiscal do Brasil em 2026, ano da eleição presidencial, é o seguinte: os investidores vão seguir aceitando desaforos nas contas públicas, com o governo jogando “lixo” para debaixo do tapete, ou seja, manobrando para colocar gastos extras para fora dos limites fixados no arcabouço fiscal, enquanto sonham com um robusto ajuste a partir de 2027.

É o que se deduz dos juros reais de 7,3% que o governo está pagando pelos títulos públicos com prazo de dez anos. Nessa taxa, já está precificada pelos investidores muita notícia ruim na área fiscal, com a expectativa de aceleração na trajetória da dívida pública. O problema é que há um risco concreto para surpresas negativas, o que poderá fazer com que os juros reais de dez anos retornem, em 2026, aos patamares exorbitantes do início deste ano, quando a taxa desses papéis chegou perto de 8%.

Pouso suave do PIB vai pesar menos, com inflação contida e emprego ainda forte, por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

IBGE divulga nesta quinta número de crescimento da economia no terceiro trimestre

Afora aberrações, resultado não deve alterar estimativas de alta de uns 2,1% no ano

Até agora, não há indício de que a economia brasileira não vá crescer uns 2,1% neste ano. No ano passado, o PIB cresceu 3,4%, o melhor desempenho desde 2011 (descontada a distorção causada pela variação excessiva da epidemia). Depois da Grande Recessão (2014-2016) e antes da epidemia, de 2017 a 2019, a taxa média de crescimento havia sido a miséria de 1,4% ao ano. Vai ser pouso suave.

Nesta quinta-feira (4), o IBGE divulga o PIB no terceiro trimestre e eventuais revisões. Pelo que se chuta de modo mais ou menos informado, o número trimestral não deve alterar a previsão para o ano.

O bolsonarismo sobrevive sem Bolsonaro? Por Wilson Gomes

Folha de S. Paulo

A prisão abre disputa, mas não destrói a identidade construída em uma década

Mesmo tendo se organizado em torno de um indivíduo, ele não é só um personalismo

E agora —com Bolsonaro fraco, preso e sem um herdeiro ungido—, o que será do bolsonarismo? A identidade política que moldou a direita na última década se dissolve? Fragmenta-se entre os filhos que tentam manter a marca como patrimônio familiar e os políticos que disputam o espólio eleitoral?

A dúvida só faz sentido porque nem todos estão convencidos de que o bolsonarismo exista como fenômeno substantivo ou que resista com o seu líder nessa condição.

Essas leituras minimalistas ignoram o que sabemos sobre identidades políticas. A psicologia social —especialmente a Teoria da Identidade Social— mostra que adesões duráveis não se reduzem ao carisma de um líder nem se desfazem automaticamente quando ele cai ou morre.

Uma identidade pode se organizar de muitas maneiras.

Pastores no Senado, por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Apoiadores de Messias querem levar clérigos ao Congresso para pressionar por aprovação

Lógica religiosa, que opera com absolutos morais, não combina bem com lógica da política, que privilegia negociações

Deu na Folha que aliados de Jorge Messias pretendem abarrotar o Senado de pastores para pressionar os parlamentares a aprovarem seu nome para o STF.

Messias é evangélico e seus apoiadores imaginam que a assembleia de clérigos poderá amainar a resistência de senadores a seu nome, que é muito mais política do que religiosa, curricular ou pessoal.

Misturar religião com política é uma combinação complicada. O ideal, na democracia, seria separar inteiramente as duas esferas. Mas é impossível fazer isso pela simples razão de que ambas as atividades são exercidas por humanos. E todo humano tem uma identidade religiosa. Mesmo eu, ateu irredutível e desprovido de qualquer traço identificável de espiritualidade, ocupo um lugar no espectro da religiosidade, que vai da descrença absoluta à devoção compulsiva.