sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

A imagem do espelho em Minas

César Felício
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Em relação ao quadro nacional, a sucessão mineira é o Brasil com sinal trocado. Se na sucessão presidencial os governadores tucanos Aécio Neves (MG) e José Serra (SP) ameaçam fragmentar o lado oposicionista, está no PT a divisão entre duas candidaturas à chefia do Executivo: uma de oposição dura em relação ao comando atual, representada pelo ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, e outra que cultiva boas relações com o Palácio da Liberdade, encabeçada pelo ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel.

Deverá vir como candidato do PSDB um tecnocrata clássico, considerado o gerente do atual governo: o vice-governador Antonio Junho Anastasia. É o equivalente mineiro à escolha lulista da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, para disputar o Planalto.

O elemento original é que no quadro mineiro o PMDB deverá ter candidato. É o ministro das Comunicações, Hélio Costa, que já tentou o cargo em 1990 e 1994. Pairam incertas personalidades que se aproximam mais do perfil de grandes eleitores do que de possíveis candidatos. Com prestígio popular em alta em função do martírio pessoal, o vice-presidente José Alencar é peça decisiva que oscila fora da órbita tucana. Colaborador nas vitórias tanto de Aécio quanto de Lula no passado, o ex-presidente Itamar Franco deve seguir sua tradição de definir-se por último. Operador da micropolítica municipal, o empresário, ex-ministro e ex-vice-governador Walfrido Mares Guia deve voltar a atuar em 2010, provavelmente do lado petista.

Anastasia no passado chegou a ser identificado em uma publicação mineira como "um popular", na legenda de uma foto em que aparecia abraçado a uma figura mais conhecida. Jamais disputou uma eleição e nem possui um passado marcado pela participação em movimentos de contestação ao regime, como Dilma. Nas últimas semanas intensificou sua agenda no interior do Estado, em atividades que buscam claramente identificar sua pessoa com o governo tucano.

A possível candidatura de Anastasia surgiu diante da falta de opções dentro do PSDB. A competição entre os grupos tucanos pela proximidade em relação a Aécio impediu que surgisse no partido outro nome além do vice, que assume a posição de titular no próximo ano seja qual for o destino do governador, que sairá para disputar a Presidência ou uma cadeira ao Senado. Em tese, Anastasia representaria um alto risco para Aécio, dificultando o projeto do mineiro de disputar a candidatura presidencial com Serra. Mas mesmo críticos ao Palácio da Liberdade comentam que o vice tem vocação política. "Ele surpreende pela flexibilidade, pela habilidade em fazer concessões em pontos que não alteram a essência do que busca. Sua capacidade negociadora é grande", diz o cientista político Rudá Ricci.

Sua possível candidatura em 2010 conta com trunfos: gravitariam em sua volta grande parte dos 852 prefeitos mineiros e a maior parte do empresariado, além da simpatia da mídia local. O retrospecto é ligeiramente favorável ao oficialismo em Minas. Nas 11 eleições democráticas no Estado desde 1947, o candidato governista venceu em cinco: Bias Fortes, em 1955, Newton Cardoso, em 1986, Eduardo Azeredo, em 1994, e nas duas eleições de Aécio, em 2002 e 2006.

Há uma concentração de vitórias no período mais recente. A oposição ao Palácio da Liberdade ganhou em 1950, com Juscelino Kubitschek; 1960, com Magalhães Pinto; 1965, com Israel Pinheiro; 1982, com Tancredo Neves; e 1998, com Itamar Franco. Foram outras cinco vitórias, quatro delas na fase pré-redemocratização. Muito desgastado, Newton Cardoso não participou da própria sucessão em 1990.

A eleição municipal do ano passado, contudo, foi um sinal preocupante para o aecismo. O grupo do governador assistiu ao crescimento do PT e do PMDB nas grandes cidades, ainda que o PSDB tenha se mantido com o maior número de prefeituras, ao vencer em 159 cidades.

A ânsia do PT nacional em fechar um acordo com o PMDB pode beneficiar Hélio Costa, que viu a vitória escapar na última hora nas duas eleições que disputou. E que, de certa maneira, voltou a ser um quase vencedor na eleição em Belo Horizonte no ano passado, com a candidatura do deputado Leonardo Quintão. Caso consolide sua candidatura, Costa deverá ser visto como o principal inimigo a ser batido pelo grupo de Aécio. O governador está muito mais distante do ministro das Comunicações do que dos seus dois adversários petistas. Em pesquisas não publicadas que circularam entre petistas e aliados de Aécio, Hélio Costa aparece na dianteira.

O potencial destrutivo da disputa entre Pimentel e Patrus não pode ser subestimado. No PT, o cenário de guerra para a escolha de candidatos é um roteiro quase permanente de derrotas futuras, como mostram os casos do Rio Grande do Sul em 2002 e de São Paulo em 2006. Muito ligado a Dilma, Pimentel poderá ser desviado da eleição para outra função. Mas mesmo neste caso, não é certo que Patrus seria o beneficiado. Os aliados do ex-prefeito sempre lembram a importância do PT abrir espaço para PMDB e outros parceiros na eleição estadual. Mineira de nascimento e de início de militância política, Dilma poderá atuar no quadro regional de um modo mais incisivo do que faria no Rio Grande do Sul, onde tem seu domicílio eleitoral.

Segundo maior colégio eleitoral do País, Minas parece subverter sua tradição de início tardio do processo sucessório. "A eleição só começa depois das paradas militares" era um dito célebre do ex-governador Hélio Garcia, que queria com isso dizer que somente após 7 de setembro, cerca de um mês antes das eleições, o quadro político tornava-se claro. Diante da nebulosidade do quadro eleitoral em São Paulo, onde Serra ainda irá arbitrar quem será o candidato tucano, em caso de conseguir a candidatura presidencial em 2010, e o PT enfrenta uma escassez de nomes viáveis, Minas ao que tudo indica deverá mostrar o seu jogo antes.

César Felício é correspondente em Belo Horizonte. A titular da coluna, Maria Cristina Fernandes, excepcionalmente, não escreve hoje

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