Os congressistas voltarão sob forte impressão do que viram no recesso, esticando a corda com o governo, que começa, porém, a dar sinais de que tentará recompor a coalizão esgarçada
Agosto, mês de desgosto, diz a superstição que já se confirmou algumas vezes na política brasileira. O mês começa com augúrios ruins, que o governo poderá esconjurar com ações efetivas para recompor a base parlamentar, buscando, ao mesmo tempo, responder à insatisfação das ruas (como Dilma fez ontem, levando a São Paulo R$ 8 bilhões para investimento em transportes), melhorar a aprovação do governo e as intenções de voto na presidente.
Deixemos as ruas, que ninguém governa, e foquemos a política institucional. Os congressistas voltarão sob forte impressão do que viram e ouviram nas respectivas bases, no recesso, buscando salvar a própria pele, vale dizer, a renovação dos mandatos na eleição que promete elevada renovação. Se isso não ocorrer, os protestos terão sido inconsequentes. E com essa disposição, vão continuar esticando a corda com o governo, derrubando vetos e aprovando propostas que contrariam o Executivo. No recesso, ao contrário do que alguns esperavam, Dilma não mexeu no ministério nem reformulou a coordenação política. Mas alguns sinais está dando de que compreendeu a natureza do presidencialismo de coalizão. Se os aliados não levam os anéis, mordem os dedos. E o resto.
Nesse sentido, o governo começou a peneirar as emendas de parlamentares que podem ser liberadas para aplacar um pouco do ressentimento, especialmente no maior partido aliado, o PMDB. O Planalto planeja convidar para uma reunião na próxima segunda-feira todos os líderes da coalizão governista, para tentarem acertar os ponteiros, repassando as contas do rosário de queixas. Dilma e o vice-presidente, Michel Temer, devem participar pessoalmente, pelo menos de uma parte desse encontro sem precedentes no atual governo. Pode ser o começo de uma restauração das relações que já vinham tensas e acabaram de se esgarçar após o início dos protestos: as propostas unilaterais da presidente, como a do plebiscito, desagradaram o Congresso, e a queda nas pesquisas deixou todo mundo à vontade para reclamara e atacar.
Humor do PMDB
A costura da aliança com nove partidos para 2014, já avançada, foi interrompida pela virada do vento a partir de junho, chegando o PMDB a externar a possibilidade de ruptura da coligação com o PT. Não bastasse, o próprio PT recaiu na divisão interna em relação ao governo e aos aliados. Mas ontem também surgiu aí um fato favorável ao realinhamento. O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT), fez críticas contundentes à aliança com o PMDB, considerando que, tal como se comporta, o aliado se torna “mais um problema que uma solução”. O presidente do PT, Rui Falcão, respondeu com uma nota curta e firme, reafirmando “a parceria governamental e a aliança eleitoral prioritária com o PMDB”, bem como a disposição do partido para reeditar a chapa Dilma-Temer. Os peemedebistas gostaram muito.
A pacificação, entretanto, vai exigir mais esforço da própria Dilma. Temer continua com a sondagem, por meio de questionários, sobre a disposição dos parlamentares em relação à aliança. Mais de 60 deputados já responderam à enquete, que, a pedido do vice, o ex-deputado Eliseu Padilha aplicará também aos senadores e presidentes regionais do partido. A sondagem vem revelando que alguns se queixam, com razão, do descaso, especialmente dos ministérios, da não liberação de emendas e da não participação no governo. Outros, entretanto, reclamam para ganhar mais, embora tenham tido verbas liberadas e indicados nomeados para cargos nos estados. É a gula.
Balas na agulha
Mesmo que a temperatura baixe, algumas derrotas o PMDB (e boa parte da base) não deixará de impor a Dilma. O melhor que ela faria, por exemplo, seria começar logo a negociar os termos da emenda constitucional (sobre a qual não terá poder de veto) que tornará impositiva a liberação das emendas parlamentares individuais ao orçamento, pois a aprovação é inexorável. A febre favorável já tomou conta da Câmara, e o Senado não fechará o portão neste caso. O governo poderia tentar negociar condições para evitar a pulverização dos recursos e garantir a vinculação deles a programas prioritários.
Alguns vetos serão derrubados. O do Ato Médico talvez não, pois há movimentos, no setor da saúde, pela derrubada (médicos) e pela manutenção (psicólogos, fisioterapeutas e outros segmentos). Já a derrubada do veto que manteve a cobrança de multa de 10% sobre o FGTS nas demissões sem justa causa (não confundir com os 40% que vão para o empregado), dificilmente alguém impedirá. A pressão dos empresários sobre os deputados foi enorme para que aprovassem o projeto. Agora, para que derrubem o veto. E são eles que vão financiar as campanhas do ano que vem. Com que cara um deputado pedirá dinheiro depois de lhes negar esse favorzinho (de milhões)? A MP do programa Mais Médicos segue na mira das bancadas rebeldes, mas ontem o próprio governo desistiu do serviço obrigatório de dois anos no SUS para os formandos em medicina. Alguns deputados já falam, porém, na exigência do exame Revalida para os médicos estrangeiros inscritos no programa.
Nas laterais
Para completar, agosto começa com os militares extremamente aborrecidos com o corte de mais de R$ 900 milhões no orçamento da Defesa. A Fazenda teve corte igual, mas eles ainda têm um forte sentimento de intocabilidade. Para o momento, não sei não… Em agosto tem o Dia do Soldado. Agosto leva ao 7 de Setembro, e as ruas prometem um grande protesto na data. Mangalô três vezes.
Fonte: Correio Braziliense
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