domingo, 11 de outubro de 2015

Sérgio Besserman Vianna - Crise e clima

• Quanto mais formos para a economia de baixo carbono no Brasil, maior será a geração de emprego e renda

- O Globo

Estava em Nova York na passeata de meio milhão sobre as mudanças climáticas no ano passado. Senti vida e história e me emocionei com gente e mensagens como as das milhares de professoras primárias: “Ensine ciência, mudanças climáticas são reais”.

Uma mensagem era individual, uma garota nos ombros do namorado segurava uma cartolina onde pintou “It’s all connected” (Está tudo conectado). Tirei foto e uso no meu curso de desenvolvimento sustentável na PUC. E é o nosso caso: o futuro do desenvolvimento do Brasil está conectado ao enfrentamento das mudanças climáticas.

O governo brasileiro acaba de enviar sua proposta de redução de emissões para a COP 21. Ela merece o reconhecimento: é melhor do que a dos EUA, da China e demais países de economia relevante, sendo superada em ambição apenas pela União Europeia. Esse reconhecimento merece dois reparos. O primeiro é que muito do que está ali teria de ser feito de qualquer maneira, como reduzir desmatamento, plantar áreas que ilegalmente foram desmatadas etc.

O segundo reparo é que, apesar do ótimo trabalho em diversos setores do governo (Ministério do Meio Ambiente, Embrapa e outros ) predomina ainda uma visão defensiva, incapaz de perceber tudo o que está em jogo. Como um técnico que abrisse mão da chance de montar uma seleção do nível de 1958 ou 1970 com grandes craques e escalasse um monte de volantes defensivos.

Excelentes estudos contratados à academia pelo Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas mostram que, quanto mais ambiciosa for a caminhada para a economia de baixo carbono no Brasil, maior será a geração de emprego e renda, o crescimento do PIB.

Mesmo esses estudos não têm como considerar que a economia global sofrerá profundas alterações com a inevitável precificação progressiva das emissões de gases de efeito estufa, afetando não apenas o setor energético mas muito mais: os materiais que serão utilizados, a forma como as cidades se organizam, a disponibilidade de água, a cultura e os objetos de desejo, as empresas e setores que crescerão e as que morrerão, a geopolítica entre as nações e tudo o mais.

O Brasil está mergulhado em profunda crise. Na economia necessita ajustar conjunturalmente as contas públicas degradadas pela política econômica de 2008 a 2014, corrigir estruturalmente o desajuste dessas mesmas contas criado pela Constituição de 1988, elevar muito a taxa de investimento privado e público e, o que nos remete ao clima ( “Está tudo conectado”), voltar a se inserir competitivamente na economia global.

O Brasil é o único país de economia relevante no mundo que tem a opção de se tornar tão mais competitivo quanto mais aceleradamente o mundo caminhar na direção do baixo carbono. O único. Ô Dilma, tira os volantes e escala Didi, Gerson, Pelé, Garrincha e Tostão.
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Sérgio Besserman Vianna é economista

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