Política requer maturidade, não necessariamente no aspecto etário – afinal, há muitos jovens políticos que desempenham muito bem seu ofício. O amadurecimento, aqui, refere-se principalmente à capacidade de refletir sobre a realidade antes de tomar decisões e defender ações que a modifiquem.
Nesse sentido, a política é muito trabalhosa, pois requer um diálogo constante com todos os que são atingidos pela realidade que se pretende alterar e que, portanto, têm algo a dizer sobre ela. Numa democracia plena, é esse processo de negociação, geralmente longo e desgastante, que amadurece as ideias antes de convertê-las em realizações.
Como consequência, os verdadeiros estadistas são os que tomam decisões não como resultado de algum dom excepcional, e sim em razão de sua capacidade de julgar os fatos pelos olhos dos outros e de arregimentar apoio, por meio da persuasão, para mudar esses fatos, isto é, para alterar a realidade que a tantos afeta.
Todo esse processo, ademais, deve se dar no âmbito das instituições democráticas, pois é ali, sob a égide das leis, que o poder de quem tem autoridade para tomar decisões é moderado. É o respeito a essas instituições – também estabelecidas por consenso ou por maioria democrática, e não pela força – que legitima as decisões que delas emanam.
O alarido, portanto, não é bom conselheiro. Decisões de Estado tomadas ao sabor da gritaria das redes sociais, como tem se tornado perigosamente comum, carecem dos elementos básicos de uma política madura. São iniciativas que primam pela irresponsabilidade, como acontece em regimes que se pretendem em conexão direta com o “povo” – nestes, invoca-se a suposta cumplicidade do líder com a massa para considerar como legítima qualquer ação dessa autoridade, mesmo as que seriam consideradas flagrantemente ilegais caso vigorasse o Estado Democrático de Direito.
Esse populismo desbragado, que desfigura a política, vem avançando no Brasil com notável desenvoltura, especialmente em razão da circulação cada vez mais veloz de informações por diversos meios eletrônicos, em particular as redes sociais na internet. A apreensão da realidade, essencial na atividade política, tornou-se praticamente impossível diante da difusão anárquica e em tempo real de versões dos fatos – e muitas vezes de versões sobre outras versões, que nem precisam se basear em fatos para serem encaradas pelos frequentadores das redes como expressão da verdade.
A realidade é sempre muito mais complexa do que as redes sociais, com suas “verdades” definitivas ditadas levianamente em algumas dezenas de caracteres, pretendem fazer crer. Por esse motivo, para atuar sobre essa realidade é preciso esforçar-se para conhecer suas múltiplas facetas, sem render-se ao conforto da ideologia – que para tudo oferece respostas definitivas e inegociáveis, que não se baseiam no real, e sim num sistema de pensamento que confere a tão desejada “lógica” ao caos do mundo. Renuncia-se à razão, sem a qual não se faz política responsável.
A política brasileira, contudo, parece cada vez mais inclinada a render-se a essa onda de irracionalidade, como resultado da revolução de costumes prometida pelos arautos da “nova política”. Na fogueira moralista dessa inquisição se imolaram não apenas os maus políticos, mas toda a política, especialmente aquela que presume o diálogo em busca de construção de maiorias para aprovar projetos de interesse público. Em seu lugar, surgiu algo que já podemos chamar de “política em tempo real”, que despreza profundamente o diálogo e atua aos encontrões, de forma irrefletida, para tentar transformar em realidade os devaneios do líder e de seus seguidores.
Pode até soar engraçado quando o presidente Jair Bolsonaro informa que fará uma enquete no Facebook para colher opiniões antes de decidir se acaba ou não com radares em estradas. Pode parecer pitoresco que deputados governistas prefiram falar com seus eleitores em tempo real, por celular, no plenário da Câmara, em vez de se dedicarem à busca de votos para os projetos que apoiam. O fato, porém, é que essas e tantas outras atitudes esdrúxulas não têm graça nenhuma. São, antes, sinais sombrios de que a política, justamente no momento em que o País mais precisa dela, está dando lugar à pura e simples algaravia.
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