- Folha de S. Paulo
Ex-juiz derrapa ao admitir que tentou praticar uma espécie de caixa dois processual
Até agora, Sergio Moro não se saiu muito bem no papel de inquirido. O ex-juiz derrapou ao admitir que indicou uma testemunha aos procuradores da Lava Jato sem respeitar formalidades. “Recebi aquela informação e, vamos dizer, foi até um descuido meu, apenas passei pelo aplicativo”, afirmou, na sexta (14).
Embora tenha reconhecido o desvio, o ministro diz que não há nada anormal no caso. A alegação, porém, falha em alguns testes básicos. Ao fazer uma colaboração não declarada com a parte acusadora, Moro não parecia ser vítima de distração.
Em diálogo publicado pelo The Intercept, o procurador Deltan Dallagnol afirma que uma testemunha indicada informalmente pelo juiz não estava interessada em falar. Ele diz, então, que faria uma intimação com base numa notícia anônima. Só depois da sugestão dessa farsa Moro afirma que seria “melhor formalizar”.
O ministro da Justiça argumenta que a lei prevê esse tipo de repasse de informações, mas deixa de dizer que o envio deveria ter sido registrado oficialmente desde o início. Se a testemunha tivesse aceitado o contato de Dallagnol, a colaboração teria sido mantida em segredo, numa espécie de caixa dois processual?
Outras explicações ainda deverão ser cobradas de Moro. A divulgação das conversas não corroeu a popularidade do ex-juiz, mas alterou sua posição de equilíbrio em Brasília. Nos últimos dias, ele se tornou um pouco menos ícone da Lava Jato e um pouco mais ministro de Bolsonaro.
O trabalho pregresso permitia que Moro se escorasse no passado para transitar com relativa independência. A aura de juiz valia para que ele pudesse dizer até que, ainda que tivesse entrado no governo, não fazia parte do mundo político.
O descuido de Moro mudou o jogo. Ele teve que aguentar dias de silêncio até que seu chefe manifestasse apoio público a ele diante do caso. Depois de acompanhar o subordinado a uma cerimônia de condecoração e a um jogo de futebol, Bolsonaro demonstrou que, agora, o ministro precisa se amparar no presente.
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