Com aval do Planalto, Sérgio Moro transforma vazamento de conversas com procuradores em “plebiscito” dos que são contra e a favor da Lava Jato.
Vera Rosa / O Estado de S. Paulo
Estratégia do ministro, com aval do Planalto, é transformar o vazamento de mensagens atribuídas a ele em um debate entre quem é a favor ou contra a operação
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, traçou uma estratégia para transformar o vazamento da troca de mensagens atribuídas a ele, quando juiz, e a procuradores da força-tarefa em Curitiba em uma espécie de plebiscito dos que são contra e a favor da Lava Jato. A contraofensiva tem o aval do Palácio do Planalto e foi discutida com o próprio presidente Jair Bolsonaro, na semana passada, após a análise de pesquisas encomendadas pelo governo sobre o episódio, além do monitoramento das redes sociais.
Os resultados indicaram que o apoio à Lava Jato – operação sempre associada ao combate à corrupção – supera a desconfiança em relação ao conteúdo de conversas pelo celular, no aplicativo Telegram, entre Moro e o procurador Deltan Dallagnol. Foi somente após essa avaliação reservada que Bolsonaro quebrou o silêncio e saiu em defesa do ministro da Justiça, um dos pilares de sustentação de seu governo.
Apesar de destacar o legado do ministro, o presidente disse ontem que não existe confiança 100%. “Eu não sei das particularidades da vida do Moro. Eu não frequento a casa dele. Ele não frequenta a minha casa por questão até de local onde moram nossas famílias. Mas, mesmo assim, meu pai dizia para mim:
‘Confie 100% só em mim e minha mãe’”, afirmou Bolsonaro. A declaração foi feita um dia após novas conversas divulgadas pelo site The Intercept Brasil indicarem que Moro teria pedido aos procuradores da Lava Jato a produção de uma nota à imprensa para responder o que chamou de “showzinho” da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois do depoimento do petista no caso do triplex do Guarujá. O ministro não reconheceu a autenticidade da mensagem.
Com idas e vindas, a tática para blindar Moro e afastar a crise do Planalto consiste em jogar a opinião pública contra deputados, senadores e até ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) que tentarem vincular os diálogos vazados a ilegalidades em julgamentos, como o de Lula, preso desde abril do ano passado.
O argumento usado contra os críticos é o de que existe uma “orquestração” para esvaziar a Lava Jato.
Quem conversou com Moro, nos últimos dias, encontrou um homem abatido. Apesar de dizer que não cometeu conduta imprópria à época em que era o superpoderoso juiz de Curitiba, ele pareceu constrangido de ter o nome envolvido em um escândalo. De julgador, passou a ser julgado.
“Fui vítima de um ataque criminoso de hackers”, afirmou Moro ao Estado. “A Operação Lava Jato foi um trabalho muito sério, profissional e difícil, feito a um grande custo pessoal de todos os envolvidos no caso. Sempre me pautei pela legalidade.”
Sob pressão do Congresso e até do Judiciário, Moro virou uma espécie de curinga para Bolsonaro. Se o cenário não levar a uma reviravolta, o titular da Justiça poderá ocupar uma vaga de ministro do Supremo, segundo o presidente. Antes dos vazamentos, Moro também era citado como possível candidato ao Planalto, em uma disputa sem Bolsonaro na corrida à reeleição, em 2022. Ou mesmo em uma dobradinha como vice. “Eu aceitei o convite para ser ministro da Justiça e Segurança Pública. Não há outro projeto na minha vida”, garantiu o ministro.
Todos esses planos, no entanto, podem ruir dependendo da próxima temporada política. No dia 25, a Segunda Turma do Supremo vai retomar o julgamento em que Lula acusa Moro de ter sido parcial ao condená-lo no caso do triplex e, depois, entrar para a equipe de Bolsonaro. Para reforçar a acusação, os advogados do ex-presidente encaminharam à Corte as conversas atribuídas a Moro, nas quais ele daria dicas aos procuradores.
“Tenho receio de que isso venha a tomar um vulto que possa prejudicar o País”, admitiu o general Eduardo Villas Bôas, assessor especial do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
Sangramento. No Congresso, o movimento da oposição e de partidos do Centrão ainda não é para abrir a “CPI da Vaza Jato”, mas, sim, para deixar Moro “sangrar” em praça pública. Quando juiz, ele foi algoz de vários parlamentares e até hoje enfrenta resistências para a tramitação de seu pacote anticrime, que prevê o combate à corrupção, ao crime organizado e à criminalidade violenta.
“Acho que Moro já sabia que não teria vida fácil na política”, comentou o deputado Capitão Augusto (PL-SP), presidente da Frente Parlamentar de Segurança e relator do grupo de trabalho que analisa a proposta. “Agora, querem aproveitar a turbulência para emplacar no Senado o projeto que coíbe o abuso de autoridade, mas não é momento de resgatar isso. Fica parecendo jus sperniandi”, emendou, em referência à expressão usada no meio jurídico para o direito de “espernear”.
Nem mesmo no PT de Lula, porém, há acordo sobre o melhor caminho a seguir para enfrentar Moro. Na quarta-feira, a deputada Gleisi Hoffmann (PR), presidente do partido, subiu à tribuna para defender a CPI. “Moro, o grande orientador do Ministério Público Federal, montou, armou, produziu testemunhas. Para quê? Para condenar e prender o Lula”.
Para o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), no entanto, seu partido erra ao adotar essa tática. “Eu, por exemplo, não quero CPI para Moro. Quero sua demissão. E também sou contra convocá-lo para vir aqui, porque a gente fala dez minutos e ele, três horas. É um palanque”, argumentou o petista.
Moro prestará depoimento na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado na próxima quarta-feira. Na tentativa de evitar mais desgaste, ele próprio se ofereceu para falar em um território no qual a oposição não faz tanto barulho.
“A imagem do ministro está em jogo e essa é a Casa da moderação”, observou a senadora Simone Tebet (MDB-MS), presidente da CCJ. Logo depois, porém, a Câmara aprovou convite para que Moro também explique as mensagens atribuídas a ele em uma sessão de duas comissões, marcada para o dia 26
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