- O Estado de S. Paulo
Fernanda Montenegro recusou ministério por não se julgar preparada para a função
Uma correspondente do The Guardian me liga para uma entrevista. Quer falar do desmonte da cultura pelo governo B*. Ela, polidamente, não usou a palavra desmonte, deixando-a por minha conta, assim como referiu-se a B* por extenso, até porque o asterisco é um recurso apenas gráfico, universalmente empregado para complementar vocábulos de baixo calão ou antropônimos indesejáveis como T***p, que é como a escritora Joyce Carol Oates sempre se refere ao alaranjado ogro da Casa Branca.
A indicação de Regina Duarte me pareceu o lead da reportagem. O que eu acho dela como atriz, o que esperar de sua gestão, daí partiu nossa conversa.
Talento histriônico não vale um tostão no ofício que lhe foi oferecido com metafóricas alianças de noivado. Se valesse, teríamos exigido, com moções e passeatas, que Fernanda Montenegro aceitasse os convites que Itamar e Sarney lhe fizeram para ministra da Cultura, e ela - que não é rainha só no nome - recusou, por não se julgar devidamente preparada para a função.
Regina tem um quê de donzela careta e um jeito lamecha, piegas (“corny” expressa melhor o que quero dizer), de interpretar e falar que sempre me impediram de avaliar, com isenção, os seus dotes de atriz. Se Henfil ainda fosse vivo, ela já teria uma lápide no Cemitério do Cabôco Mamadô pelas insânias que desde as eleições de 2002 vem dizendo publicamente e há bem uns quatro anos proclamando em louvor a B*, segundo ela, “um cara doce”, e “homofóbico só da boca pra fora”.
Verdade que essas foram suas impressões ao conhecer o futuro “noivo”. Hoje, aos olhos dela, ele também só deve ser sexista, racista, miliciano, etc. da boca pra fora.
Teoricamente, Regina teria sido uma escolha esperta, uma ponte conciliatória com a classe artística, o tal algodão entre os cristais e clichês que tais. Só que não era bem essa a intenção do capitão. Ademais, para apagar a deplorável impressão deixada pelo ex-secretário de Cultura Roberto Alvim, antes mesmo de o exu de Goebbels baixar nele, B* teria de fazer um gesto de grande impacto, preenchendo aquele cargo não com a “namoradinha do Brasil”, mas com outro astro global, como, por exemplo, José de Abreu.
Ok, extrapolei ao mencionar justamente o ator que mais tem avacalhado o presidente na internet, embora qualquer exemplo seja válido a esta altura da debacle. Nenhuma pessoa séria, pouco ou nada competente, como tem sido a regra das nomeações, toparia manchar sua reputação alugando sua mais-valia a este governo de chanchada.
Como nos troca-trocas anteriores e seguintes (o bicão da FAB Vicente Saltini saiu, entrou e saiu de novo da Casa Civil depois dos esponsais da Regina), B* quase não tinha opções em seu cada vez mais restrito círculo de apaniguados e oportunistas de plantão. Alexandre Frota teria sido o sucessor (ou mesmo o antecessor) automático de Alvim Goebbels se não tivesse rompido relações com o capitão.
Regina topou porque é b****narista de raiz e não tem nada a ganhar do ponto de vista financeiro, pois dinheiro não lhe falta, sem contar a pensão que herdou do pai militar. Os jornais e as mídias sociais trouxeram à baila um IPTU que ela não teria quitado e pendências em prestação de contas em recursos captados via Lei Rouanet, labéus que, concretamente, não a tornam nem mais nem menos habilitada a cuidar de nossa cultura.
Se desagradar ao chefe, se não tocar direitinho o projeto de destruição da cultura, viga mestra do assalto nazipentecostalista a todas as instâncias públicas capitaneado por B*, Regina dança. Se para o seu posto convidarem Susana Vieira, a pândega será completa.
Qualquer dúvida, é só recorrer de novo a Geigê Gonçalves, a faxineira do Vale do Jequitinhonha que ficou rica nos EUA e há tempos se notabilizou por montar telões na Times Square contra o PT e a favor de B* e M*ro. Reportagem da Veja apontou-a como a madrinha dos indicados ao mandarinato cultural. Já sabemos quem ajudou o Aiatolavo a abrir a caixa de Pandora.
Afinada com a barbárie, Regina começou no compasso certo, ao convidar para secretária adjunta uma reverenda, Jane Silva, que nem ao espalhar que Lula bancara a embaixada da Palestina para financiar o terrorismo no Brasil, conseguiu ganhar fama duradoura. Com sua vocação para fabricar fake news e aleivosias, Jane tem assento cativo em qualquer dos ministérios que consubstanciam a essência do que o juiz Jerônimo Azambuja Franco rotulou, nas páginas deste jornal, de “merdocracia neoliberal neofascista”.
Seu perfil dispensaria ajustes caso a transferissem para o aprisco da Damares Alves, a “ministra do velório libidinal”, na definição irretocável da escritora e colunista Tati Bernardi, ou para o templo da ignorância e da incompetência em que se transformou o ministério da Educação tutelado pelo apedeuto Abraham Weintraub.
Damares continua mais firme que a falência ética, moral e econômica do País, justamente por ser um de seus alicerces. É tão absurda e ridícula que chega a ser engraçada, uma Dercy Gonçalves moralista e de direita. Já Weintraub, nem fantasiado de odalisca punk nos faria esquecer de seus contínuos rompantes macarthistas, atribuindo qualquer faux pas de sua gestão a um complô comunista. O mais recente foi dizer que “quem critica erro no Sisu é de esquerda”. Não sabia que existia tanto esquerdista no Brasil.
Muita gente aposta que Weintraub não chega ministro ao próximo carnaval. Se ele ainda não comprou a fantasia de odalisca punk, o prejuízo será menor.
Não sou tão otimista assim. Creio que B* irá mantê-lo por mais um tempinho. Dos paus-mandados do presidente, Weintraub é o que melhor espelha o chefe. Perto dele, B* pode até dar a impressão de ser ligeiramente menos bronco. E até mais educado. Mais doce, só Regina Duarte deve achar isso.
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