quarta-feira, 26 de novembro de 2025

27 dias para obter trégua e votar o que falta, por Lu Aiko Otta

Valor Econômico

Momento não poderia ser pior para a deterioração da relação do governo com o Congresso

Em termos de climão, a cerimônia de sanção da lei que eleva para R$ 5 mil o limite de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), marcada para esta quarta-feira (26), promete. Até a tarde da véspera, era incerto se o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), compareceriam.

“Boa pergunta”, reagiu um membro do governo quando questionado se os dois iriam à cerimônia. Com ou sem eles, acrescentou, haverá celebração.

É um cenário muito diferente de quando o projeto foi apresentado, em março. Naquela ocasião, Motta posou ao lado de Lula segurando o projeto. Alcolumbre foi representado pelo senador Weverton Rocha (PDT-MA), pois na mesma hora conduzia uma votação importante. Os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, iniciaram seus discursos ressaltando a presença de líderes do Congresso e falaram em aperfeiçoamentos ao texto. A proposta foi empacotada como uma parceria entre Executivo e Legislativo.

De fato, foi. Aos trancos e barrancos, a reforma do IRPF foi aprovada pelas duas casas legislativas, mantendo o pressuposto de neutralidade fiscal - ou seja, não traz ganho nem perda de arrecadação. Seria justo que Motta e Alcolumbre participassem da festa de entrega da nova lei à sociedade, já que não é obra só do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O momento, porém, não poderia ser pior. Insatisfeito com a indicação de Jorge Messias ao Supremo Tribunal Federal (STF), Alcolumbre rompeu relações com o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), e pautou matérias que desgastam o governo. É o caso da “bomba fiscal” dos agentes comunitários de saúde, aprovada ontem. O custo é estimado em R$ 40 bilhões em dez anos. Motta, por sua vez, disse que não fala mais com o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ).

O caos se instala no momento que a prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro faz ressurgir a ideia de conceder anistia aos condenados do 8 de janeiro.

O problema é que há matérias econômicas que precisam ser votadas. E faltam 27 dias para o início do recesso parlamentar.

Entre as pendências, a proposta que detalha a parte administrativa da reforma tributária. O novo sistema entra em fase de testes no dia 1º de janeiro de 2026. “Temos uma regulamentação, temos um sistema para colocar de pé logo em janeiro, as empresas têm nos demandado uma série de perguntas e dúvidas legítimas sobre isso”, contou o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, na segunda-feira.

Também aguarda votação o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026. Em seguida, será preciso votar o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) do ano que vem.

Definições sobre o Orçamento estão pendentes de outras discussões não concluídas no Congresso, que elevam as receitas de 2026 em R$ 30 bilhões.

Desses, R$ 20 bilhões virão do projeto de lei complementar que corta gastos tributários em 10%, de forma linear. Essa é a proposta do governo. Mas, como mostrou o Valor no último dia 10, a intenção de Motta é votar um texto alternativo que estabelecerá um corte escalonado.

Os outros R$ 10 bilhões são esperados de um projeto de lei que eleva a taxação sobre bets, fintechs e distribuição de juros sobre o capital próprio. São propostas já rejeitadas pelo Congresso em tempos de paz.

A medida provisória (MP) que atende empresas afetadas pelo tarifaço perderá validade no dia 11, se não for votada. O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, disse que no limite será possível reeditar a MP após o dia 22 de dezembro, quando acaba a sessão legislativa de 2025.

A ver se será possível restabelecer condições para votar o que falta.

Correios

Era aguardada para ontem a resposta dos bancos à proposta dos Correios, para a formulação de um plano de recuperação. O plano A é a empresa contratar um empréstimo bancário com aval do Tesouro Nacional. A expectativa é que o plano seja sólido, para reduzir os riscos de a garantia da União ser acionada.

Um aporte de capital na empresa não está nos planos, informou Durigan. Mas, admitiu, é possível que apresente mais prejuízo no ano que vem e haja novas dificuldades para o cumprimento da meta fiscal.

O aporte não está no radar, mas há amparo legal para que seja feito. No meio técnico, há quem diga que seria prudente já incluir alguma previsão para essa operação no Orçamento.

Colocar dinheiro da União nos Correios seria uma despesa primária, ou seja, impactaria o cumprimento das regras do arcabouço. Um aval seria despesa financeira, que não afetaria as metas fiscais, mas elevaria a dívida pública.

Avais da União para empréstimos tomados por estatais não são novidade. Há perto de R$ 6 bilhões em operações desse tipo. Metade corresponde a um crédito tomado pela Eletronuclear para a construção de Angra 3. A estatal enfrenta dificuldades financeiras, e Haddad já avisou que prepara um posicionamento definitivo em relação à usina. “A indefinição é ruim”, disse um interlocutor do ministro.

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