Mírian Leitão
DEU EM O GLOBO
A MP 462 é para ajudar os municípios em época de crise. Mas o deputado Sandro Mabel fez dela uma central de contrabando. Ela suspende licença ambiental para estradas; dá ajuda a estaleiro; e recria um benefício para exportador que pode fazer o Tesouro perder mais de R$ 200 bilhões. A senadora tucana Lúcia Vânia também socorreu os exportadores na MP 460 e garante que foi a pedido do governo
DEU EM O GLOBO
A MP 462 é para ajudar os municípios em época de crise. Mas o deputado Sandro Mabel fez dela uma central de contrabando. Ela suspende licença ambiental para estradas; dá ajuda a estaleiro; e recria um benefício para exportador que pode fazer o Tesouro perder mais de R$ 200 bilhões. A senadora tucana Lúcia Vânia também socorreu os exportadores na MP 460 e garante que foi a pedido do governo
A MP da senadora tucana trata dos subsídios para casa de pobre, mas nela foi incluído o mesmo presentão para os exportadores. Ela acha o cálculo de que a concessão vai custar R$ 200 bilhões exagerado. Diz que ouviu do economista Luiz Gonzaga Belluzzo que são “apenas” R$ 74 bilhões. A propósito: essa módica quantia é equivalente a todo o dinheiro federal previsto no PAC de todo o segundo mandato do governo Lula.
Os exportadores estão brigando na Justiça desde os anos 80 pelo direito de manter vivo um incentivo fiscal que já começou com data para acabar. Já perderam em várias ações, ganharam outras, discutiram inúmeras formalidades.
Advogados encontraram brechas. As ações se multiplicaram. Tudo para manter vivo o benefício. Com medo de perder na Justiça e terem que reverter o que fizeram nos últimos anos, eles atacaram então no Congresso pelas duas Casas, contando com a mobilização da bancada do governo, a ambiguidade do Ministério da Fazenda e a ajuda da oposição.
Quem paga a conta? Você que me lê, eu, nós todos.
O subsídio foi inventado pelo governo militar. O então presidente Costa e Silva, com poder conferido a ele pelo AI5 — como diz o texto — baixou decreto dando esses subsídios aos exportadores.
Era um favorecimento tão escandaloso que os parceiros comerciais retaliaram e os próprios militares acabaram com ele em 1983. Depois, houve outro cancelamento automático de subsídios em 1990, com a Constituição. Ou seja, se ele tivesse sobrevivido à primeira extinção, acabaria na segunda.
O ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel é que sabe a história toda.
— Não se trata de desoneração de exportação.
Isso existe e é perfeito. A questão é que o exportador tinha um crédito do valor do imposto que ele pagaria se houvesse imposto. Era um prêmio mesmo, um subsídio que o governo teve que acabar por exigência da OMC.
Agora, o beneficio é ressuscitado e ganha sobrevida até 2002 tanto na MP da senadora tucana — aprovada na terça-feira — quanto na de Sandro Mabel, ainda não votada. A MP 460 tem que voltar à Câmara porque foi mudada; mas lá já há outra sendo votada. Se a 460 passar na Câmara, esse ponto da 462 será considerado aprovado automaticamente.
Ganha-se tempo e muito dinheiro com a manobra.
A senadora Lúcia Vânia (PSDB-GO) disse que a primeira versão da proposta foi da senadora Ideli Salvati (PT-SC), numa MP retirada pelo próprio governo.
Quando ela virou relatora, passou a ser procurada.
— Vieram falar comigo vários parlamentares, o líder do governo Romero Jucá, a Ideli, o senador Mercadante, o professor Belluzzo, o presidente da Camex e tudo foi discutido com o Adams (o procuradorgeral da Fazenda Nacional, Luís Inácio Lucena Adams).
Belluzzo disse que tem um estudo dele e do Luciano Coutinho fazendo uma avaliação que o custo não é tão alto quanto se diz, mas de apenas R$ 74 bilhões. Acho que é isso, se me lembro assim de cabeça — diz.
Roberto Giannetti da Fonseca, da Fiesp e da Associação dos Exportadores de Carne, corrigiu o dado. O estudo de Belluzzo — um dos conselheiros do presidente Lula e de Luciano Coutinho, presidente do BNDES — diz que custa R$ 62 bilhões.
— Eu só coloquei no texto porque o líder do governo concordou e em função de os entendimentos estarem bem adiantados no governo. Na verdade o governo não bateu o martelo e há divergências lá, mas segundo informações que tivemos no governo, a negociação está acontecendo há seis meses — diz a senadora Lúcia Vânia.
Ela admite que o que está no relatório dela foi feito por outra pessoa: — Não é de minha autoria, ele foi colocado lá por eles, do governo. Não nasceu do nada, foi a décima quinta versão desse grupo de trabalho do governo. Imagino que eles estão fazendo esse debate interno.
Não sei o que eles querem fazer com isso.
Esta é a oposição! A senadora não sabe muito bem por que incluiu, atribui a “eles” do governo. Quanto ao deputado governista Sandro Mabel (PR-GO), é ainda pior: pendurou na MP dele uma quantidade extravagante de contrabandos que ele mesmo passou a chamá-la de árvore de natal. A proposta dele também traz a validade do créditoprêmio até 2002, permite que seja usado por quem tem o crédito ou por terceiros.
Permite a atualização em parte pelo IPC em parte pela Selic. Cria situações complicadas como o pedido do registro das exportações. Como esse assunto remonta aos anos 80 teria que ser com a falecida Cacex. E diz que é convertido em moeda nacional.
Imagina só o que pode ser esse critério de conversão cambial? Tem contrabando lá que não é biscoito. Um deles suspende ou facilita licença ambiental para estradas. Tem um endereço: a BR-319 que acabou de ter seu estudo de impacto ambiental devolvido pelo Ibama ao DNIT porque é insuficiente.
Com Alvaro Gribel e Bruno Villas Bôas
Nenhum comentário:
Postar um comentário