- Folha de S. Paulo
Só decifrando a linguagem da caserna para explicar Bolsonaro
Cada época tem a gíria que merece. Gíria aí significando a linguagem de um grupo fechado, a qual, a princípio, só fazia sentido dentro dele próprio, funcionando como código de defesa, mas cuja ação e importância, por algum motivo, se expande, se multiplica, fura a bolha e faz com que suas histórias, narrativas, hábitos, atitudes, palavras comecem a ser admirados, imitados e muitas vezes mal interpretados pela sociedade em geral. O fenômeno vale para uma patota de amigos da esquina, uma torcida de clube, um bando de marginais ou um conjunto musical.
A repórter Naira Trindade, no jornal O Globo, mostrou que o jargão da caserna domina o dia a dia do governo, que tem —além do presidente, um capitão do Exército aposentado, e do vice, um general da reserva— oito militares ocupando o alto escalão, alguns deles com gabinete no Palácio do Planalto.
Donde os civis que ainda estão em Brasília não se espantam mais em ouvir expressões como “bizu” (conselho), “papirar” (estudar), “estar de baixa” (estar doente), “arranchar” (comer), “plotar” (descobrir) ou “galho fraco” (tarefa fácil de cumprir). Qualquer missão dada é missão cumprida, porque soldado se vira.
Em meus tempos na tropa do Forte de Copacabana (“um ano, zero mês e 25 dias”, conforme consta na certidão de alistamento), convivi com essas e outras gírias. Se você trabalhava no rancho, preparando e servindo uma “Sandra Bréa atropelada” (prato com pedaços de galinha), ficava conhecido como “pé-de-banha”. Aquele que não aprendia a marchar virava “mocorongo”. “Acerta o passo, mocorongo” era o grito do sargento durante a ordem unida.
Quem “aloprava” (ou seja, descumpria ordens) estava sujeito à expulsão. Um exemplo de “aloprado” é o presidente que conspira com extremistas de direita para derrubar o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal.
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