A HORA DO BODE NO SALÃO
Wilson Figueiredo
O presidente Lula não perde tempo. Depois de pedir bom tratamento para sua candidata à sucessão de 2010, com a mesma cautela política (equivalente ao caldo de galinha), o presidente pesquisa um nome para ser vice de Dilma Rousseff. A pressa se explica pela conveniência de evitar que aventureiros atravessem o caminho da eleição sobre a qual a única certeza é a garantida da data na Constituição. É por aí.
A democracia não precisa fazer dieta eleitoral para evitar dificuldades previsíveis. Partidos demais, moralidade de menos, promiscuidade de presidente e governadores em eleições de conveniência, a sombra de inflação e a estréia do reforço da classe média, além de problemas sociais misturados a questões policiais, estão à disposição. Lula convocou ao Planalto os pombos correios encarregados da ligação com o Congresso e, para dissipar o clima de gazeta parlamentar, reativou a messiânica reforma política, cuja função é fazer o papel do bode no salão. Não é preciso aprová-la, basta retirá-la.
A preocupação que Lula confirma é a de se antecipar aos problemas para não ser por eles atropelado. Cria oportunidade para alguma coisa que ainda não se percebe com clareza, mas que pode depender até da escolha do vice. O presidente passou fagueiramente ao segundo ponto do programa, que é a escolha do vice e o preenchimento do vazio político gerado pelo fim do terceiro mandato, o bode que rondava a democracia. Por enquanto, candidatura de Dilma Rousseff continua lance pessoal do presidente, inclusive na identificação de alguém para acompanhá-la em tão longa jornada.
A atenção presidencial não se fixou no deputado Ciro Gomes, que se pôs ao alcance de Lula desde muito antes, pelo pavio curto demais. Ciro contava certo com o convite para candidato a presidente, mas a precedência é de quem a tem. Continua de Lula; que recusou o terceiro mandato, e nada mais. Mantém o pedaço presidencial e a oportunidade de colher votos semeados em terreno social fértil, politicamente sem dono, nos dois governos.
Recusou o terceiro mandato pelo perigo de esquartejamento liberal. Retirou-se da hipótese. Preferiu a ministra Dilma e ficou atento à ressonância. Nenhuma estridência. Nenhuma divergência. Mas não faltaria o eco de Ciro Gomes, que esperava a deferência presidencial e, preterido pela surpresa, entrou no ciclo predatório que pode não eleger, mas lava a alma.
Com o jeito de quem nada quer mas tudo aceita (em proveito da pátria), o deputado Ciro Gomes reapareceu em nota de coluna com um recado para o destinatário decifrar em tempo de reparar a falha. Avisou, a quem interessar pudesse – a Lula, bem entendido, que a oposição já se delineia como a favorita para a sucessão presidencial de 2010. Por cima do Banco Central, o enfático Ciro Gomes dirigiu-se a Lula e se apresentou em condições de garantir que "o crescimento econômico de 2009 vai ser bem menor". O presidente não passa recibo, mas sabe que a alternativa de baixar os juros, em vez de elevá-los, poderia produzir no subsolo do regime abalos de grau menos previsível. E concluiu que talvez seja cedo para completar a chapa presidencial.
Aquele Ciro Gomes que, como coroinha de Lula, o acompanhou em ato de contrição pública no agradecimento a Deus por não ter sido eleito, e com isso evitou o pior para os brasileiros, volta a vestir-se de cangaceiro. Declaração favorável à oposição para 2010 tem grau de provocação.
Equivale a tirar o tapete vermelho estendido a Lula pela História.
A situação seria mais republicana se os dois, Lula e Ciro, tivessem atribuído aos eleitores o atestado público de sabedoria política por não elegê-los quando tinham apenas ordens menores recebidas das urnas. Lula já tem ordens superiores, mas Ciro Gomes ainda não passou do governo estadual. Se bem que, sem tirar o olho de 2014, Lula é bem capaz , em último caso, de jogar tudo para cima e deixar o terceiro mandato correr os trâmites legais.
As relações entre um e outro, Lula e Ciro, estão sempre por um fio. Tanto se aproximam como se distanciam pelas conveniências. Como a História ainda mantém a dignidade de não se repetir em vão, a candidatura de Ciro Gomes a vice-presidente foi, temporariamente, deslocada para a posição de expectativa que faz dos vices em geral, mas principalmente a presidentes, candidatos a problemas cardíacos de fundo eleitoral.
Wilson Figueiredo
O presidente Lula não perde tempo. Depois de pedir bom tratamento para sua candidata à sucessão de 2010, com a mesma cautela política (equivalente ao caldo de galinha), o presidente pesquisa um nome para ser vice de Dilma Rousseff. A pressa se explica pela conveniência de evitar que aventureiros atravessem o caminho da eleição sobre a qual a única certeza é a garantida da data na Constituição. É por aí.
A democracia não precisa fazer dieta eleitoral para evitar dificuldades previsíveis. Partidos demais, moralidade de menos, promiscuidade de presidente e governadores em eleições de conveniência, a sombra de inflação e a estréia do reforço da classe média, além de problemas sociais misturados a questões policiais, estão à disposição. Lula convocou ao Planalto os pombos correios encarregados da ligação com o Congresso e, para dissipar o clima de gazeta parlamentar, reativou a messiânica reforma política, cuja função é fazer o papel do bode no salão. Não é preciso aprová-la, basta retirá-la.
A preocupação que Lula confirma é a de se antecipar aos problemas para não ser por eles atropelado. Cria oportunidade para alguma coisa que ainda não se percebe com clareza, mas que pode depender até da escolha do vice. O presidente passou fagueiramente ao segundo ponto do programa, que é a escolha do vice e o preenchimento do vazio político gerado pelo fim do terceiro mandato, o bode que rondava a democracia. Por enquanto, candidatura de Dilma Rousseff continua lance pessoal do presidente, inclusive na identificação de alguém para acompanhá-la em tão longa jornada.
A atenção presidencial não se fixou no deputado Ciro Gomes, que se pôs ao alcance de Lula desde muito antes, pelo pavio curto demais. Ciro contava certo com o convite para candidato a presidente, mas a precedência é de quem a tem. Continua de Lula; que recusou o terceiro mandato, e nada mais. Mantém o pedaço presidencial e a oportunidade de colher votos semeados em terreno social fértil, politicamente sem dono, nos dois governos.
Recusou o terceiro mandato pelo perigo de esquartejamento liberal. Retirou-se da hipótese. Preferiu a ministra Dilma e ficou atento à ressonância. Nenhuma estridência. Nenhuma divergência. Mas não faltaria o eco de Ciro Gomes, que esperava a deferência presidencial e, preterido pela surpresa, entrou no ciclo predatório que pode não eleger, mas lava a alma.
Com o jeito de quem nada quer mas tudo aceita (em proveito da pátria), o deputado Ciro Gomes reapareceu em nota de coluna com um recado para o destinatário decifrar em tempo de reparar a falha. Avisou, a quem interessar pudesse – a Lula, bem entendido, que a oposição já se delineia como a favorita para a sucessão presidencial de 2010. Por cima do Banco Central, o enfático Ciro Gomes dirigiu-se a Lula e se apresentou em condições de garantir que "o crescimento econômico de 2009 vai ser bem menor". O presidente não passa recibo, mas sabe que a alternativa de baixar os juros, em vez de elevá-los, poderia produzir no subsolo do regime abalos de grau menos previsível. E concluiu que talvez seja cedo para completar a chapa presidencial.
Aquele Ciro Gomes que, como coroinha de Lula, o acompanhou em ato de contrição pública no agradecimento a Deus por não ter sido eleito, e com isso evitou o pior para os brasileiros, volta a vestir-se de cangaceiro. Declaração favorável à oposição para 2010 tem grau de provocação.
Equivale a tirar o tapete vermelho estendido a Lula pela História.
A situação seria mais republicana se os dois, Lula e Ciro, tivessem atribuído aos eleitores o atestado público de sabedoria política por não elegê-los quando tinham apenas ordens menores recebidas das urnas. Lula já tem ordens superiores, mas Ciro Gomes ainda não passou do governo estadual. Se bem que, sem tirar o olho de 2014, Lula é bem capaz , em último caso, de jogar tudo para cima e deixar o terceiro mandato correr os trâmites legais.
As relações entre um e outro, Lula e Ciro, estão sempre por um fio. Tanto se aproximam como se distanciam pelas conveniências. Como a História ainda mantém a dignidade de não se repetir em vão, a candidatura de Ciro Gomes a vice-presidente foi, temporariamente, deslocada para a posição de expectativa que faz dos vices em geral, mas principalmente a presidentes, candidatos a problemas cardíacos de fundo eleitoral.
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