sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Cerveró delata propina a Jaques Wagner

André Guilherme Vieira – Valor Econômico

SÃO PAULO - O ex-diretor de Internacional da Petrobras Nestor Cerveró afirmou que o atual ministro-chefe da Casa Civil do governo Dilma Rousseff, Jaques Wagner (PT), teria recebido "um grande aporte de recursos" para sua campanha ao governo do Estado da Bahia, em 2006, com valores supostamente desviados da petrolífera. Cerveró disse que os recursos teriam sido "dirigidos" pelo então presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli.

As declarações de Cerveró a que o Valor teve acesso constam de um conjunto de documentos apreendidos pela Polícia Federal (PF) no gabinete do senador Delcídio Amaral (PT-MS) no dia 25 de novembro, que foram usados para compor a delação premiada de Cerveró firmada com a Procuradoria-Geral da República (PGR). Delcídio está preso preventivamente e é acusado de tentar interferir na delação premiada do ex-diretor de Internacional da petrolífera.

Cerveró esclareceu em um dos anexos que o suposto caixa dois para a campanha de Wagner teria origem em uma operação atribuída a Gabrielli, de realocação do setor financeiro da Petrobras, então localizado no Rio, para Salvador. Wagner foi eleito no segundo turno.

"Nessa época, o presidente Gabrielli decidiu realocar a parte operacional da parte financeira para Salvador, sem haver nenhuma justificativa, pois havia espaço para referida área no Rio de Janeiro", afirmou Cerveró.

O ex-diretor disse ainda que "grande quantidade de recursos" supostamente destinada à campanha eleitoral de Wagner em 2006 "veio de operações de trading que Gabrielli e [José Eduardo] Dutra controlavam". Morto em outubro de 2015, Dutra antecedeu Gabrielli na presidência da Petrobras, que ocupou de 2003 a 2005, durante o primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva.

Segundo Cerveró, "as informações sobre o dinheiro enviado para a campanha de Jaques Wagner em 2006 foram da ouvidora-geral [da Petrobras] Maria Augusta (falecida) e de Armando Tripodi (Bacalhau - Sindicato dos Petroleiros da Bahia) que foi chefe de gabinete de Gabrielli e do qual me tornei amigo". Maria Augusta Carneiro Ribeiro morreu em maio de 2009 em decorrência de um acidente de carro. Tripodi entrou na Petrobras em 1978 e em 1987 criou o Departamento Nacional dos Petroleiros da Central Única dos Trabalhadores (CUT), entidade sindical ligada ao PT.

O documento da delação de Cerveró apreendido no gabinete de Delcídio traz ainda um destaque intitulado "conhecimento do fato" com a afirmação de que o suposto desvio de recursos para financiar o que seria um caixa dois da campanha de Wagner "era de conhecimento notório de todos os diretores da Petrobras".

A obra do edifício da Petrobras em Salvador ficou a cargo do Petros - fundo de pensão da petrolífera alvo de investigação da Lava-Jato por suspeita de desvios. O Petros contratou a Odebrecht e a OAS para a construção. O prédio de 22 andares e 22 elevadores tem capacidade para receber 6,5 mil funcionários e conta também com 2,6 mil vagas de garagem. A Petrobras paga aluguel mensal ao Petros pelo uso da edificação. A estatal não informou o valor do empreendimento, concluído em julho de 2015. Estimativas de mercado apontam para cerca de R$ 600 milhões.

Segundo investigação da PF, João Carlos Ferraz, então gerente financeiro da Petrobras, foi designado por Gabrielli para realizar a transferência de pessoal da área financeira para a sede baiana. Ferraz é alvo da Lava-Jato por suspeita de receber US$ 1 milhão em propina em 2011, quando era presidente da Sete Brasil - empresa constituída fora do balanço da Petrobras com recursos de fundos de pensão (como o Petros) e de bancos como o BTG Pactual, o Bradesco e o Santander, para a construção de 28 navios-sonda para exploração da camada pré-sal.

Contatada pela reportagem por telefone e por e-mail, a assessoria de imprensa do ministro Jaques Wagner não se posicionou até o fechamento desta edição.

Em nota, Gabrielli diz repudiar "mais uma vez, o método utilizado para obtenção e o conteúdo das acusações levantadas através de vazamentos seletivos de delações premiadas".

"O trecho citado no vazamento da delação, de posse do jornal e sem que eu tenha tido acesso a ela, fala de pessoas já falecidas, como a ex-ouvidora geral da Petrobras e do meu ex-chefe de gabinete, que nega a informação veiculada", diz Gabrielli. "Nem há uma acusação explícita, até pelo próprio delator, segundo a parte do material a que o jornal se refere, sobre minha participação direta nos pretensos fatos delatados", disse o ex-presidente da Petrobras em nota.

No comunicado, Gabrielli afirma que "nunca soube de utilização de recursos ilegais dos fornecedores da Petrobras para a campanha do governador Jaques Wagner em 2006 ou em 2010". O ex-presidente nega que as operações de trading citadas por Cerveró seriam de competência da Petrobras. "Nunca foram e não são. Desta forma, a pretensa origem dos recursos é absolutamente falsa", afirma.

Gabrielli diz também que é "incoerente" a informação sobre "a realocação de parte das atividades financeiras e de tributos da Petrobras para Salvador". Ele diz que a operação reduziu custos da empresa e que o órgão responsável por essas atividades iniciou suas operações em julho de 2008. "Portanto dois anos depois das eleições de 2006", justifica.

Em outra frente da Lava-Jato, relatório da PF mostra que no celular de José Aldemário Pinheiro, empreiteiro da OAS condenado por corrupção na Petrobras, foram encontradas mais de 80 mil mensagens, envolvendo 11 pessoas com foro privilegiado, entre as quais Jaques Wagner, o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), e o marido dela, o ex-ministro Paulo Bernardo.

Segundo fonte com acesso às investigações, há ainda um trecho de mensagens trocadas pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), diretamente com Pinheiro e também com secretários dele - entre as quais há marcação de encontros em sua residência oficial, em Brasília. Há também mensagens com menções a "Brahma" - apelido usado pelo empreiteiro para se referir ao ex-presidente Lula - e relacionadas ao agendamento de viagens ao exterior. Os demais nomes ainda estão sob sigilo.

Wagner se disse "tranquilo" e à disposição para prestar esclarecimentos. A assessoria do Instituto Lula informou que não teve acesso ao relatório da PF e não vai se manifestar sobre vazamento "seletivo e ilegal de informações".

Edinho Silva, disse que, enquanto foi deputado estadual, manteve relações políticas com empresários "de forma transparente e dentro da legalidade". A defesa de Gleisi e Paulo Bernardo informou que "tanto Paulo Bernardo quanto Gleisi Hoffmann conhecem e têm boas relações com Leo Pinheiro. São relações profissionais e também pessoais. Gleisi não trocou mensagens com o empresário. Paulo Bernardo acredita que já tenha trocado mensagens com Léo Pinheiro". (Colaboraram Thiago Resende, Maíra Magro e Letícia Casado, de Brasília)

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