Graciliano Rocha – Folha de S. Paulo
SÃO PAULO - Mensagens apreendidas no celular do empreiteiro e ex-presidente da OAS Léo Pinheiro acenderam sinal de alerta na Operação Lava Jato sobre indícios de reprodução do esquema de corrupção das fornecedoras da Petrobras em fundos de pensão e no FGTS, com pagamento de propina ao PT e PMDB.
De acordo com a Procuradoria-Geral da República, as mensagens indicam que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o tesoureiro afastado do PT, João Vaccari Neto, cobraram "vantagens indevidas" por operações de capitalização das empresas do grupo OAS.
O foco das suspeitas são emissões de debêntures (títulos de dívida) que tiveram adesão de bancos estatais, fundos de pensão e o FI-FGTS (Fundo de Investimentos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço).
Empresas do grupo emitiram quase R$ 3 bilhões em títulos desde 2010.
"Pelo que se pode inferir das mensagens, há aquisição de debêntures emitidas pelas empresas, que são adquiridas ou por bancos –Caixa Econômica Federal, por meio do FI-FGTS, ou BNDES –ou por fundos de pensão onde há ingerência política", escreveu o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, nos autos da Operação Catilinárias, que é uma espécie de desdobramento da Lava Jato.
"Tudo mediante pagamento de vantagem indevida aos responsáveis por indicações políticas, inclusive doações oficiais", concluiu.
Pinheiro foi preso em 2014 e condenado a 16 anos de prisão por corrupção, lavagem de dinheiro e integrar organização criminosa. A OAS está em recuperação judicial.
Vaccari e amigo JW
Em abril de 2013, segundo a Procuradoria, Pinheiro informou a um dirigente da empresa que havia recebido uma ligação de Carlos Augusto Borges, então diretor do Funcef (fundo de pensão da Caixa), dizendo-se preocupado com um aporte para a empresa.
Segundo Borges, indicado pelo PT, o dinheiro do Funcef não saía por oposição dentro do próprio banco.
Pinheiro disse que no mesmo dia recebeu uma ligação de Vaccari para marcar encontro pessoal.
Na interpretação da PGR, o então tesoureiro do PT, "já mencionado em outros esquemas envolvendo desvios de fundos de pensão", queria receber "parte da propina" pela operação.
Na mesma mensagem que cita o impasse, o empreiteiro cita "o nosso amigo JW" –que seria o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner. Mas não há detalhamento se o ministro foi procurado.
A abertura de um novo front na Lava Jato da suposta corrupção na captação de recursos no mercado de capitais é alimentada também por citações de Pinheiro à Previ e ao Banco do Brasil.
Outras mensagens, de 2012, fazem menção a uma pessoa identificada como RF. Para a investigação, trata-se de Ricardo Flores, presidente da Previ (fundo de pensão do BB), também ligado ao PT.
Na época, Flores e Bendine travavam disputa em torno dos investimentos do fundo. A Previ era sócia da OAS na Invepar e o lançamento de ações da empresa estava sendo tratado com o BB.
Cunha
No caso de Cunha, a Procuradoria diz ter indício de que ele teria cobrado a OAS por intermediar uma operação de venda de R$ 250 milhões em debêntures para o Fundo de Investimento do FGTS.
Em diálogo no dia 9 de dezembro de 2012, Pinheiro informou a Cunha, por meio do aplicativo Whatsapp, que a OAS ainda não havia recebido R$ 250 milhões da venda de debêntures da Caixa e que o dinheiro só estaria liberado em fevereiro de 2013.
Um aliado de Cunha, Fábio Cleto, era o responsável no banco por realizar esse tipo de operação.
Em 15 de março de 2013, Pinheiro envia mensagem para Alexandre Tourinho, diretor financeiro da OAS, questionando se os R$ 250 milhões já haviam sido liberados. "Oi Alexandre, nós já recebemos aquela debenture ($250MM)? O nosso EC tá me cobrando. Abs. Leo". Para a Procuradoria, EC é Eduardo Cunha.
Outro lado
O advogado Edward Carvalho, que defende Léo Pinheiro, disse que não comentaria as mensagens citadas pela Procuradoria-Geral da República. A OAS diz não ter tido acesso ao material e só se manifestará no processo.
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, negou as acusações: "Não recebi qualquer vantagem indevida e desafio a apresentarem provas disso. Sou vítima de perseguição política, e as ilações da Procuradoria serão respondidas no fórum e no momento apropriados".
O advogado de João Vaccari Neto, Luiz Flávio D'Urso, não foi localizado.
Por meio de assessoria de imprensa, a Caixa Econômica Federal e o vice-presidente de ativos do banco, Marcos Roberto Vasconcelos, rejeitaram as alegações de suspeitas de pagamento de propina por intermediação de recursos do fundo do FGTS.
"Todos os investimentos realizados pelo FI-FGTS foram e estão integralmente regulares, sendo que seu processo de estruturação e aprovação observou rigorosamente todos os preceitos normativos e de conformidade do banco e do fundo", diz a nota do banco.
Procurada, a Invepar informou que não houve qualquer irregularidade e que o lançamento de ações da empresa não ocorreu por questões mercadológicas.
A Folha não localizou Ricardo Flores, ex-presidente da Previ, Carlos Augusto Borges, do Funcef, e Fábio Cleto, ex-vice presidente da Caixa.
O negócio das debêntures
Esquema de corrupção da Petrobras se repetiu na compra de títulos da OAS
O que é uma debênture?
Título de renda fixa emitido por uma empresa para captar recursos
O esquema
Segundo a Procuradoria, OAS emitia debêntures no mercado financeiro, compradas por bancos estatais e fundos, mediante propina a políticos. Esquema foi revelado em mensagens apreendidas do celular de? Léo Pinheiro, da OAS
Os negociadores
FI-FGTS
Eduardo Cunha, presidente da Câmara
FI-FGTS comprou R$ 250 milhões em debêntures da OAS. Cunha mantinha um aliado, Fábio Cleto, no conselho do fundo de investimento
Exemplo de mensagem:
15.mar.13
De Léo Pinheiro ao diretor financeiro da OAS, Alexandre Tourinho
"Oi Alexandre, nós já recebemos aquela debe- nture ($250MM)? O nosso EC [Eduardo Cunha] está me cobrando. Abs. Leo"
FUNCEF
João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT
Compra foi concretizada e há menção de propina ao PT
Exemplo de mensagem:
16.mai.2013
De Léo Pinheiro para diretor da OAS
"Acabei de receber uma ligação de JV [João Vaccari Neto], querendo um encontro pessoalmente. Pode ser impute de CB [Carlos Borges, diretor do Funcef]. Como nosso amigo JW [Jaques Wagner] está próximo posso pedir para ele falar com H [não identificado]"
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