Por Carolina Oms e Maíra Magro – Valor Econômico
BRASÍLIA - Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) passaram o dia de ontem buscando uma solução para a crise entre o Legislativo e o Executivo criada pela decisão do ministro Marco Aurélio Mello de afastar o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência do Senado e pela recusa da Mesa daquela Casa de cumpri-la. O plenário do STF vai decidir na tarde de hoje se confirma ou não a liminar que afastou o senador, liberada ontem para julgamento por Marco Aurélio.
A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, esteve em conversas telefônicas ou presenciais com ministros do Supremo e senadores. A interlocutores, a ministra afirmou que o Supremo deve atuar para pacificar a crise e lembrou que o Brasil já passa por crise política e econômica.
Uma das alternativas que podem ser propostas hoje é evitar que Renan assuma a Presidência da República, mas mantê-lo na presidência no Senado. Os ministros que defendem a alternativa afirmam que o caso de Renan é diferente da situação que levou ao afastamento do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara. Cunha teria atuado para intimidar parlamentares e usado o cargo para obstruir as investigações - acusações que não pesam contra Renan. Além disso, ao afastar Cunha, os ministros deixaram claro que a medida deveria ser excepcional.
Por esta linha de raciocínio, Renan se réu no próprio STF por acusações sobre fatos cometidos antes de ele ocupar o cargo atual de presidente do Senado e para o caso dele se aplicaria dois dispositivos do artigo 86 da Constituição, tema que ainda não foi discutido pelo Supremo nos votos que já proferidos que deram maioria até aqui a favor da tese de que réus em ações penais não podem permanecer na linha de sucessão da Presidência da República. A ação foi suspensa no mês passado em razão de pedido de vistas de Dias Toffoli, quanto já contava com maioria na corte para ser aprovada.
O parágrafo 1º do artigo constitucional diz que o presidente da República será afastado de suas funções se o STF receber denúncia contra ele por crime comum. O Supremo está estendendo a hipótese do presidente da República para as demais autoridades na linha sucessória, caso dos presidentes da Câmara e do Senado.
Até aqui, os votos que foram dados no caso em que o ministro Dias Toffoli pediu vista possuem lógica jurídica, fazem sentido e poderiam ser aplicados no caso de Renan. Mas o parágrafo 4º deste artigo determina que o presidente não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções, ou seja, cometidos fora do atual mandato.
O crime do Renan no caso em que ele virou réu - a pensão da amante paga por empresa privada - teria sido cometido há nove anos. Por isso, a maioria do STF pode concluir que Renan é réu, mas por crime não cometido no atual mandato e, assim, poderia permanecer no comando do Senado.
A rigor, o parágrafo 4º acaba por diferenciar os casos de Renan e do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha. No caso de Cunha, o STF aceitou a alegação de que ele estava usando o cargo de presidente da Câmara para atrapalhar as investigações em curso.
No caso atual, não haveria provas de que Renan usa o cargo de presidente do Senado para impedir investigações contra ele.
Assessores do STF observam que essa discussão ainda não ocorreu nos autos do caso em que Toffoli pediu vista. Mas é uma brecha, de acordo com eles, que permite que o tribunal mantenha um réu na Presidência do Senado. O mais provável é que o próprio Toffoli proponha a solução de tirar Renan da linha sucessória, mas mantê-lo no comando do Senado.
As articulações para que o Supremo pautasse a liminar duraram boa parte do dia. Inicialmente, Marco Aurélio havia indicado que não seria possível liberar o processo para pauta ainda neste ano, porque pediu a manifestação do partido Rede Sustentabilidade, autor da ação que pediu o afastamento. A liminar foi requerida pelo Rede depois de o STF aceitar, na semana passada, denúncia contra Renan e transformá-lo em réu em ação penal por peculato.
O senador Jorge Viana (PT-AC), vice-presidente do Senado, esteve no Supremo para pedir celeridade para o julgamento em plenário. Aproveitando sua presença, Cármen Lúcia chamou outros ministros que estavam no STF para conversar - recebendo os ministros Teori Zavascki, Dias Toffoli, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso. Cármen também falou por telefone com o ministro Gilmar Mendes e com o senador Aécio Neves (MG), presidente do PSDB.
Gilmar e Barroso, no entanto, não devem participar do julgamento de hoje. Gilmar está em viagem ao exterior e Barroso se declarou impedido - o antigo escritório do ministro é autor da ação do Rede. "Tudo que for urgente para o Brasil, eu pauto com urgência", disse a ministra Cármen Lúcia pela manhã, em café com jornalistas.
Ao Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, Gilmar disse que se um juiz opera fora da lei ele perde a legitimidade, ao comentar a liminar concedida pelo colega. "A nossa credibilidade está rastreada na legalidade, de decidirmos observando a legalidade", declarou Mendes.
O Senado recorreu ao STF contra o afastamento do senador. "É notório o esforço que o Poder Executivo solicitou à sua base para a votação de matérias de enorme relevo institucional, como, por exemplo, a PEC do teto dos gastos (PEC 55, de 2016). Nesse sentido, a medida impugnada causa enormes prejuízos ao já combalido equilíbrio institucional e político da República", diz o pedido do advogado-geral do Senado Federal, Alberto Cascais. A gestão de Renan se encerra no fim de janeiro de 2017.
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