• Mesa do Senado desafia Supremo
Liminar de Marco Aurélio que determinou afastamento do senador será submetida hoje ao plenário do tribunal
Numa decisão sem precedentes, a Mesa Diretora do Senado, em ação orquestrada pelo presidente Renan Calheiros, desobedeceu à liminar do ministro do STF Marco Aurélio Mello e manteve o senador alagoano no comando da Casa. A direção do Senado argumentou que a liminar fere a independência dos poderes e terá impacto na votação de medidas para conter a crise. Houve fortes reações nos meios políticos e jurídicos. A presidente do STF, Cármen Lúcia, marcou para hoje o julgamento do afastamento de Renan. Em meio à crise inédita, o Planalto tenta votar ainda este ano a emenda que limita gastos públicos, mesmo se o comando do Senado passar às mãos do PT.
Desobediência inédita
• Senado ignora liminar para afastar Renan, e STF marca sessão às pressas para resolver conflito
Cristiane Jungblut - O Globo
-BRASÍLIA- O presidente do Senado, Renan Calheiros, abriu ontem uma crise institucional com o Supremo Tribunal Federal, ao decidir, com aval da Mesa Diretora que preside, descumprir a decisão tomada na véspera pelo ministro Marco Aurélio Mello afastando-o do comando do Congresso. Diante do impasse, a presidente da Corte, Cármen Lúcia, marcou para hoje a análise da decisão de Marco Aurélio pelo plenário do STF. O Palácio do Planalto, por sua vez, passou o dia tentando demonstrar apoio a Renan, que, mesmo enfraquecido, é a principal liderança política do Senado. No entanto, alguns dos principais interlocutores políticos do governo já costuraram um plano para garantir que até o fim do ano seja aprovada a PEC que limita o crescimento dos gastos públicos, pauta mais importante do governo, mesmo que o Supremo afaste definitivamente o peemedebista, entregando o comando da Casa ao PT.
A estratégia é calçada na ampla maioria que o governo detém hoje. Já está no norte dos líderes da base aliada a apresentação de um requerimento para inclusão da PEC na pauta, caso Jorge Viana (PT-AC) seja alçado ao posto de presidente de forma definitiva e se negue a cumprir o acordo de votação da PEC na próxima terça-feira. Esse tipo de requerimento é de votação obrigatória e, caso receba o apoio da maioria dos senadores, obriga que o projeto entre na pauta.
Além disso, para garantir que as etapas burocráticas sejam cumpridas, os senadores da base devem se mobilizar para garantir nos próximos dias o quórum mínimo no plenário para que ocorram três sessões. Se Viana não quiser abrir as sessões, a base governista deve solicitar que o segundo vice-presidente, Romero Jucá (PMDB-RR), que é líder do governo, dê início a elas.
A manobra política de enfrentamento ao Supremo, que aprofundou a crise política, foi orquestrada pelo próprio Renan, em reunião com os senadores da Mesa Diretora. O vice-presidente do Senado, Jorge Viana (PT-AC), participou da solução, assinando o ato da Mesa e indo ao STF conversar com Marco Aurélio, autor da decisão contra Renan. Após se negar na véspera a assinar a notificação do processo, Renan deu ontem novo chá de cadeira no oficial de Justiça que foi ao Senado notificá-lo da decisão e depois voltou a se recusar a assinar o documento.
O ato da Mesa que decidiu “aguardar a deliberação do Pleno do STF” foi divulgado enquanto o oficial de Justiça deixava o gabinete da presidência. Em seguida, Renan falou:
— Tomar uma decisão de afastar um presidente do Senado, o chefe de um Poder, por uma decisão monocrática, a democracia, mesmo no Brasil, não merece esse fim — disse Renan, alegando que o Senado se posicionou pela “separação e independência dos Poderes”.
Renan ainda atacou Marco Aurélio, procurando desqualificar o ministro:
— Como presidente do Senado me obriguei a cumprir liminares piores do ministro Marco Aurélio. Uma delas, a qual fiz questão de cumprir, foi a decisão que impedia que acabássemos com os supersalários no Legislativo. Em outras palavras, toda vez em que ele ouve falar em supersalário, ele parece tremer na alma.
A reunião entre os senadores da Mesa foi feita em uma sala especial — chamada de antigrampo —, e Renan convenceu os colegas de que era preciso resistir e não cumprir a decisão monocrática de Marco Aurélio. A saída fora debatida pela manhã, na residência oficial, em encontro de Renan com o ex-presidente José Sarney, Viana e a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO).
Jorge Viana ficou pressionado entre a lealdade a Renan e as reclamações do PT. Ele só assinou o documento depois de uma mudança no texto. A proposta original era mais acintosa ao STF, afirmando que o Senado iria aguardar a deliberação da Corte “anteriormente à tomada de qualquer providência relativa ao cumprimento de decisão monocrática em referência”.
Sem clima, as votações foram suspensas por Viana, e Renan cancelou jantar de confraternização de Natal.
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