sexta-feira, 18 de maio de 2018

O BC escolheu a segurança: Editorial | O Estado de S. Paulo

A festa acabou, o dólar disparou, o cenário externo ficou perigoso e prevaleceu a prudência na reunião do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC). Depois de uma série de 12 cortes iniciada em outubro de 2016, o comitê resolveu manter a Selic, a taxa básica, em 6,50%. Fontes do mercado e analistas profissionais ainda falavam, na manhã de quarta-feira, numa redução para 6,25%. Essa havia sido a mediana das projeções captadas na última pesquisa Focus, fechada na sexta-feira e divulgada na segunda-feira pelo BC. Havia espaço para esse movimento, argumentavam, porque a inflação continua bem abaixo da meta e o crescimento econômico está mais lento que no fim do ano passado. Mesmo fazendo algum sentido, essa conversa parecia estranha, inegavelmente, no meio da turbulência cambial e da insegurança mostrada por empresários, investidores e consumidores diante do quadro eleitoral e da paralisação da pauta de reformas.

A possibilidade de um novo corte havia sido indicada várias vezes por diretores do BC, desde a reunião anterior do Copom, em março. Numa entrevista recente, o presidente da instituição, Ilan Goldfajn, pareceu confirmar essa quase promessa de redução da taxa para 6,25%. Mas apenas pareceu. A decisão, disse ele em resposta a um entrevistador, dependeria das perspectivas da inflação. Como as projeções ainda apontam inflação abaixo de 4% neste ano, a nova redução da Selic foi dada como certa por muitos especialistas.

Mas as perspectivas de inflação dependem de vários fatores e um deles é o preço do dólar. Analistas parecem haver menosprezado esse detalhe. Se houve alguma surpresa, seria fácil desfazê-la com a leitura da nota emitida no começo da noite de quarta-feira, logo depois da reunião do Copom. A nota menciona o arrefecimento da atividade econômica e o comportamento ainda favorável da inflação, com projeções em torno de 3,5% para este ano e de 4% para 2019 e 2020. Mas o quadro muda quando se refazem as contas com juros constantes de 6,50% e dólar a R$ 3,60.

Nesse caso, as projeções ficam em torno de 4% em 2018 e 2019. A taxa de R$ 3,60 por dólar corresponde à média das cotações observadas nos cinco dias úteis encerrados na sexta-feira anterior à reunião, observa a nota. De acordo com o comunicado, o Copom decidiu, sim, levando em conta principalmente as perspectivas da inflação, como havia indicado, na entrevista recente, o presidente Ilan Goldfajn.

Não se tratou, portanto, segundo a nota, de uma reação direta à instabilidade cambial e a seus efeitos sobre as contas externas, mas de uma decisão centrada na questão da alta de preços. A redução dos juros vinha sendo orientada por dois objetivos básicos: facilitar o crescimento econômico, depois de dois anos de recessão, e abrir caminho para a inflação se aproximar da meta. O centro do alvo é 4,5%, neste ano, com tolerância de 1,5 ponto para cima ou para baixo. O centro será reduzido para 4,25% no próximo ano e para 4% em 2020. A tolerância será mantida.

Com a mudança do cenário e “principalmente do balanço de riscos”, incluída a pressão cambial, a inflação deve convergir mais prontamente para a meta. Ou, na linguagem do Copom, essa mudança “tornou desnecessária uma flexibilização monetária adicional”. O cálculo incluído no comunicado aponta para uma alta de preços de 4% já neste ano – dentro, portanto, da tolerância permitida pela política oficial. Levar a inflação à meta, ou à sua vizinhança, é uma das obrigações do BC, mesmo quando isso implica intensificar a alta de preços. Quanto ao crescimento: mantida a Selic em 6,50%, comentam os autores da nota, a política monetária continua “estimulativa”.

Manter a taxa em 6,50% é mais que uma decisão técnica baseada em cálculos. É também, e talvez principalmente, um sinal para o mercado. O Copom, diz o recado implícito, está pronto para agir. É cedo para dizer se bastará esse lance. Mas a mensagem é clara e indica uma nova fase do jogo. O BC faz sua parte. Se os políticos fizessem a deles, favorecendo ajustes e reformas, seria mais fácil estimular a confiança, reduzir a percepção de riscos e promover o crescimento.

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