terça-feira, 27 de janeiro de 2009

De lei forte e carne fraca

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Autor do anteprojeto do Código de Ética interno que o PT começa a discutir, o secretário-geral do partido e deputado federal José Eduardo Martins Cardozo integrou a CPI dos Correios e transitou na contramão da decisão majoritária de deixar quase por isso mesmo as malfeitorias da direção do partido com o lobista Marcos Valério.

Sempre pregou uma posição mais rigorosa e defendeu a ideia de que o PT jamais sairia totalmente ileso dos escândalos de 2005 se não fizesse uma autocrítica de procedimentos e não aplicasse punições de fato.

Persona non grata no Palácio do Planalto e na seção petista de seu próprio Estado (SP), comandada pelo grupo de Marta Suplicy, Cardozo foi voto vencido na época e hoje, levado pelas circunstâncias (uma candidatura à presidência do PT com votação e apoios expressivos) à cúpula da Executiva, está a cavaleiro para propor a regulação de condutas.

No papel, está tudo lá, previsto e até redundante em relação às leis em vigor e às regras da convivência civilizada: veto ao uso do caixa 2; proibição de "exploração de detalhes da vida íntima de adversários" em disputas eleitorais; obrigatoriedade de quebra voluntária do sigilo de dados pessoais; quarentena para quem ocupar cargo público de confiança; proibição de acúmulo de cargo público com função na estrutura partidária.

Pelo código, o PT fica obrigado a divulgar mensalmente na internet doações de pessoas jurídicas, não pode patrocinar "filiações em massa" e está proibido de participar ou promover "manobras parlamentares ou escusas".

Tudo, segundo a proposta, para assegurar uma boa imagem pública ao partido.

Ótimo, já não era sem tempo, antes tarde do que nunca, estava mesmo na hora de o partido da ética abandonar a lassidão de comportamento que presidiu suas ações desde a ascensão ao poder, em contradição com a trajetória de uma vida partidária dedicada, na oposição, à cobrança da elevação dos padrões no exercício da política.

É um avanço o debate do tema. O PT, entretanto, só fará diferente das legendas que ignoram o tema - todas elas - se, além de debater e escrever o código, se dispuser fazer da teoria uma prática corriqueira, abandonando a lógica da "transparência assim é burrice" em voga nos tempos em que Delúbio Soares era tesoureiro.

Não fala em favor do partido o fato de as normas - apesar de propostas anteriormente - começarem a ser cogitadas na última metade do governo Lula, quando poderiam ter sido implantadas ao longo do segundo mandato, a tempo de o PT mostrar apreço à ética estando no poder ou fora dele.

Este, ademais, é o eterno problema dos códigos, regulamentações e leis em geral. Só são fortes se as pessoas estiverem dispostas a obedecê-las. Se não, tendem a ter o mesmo destino do Código de Ética Pública, por exemplo, ignorado explícita e oficialmente.

O que está em elaboração pelo PT virará letra morta se, uma vez aprovado, a direção do partido, encarregada de aplicá-lo, mais uma vez optar pela proteção de uns poucos em detrimento da regra geral. É uma chance de restauração e retomada da boa imagem perdida. Caberá ao partido aproveitá-la ou não.

Mão e contramão

O Palácio do Planalto já deve ter percebido que contratou uma enrascada no caso Cesare Battisti. Inclusive porque se o Brasil não leva em conta as razões da Itália não poderá esperar que tenha as suas respeitadas numa eventualidade futura.Além do horizonte

Auxiliar muito próximo do governador José Serra com gabinete no Palácio dos Bandeirantes diz que não sabe qual é a posição do chefe sobre a eleição para a presidência do Senado.

Apenas põe as coisas nos seguintes termos, considerando a hipótese de Serra ser mesmo o candidato do PSDB e ganhar a eleição, que é como ele raciocina: "Sarney eleito agora provavelmente seria reeleito em 2010, bem como Michel Temer na Câmara. Será que Serra acha bom ou ruim ter o PMDB - Sarney em particular - no domínio total do Congresso na campanha e durante os primeiros dois anos de governo?"

A resposta certa é, no entender do serrista em questão, "ruim".

Mas, pensando na mesma situação em relação a Tião Viana, do PT, a alternativa poderia ser péssima. A menos que no Palácio dos Bandeirantes se considere um PT na oposição potencialmente menos danoso que um PMDB na pressão.

Por tabela

Na viagem na semana passada à Colômbia, o governador Serra esteve uma hora e meia com o presidente Alvaro Uribe, que busca um terceiro mandato.

Uribe não tocou no assunto, mas o governador de São Paulo registrou sua posição junto a amigos do presidente: melhor sair bem depois de dois mandatos. Redobrar a aposta é mais que um risco, é fracasso certo.

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