Alberto Dines
DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)
O conceito de Smart Power irrompeu no repertório internacional de soluções mágicas e quem a tirou da cartola foi a secretária de Estado nomeada, Hillary Clinton, terça passada, quando foi sabatinada pelos antigos pares do Senado americano. Começou bem. Hillary, 61 anos, recém-saída da refrega eleitoral com Barack Obama sem recorrer ao bisturi dos cirurgiões plásticos, recorreu quatro vezes à fórmula idealizada pelo cientista político especializado em questões internacionais, Joseph Nye.
Professor em Harvard, Nye apareceu há poucos anos no mercado de idéias com um produto chamado Soft Power (Poder Brando), agora aperfeiçoado para Smart Power, Poder Inteligente. Consiste na habilidade em conseguir o que se pretende através da atração em vez de coerção. Resposta liberal à histeria totalitária neo-con, orquestrada nos últimos oito anos pelo triunvirato Bush-Cheney-Rumsfeld.
É também o núcleo de uma estratégia política que consiste em separar e individuar os adversários em diferentes graus de periculosidade. Não confundir os realmente perigosos, geralmente minoritários – e para os quais está reservado o Hard Power (Poder Rigoroso) – com as grandes maiorias mais facilmente induzidas ao consenso e convivência. Tem tudo para dar certo, mesmo porque o secretário de Defesa reconduzido por Obama, Richard Gates, manifestou-se claramente a favor da aplicação do Smart Power no Iraque.
O poder inteligente só pode ser instrumentado por aqueles que dispõem de um mínimo de inteligência, mesmo que sejam apenas espertos. Smart é um qualificativo abrangente, pode significar sagacidade, malícia e até mesmo elegância (na acepção mais ampla). Vocábulo holístico, atributo dos seres esclarecidos, racionais, capazes de pensar. Pensar é existir, René Descartes continua insubstituível. Não há alternativa ao uso do pensamento.
A atual liderança israelense está longe de perceber as nuances e gradações entre os diferentes tipos de poder – do persuasório ao dissuasório e ao aniquilador. A questão não é a desproporcionalidade da reação de Israel aos contínuos ataques perpetrados pelos terroristas do Hamas. Todas as guerras são desproporcionais. O fator capaz de mitigar estragos é a capacidade de bater o adversário e oferecer-lhe logo uma saída.
Ficou evidente a incapacidade da trinca Olmert-Livni-Barak para discernir as diferentes forças que confrontam Israel. A vitória militar terá um custo moral altíssimo. Generais geralmente não têm tempo ou paciência para sutilezas. Quando aceitou o comando do governo francês no fim da Primeira Guerra Mundial, o jornalista e político francês, Georges Clemenceau, declarou que as guerras são sérias demais para serem entregues apenas aos generais. O homem que produziu a manchete mais célebre da história do jornalismo (J"Accuse com a carta de Zola em defesa de Dreyfus) é, de certa forma, o inspirador do Smart Power.
Dias antes do início dos bombardeios de Gaza, quando os malucos do Hamas resolveram aumentar o nível de provocação, o premier Olmert apareceu no noticiário televisivo internacional exibindo retoricamente a força militar de Israel. Em seguida despachou a chanceler Livni ao Egito. Em seguida, deu luz verde aos bombardeios. Deveria saber que o Hamas assim como o Hizbullah no Líbano, sempre escondeu seus disparadores de foguetes em meio a densas concentrações humanas.
Agora Israel foi obrigado a fechar por horas as divisas com a Cisjordânia, área teoricamente "normalizada" onde as partes tentam comprovar a viabilidade do projeto "dois povos, dois Estados".
O ministro Celso Amorim tem sido bombardeado nos últimos dias por ter embarcado numa iniciativa diplomática através do circuito Jerusalém-Ramallah-Damasco. Injusto: sua iniciativa é incomparavelmente mais smart do que a insensata declaração do assessor da Presidência, Marco Aurélio Garcia, condenando liminarmente o Estado de Israel.
Quando o chanceler declara à colega Tzipi Livni que "não há futuro para Israel se o país transformar-se num bunker" está abrindo portas. Está sendo mais sionista e mais pacifista. O estado de sítio é ruim tanto para o sitiador como para o sitiado. O poder inteligente é a decorrência natural da inteligência instalada no poder.
» Alberto Dines é jornalista
DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)
O conceito de Smart Power irrompeu no repertório internacional de soluções mágicas e quem a tirou da cartola foi a secretária de Estado nomeada, Hillary Clinton, terça passada, quando foi sabatinada pelos antigos pares do Senado americano. Começou bem. Hillary, 61 anos, recém-saída da refrega eleitoral com Barack Obama sem recorrer ao bisturi dos cirurgiões plásticos, recorreu quatro vezes à fórmula idealizada pelo cientista político especializado em questões internacionais, Joseph Nye.
Professor em Harvard, Nye apareceu há poucos anos no mercado de idéias com um produto chamado Soft Power (Poder Brando), agora aperfeiçoado para Smart Power, Poder Inteligente. Consiste na habilidade em conseguir o que se pretende através da atração em vez de coerção. Resposta liberal à histeria totalitária neo-con, orquestrada nos últimos oito anos pelo triunvirato Bush-Cheney-Rumsfeld.
É também o núcleo de uma estratégia política que consiste em separar e individuar os adversários em diferentes graus de periculosidade. Não confundir os realmente perigosos, geralmente minoritários – e para os quais está reservado o Hard Power (Poder Rigoroso) – com as grandes maiorias mais facilmente induzidas ao consenso e convivência. Tem tudo para dar certo, mesmo porque o secretário de Defesa reconduzido por Obama, Richard Gates, manifestou-se claramente a favor da aplicação do Smart Power no Iraque.
O poder inteligente só pode ser instrumentado por aqueles que dispõem de um mínimo de inteligência, mesmo que sejam apenas espertos. Smart é um qualificativo abrangente, pode significar sagacidade, malícia e até mesmo elegância (na acepção mais ampla). Vocábulo holístico, atributo dos seres esclarecidos, racionais, capazes de pensar. Pensar é existir, René Descartes continua insubstituível. Não há alternativa ao uso do pensamento.
A atual liderança israelense está longe de perceber as nuances e gradações entre os diferentes tipos de poder – do persuasório ao dissuasório e ao aniquilador. A questão não é a desproporcionalidade da reação de Israel aos contínuos ataques perpetrados pelos terroristas do Hamas. Todas as guerras são desproporcionais. O fator capaz de mitigar estragos é a capacidade de bater o adversário e oferecer-lhe logo uma saída.
Ficou evidente a incapacidade da trinca Olmert-Livni-Barak para discernir as diferentes forças que confrontam Israel. A vitória militar terá um custo moral altíssimo. Generais geralmente não têm tempo ou paciência para sutilezas. Quando aceitou o comando do governo francês no fim da Primeira Guerra Mundial, o jornalista e político francês, Georges Clemenceau, declarou que as guerras são sérias demais para serem entregues apenas aos generais. O homem que produziu a manchete mais célebre da história do jornalismo (J"Accuse com a carta de Zola em defesa de Dreyfus) é, de certa forma, o inspirador do Smart Power.
Dias antes do início dos bombardeios de Gaza, quando os malucos do Hamas resolveram aumentar o nível de provocação, o premier Olmert apareceu no noticiário televisivo internacional exibindo retoricamente a força militar de Israel. Em seguida despachou a chanceler Livni ao Egito. Em seguida, deu luz verde aos bombardeios. Deveria saber que o Hamas assim como o Hizbullah no Líbano, sempre escondeu seus disparadores de foguetes em meio a densas concentrações humanas.
Agora Israel foi obrigado a fechar por horas as divisas com a Cisjordânia, área teoricamente "normalizada" onde as partes tentam comprovar a viabilidade do projeto "dois povos, dois Estados".
O ministro Celso Amorim tem sido bombardeado nos últimos dias por ter embarcado numa iniciativa diplomática através do circuito Jerusalém-Ramallah-Damasco. Injusto: sua iniciativa é incomparavelmente mais smart do que a insensata declaração do assessor da Presidência, Marco Aurélio Garcia, condenando liminarmente o Estado de Israel.
Quando o chanceler declara à colega Tzipi Livni que "não há futuro para Israel se o país transformar-se num bunker" está abrindo portas. Está sendo mais sionista e mais pacifista. O estado de sítio é ruim tanto para o sitiador como para o sitiado. O poder inteligente é a decorrência natural da inteligência instalada no poder.
» Alberto Dines é jornalista
Nenhum comentário:
Postar um comentário