Panorama Econômico :: Miriam Leitão
DEU EM O GLOBO
Quem merece subsídio para comprar a casa própria é mesmo quem ganha até três salários mínimos. Ninguém nessa faixa de renda conseguiria comprar uma habitação decente sem a ajuda de recursos que saem dos impostos de todos nós. A melhor forma de fazer isso é através de recursos orçamentários explicitados de forma transparente, e num pacote que não seja parte de propaganda política.
O governo anunciou ontem que vai investir R$34 bilhões num programa habitacional. Os números são de R$25,5 bilhões da União, R$7,5 bi do FGTS e R$1 bi do BNDES. Os R$34 bi, na verdade, estão inflados porque embutem dinheiro que será liberado nos próximos anos para cobrir o subsídio concedido agora ao comprador. O prazo de construção das casas seria inicialmente de dois anos, e agora não está mais definido, mas o de realização do gasto em si vai se estender por muitos anos, muito além do atual mandato e do próximo. Se tivesse que dispor de R$25 bilhões agora, o governo não teria esses recursos, porque ele está em temporada de cortar o orçamento para que ele caiba no que vai realmente acontecer com a arrecadação. E ainda trabalha com projeções de crescimento fora da realidade, como a divulgada ontem pelo cada vez mais desacreditado Ipea, de 2%.
Isso, aliás, foi o que disse o ministro Guido Mantega ontem, de que o pacote seria responsável pelo crescimento do PIB em 2 pontos percentuais. Só que, para chegar lá, o setor de construção teria de crescer cerca de 40%, já que ele tem um peso médio no PIB de 5%, segundo o IBGE. Ou seja, o crescimento é inverossímil.
O chefe do governo reclamou da morosidade e da burocracia do próprio governo que lidera, como se não fosse ele o responsável pela máquina e pela incapacidade gerencial e administrativa que faz com que todos os planos pareçam muito bonitos no papel, mas não se realizem. É uma das técnicas do presidente Lula para ficar só com o bônus de ser governo, e não com o ônus. O PAC, por exemplo, jamais conseguiu gastar tudo o que tem para investir em cada orçamento, e isso porque projetos são mais difíceis de serem executados do que o aumento do gasto corrente, como já vimos.
O programa habitacional demorou meses sendo desenhado e tem várias boas ideias, como a de garantir ao comprador de baixa renda que só pague quando estiver morando, para não ter que somar o custo da prestação ao do aluguel. Outro é o subsídio à taxa de juros que varia de acordo com a renda, maior quanto menor for a capacidade de pagamento do comprador.
Um bom programa de moradia popular era necessário, mas isso, sozinho, não é um plano de combate à crise. Enfrenta um dos lados do enorme déficit de moradias do Brasil. A crise econômica também é grave demais para que as soluções do governo fiquem prisioneiras de objetivos políticos de 2010.
Todo governo lança planos habitacionais, anuncia que a Caixa destinará bilhões para construção da casa própria, e usa o dinheiro do FGTS para isso. O atual já fez isso algumas vezes. Nada garante que esse seja o plano que acabará com todos os planos, mas há grande risco de que esse incorra em alguns erros perigosos.
O FGTS vai ser cada vez mais requerido nos próximos meses pelos saques dos trabalhadores que perderão o emprego. É uma poupança compulsória e mal remunerada (3% ao ano), que tem sido usada como funding para programas que querem pagar um custo pequeno. Mas o fundo tem compromissos com os trabalhadores que estão hoje com emprego e amanhã podem não estar, e que sacarão recursos do FGTS. As últimas notícias dão conta de que tem aumentado o saque, mas isso se agravará nos próximos meses. A melhor forma de o governo usar os recursos públicos para favorecer qualquer setor é explicitar esse custo no orçamento. Mas isso raramente é feito.
O economista Alexandre Marinis acha que o plano é correto no sentido de o governo alocar recursos para quem precisa, e não ficar socorrendo grande empresa, como fez na injeção de R$100 bilhões no BNDES. Mas ele alerta que o governo vem usando demais os recursos do FAT e do FGTS para fazer a política econômica.
- Se o governo não tivesse errado, contratado tanto e aumentado as despesas de pessoal, teria mais R$70 bilhões para investir. O pacote de habitação, por exemplo, poderia ser três vezes maior.
Uma qualidade do programa é ser, como explicou o presidente da Ademi-RJ, Rogério Chor, um programa que tem incentivos à demanda. Normalmente, os planos habitacionais subsidiam a construtora e incentivam a oferta, quando o correto é financiar o comprador final de baixa renda para que ele, com a garantia de uma prestação mais baixa, se disponha a comprar.
Mesmo assim, há detalhes que precisam ser analisados. O presidente do Sinduscon-SP, Sérgio Watanabe, disse que o pacote tem qualidades e deve ajudar o setor, mas citou que nenhum detalhe sobre como os estados e municípios vão apresentar os projetos de habitação foi citado.
- O governo deve regulamentar os princípios básicos, a Caixa vai normatizar. Só que a articulação entre estados e municípios será o grande trabalho para fazer os projetos de infraestrutura. As entidades de classe devem cobrar os projetos. Se isso não acelerar, vai atrasar o início e o andamento das obras.
DEU EM O GLOBO
Quem merece subsídio para comprar a casa própria é mesmo quem ganha até três salários mínimos. Ninguém nessa faixa de renda conseguiria comprar uma habitação decente sem a ajuda de recursos que saem dos impostos de todos nós. A melhor forma de fazer isso é através de recursos orçamentários explicitados de forma transparente, e num pacote que não seja parte de propaganda política.
O governo anunciou ontem que vai investir R$34 bilhões num programa habitacional. Os números são de R$25,5 bilhões da União, R$7,5 bi do FGTS e R$1 bi do BNDES. Os R$34 bi, na verdade, estão inflados porque embutem dinheiro que será liberado nos próximos anos para cobrir o subsídio concedido agora ao comprador. O prazo de construção das casas seria inicialmente de dois anos, e agora não está mais definido, mas o de realização do gasto em si vai se estender por muitos anos, muito além do atual mandato e do próximo. Se tivesse que dispor de R$25 bilhões agora, o governo não teria esses recursos, porque ele está em temporada de cortar o orçamento para que ele caiba no que vai realmente acontecer com a arrecadação. E ainda trabalha com projeções de crescimento fora da realidade, como a divulgada ontem pelo cada vez mais desacreditado Ipea, de 2%.
Isso, aliás, foi o que disse o ministro Guido Mantega ontem, de que o pacote seria responsável pelo crescimento do PIB em 2 pontos percentuais. Só que, para chegar lá, o setor de construção teria de crescer cerca de 40%, já que ele tem um peso médio no PIB de 5%, segundo o IBGE. Ou seja, o crescimento é inverossímil.
O chefe do governo reclamou da morosidade e da burocracia do próprio governo que lidera, como se não fosse ele o responsável pela máquina e pela incapacidade gerencial e administrativa que faz com que todos os planos pareçam muito bonitos no papel, mas não se realizem. É uma das técnicas do presidente Lula para ficar só com o bônus de ser governo, e não com o ônus. O PAC, por exemplo, jamais conseguiu gastar tudo o que tem para investir em cada orçamento, e isso porque projetos são mais difíceis de serem executados do que o aumento do gasto corrente, como já vimos.
O programa habitacional demorou meses sendo desenhado e tem várias boas ideias, como a de garantir ao comprador de baixa renda que só pague quando estiver morando, para não ter que somar o custo da prestação ao do aluguel. Outro é o subsídio à taxa de juros que varia de acordo com a renda, maior quanto menor for a capacidade de pagamento do comprador.
Um bom programa de moradia popular era necessário, mas isso, sozinho, não é um plano de combate à crise. Enfrenta um dos lados do enorme déficit de moradias do Brasil. A crise econômica também é grave demais para que as soluções do governo fiquem prisioneiras de objetivos políticos de 2010.
Todo governo lança planos habitacionais, anuncia que a Caixa destinará bilhões para construção da casa própria, e usa o dinheiro do FGTS para isso. O atual já fez isso algumas vezes. Nada garante que esse seja o plano que acabará com todos os planos, mas há grande risco de que esse incorra em alguns erros perigosos.
O FGTS vai ser cada vez mais requerido nos próximos meses pelos saques dos trabalhadores que perderão o emprego. É uma poupança compulsória e mal remunerada (3% ao ano), que tem sido usada como funding para programas que querem pagar um custo pequeno. Mas o fundo tem compromissos com os trabalhadores que estão hoje com emprego e amanhã podem não estar, e que sacarão recursos do FGTS. As últimas notícias dão conta de que tem aumentado o saque, mas isso se agravará nos próximos meses. A melhor forma de o governo usar os recursos públicos para favorecer qualquer setor é explicitar esse custo no orçamento. Mas isso raramente é feito.
O economista Alexandre Marinis acha que o plano é correto no sentido de o governo alocar recursos para quem precisa, e não ficar socorrendo grande empresa, como fez na injeção de R$100 bilhões no BNDES. Mas ele alerta que o governo vem usando demais os recursos do FAT e do FGTS para fazer a política econômica.
- Se o governo não tivesse errado, contratado tanto e aumentado as despesas de pessoal, teria mais R$70 bilhões para investir. O pacote de habitação, por exemplo, poderia ser três vezes maior.
Uma qualidade do programa é ser, como explicou o presidente da Ademi-RJ, Rogério Chor, um programa que tem incentivos à demanda. Normalmente, os planos habitacionais subsidiam a construtora e incentivam a oferta, quando o correto é financiar o comprador final de baixa renda para que ele, com a garantia de uma prestação mais baixa, se disponha a comprar.
Mesmo assim, há detalhes que precisam ser analisados. O presidente do Sinduscon-SP, Sérgio Watanabe, disse que o pacote tem qualidades e deve ajudar o setor, mas citou que nenhum detalhe sobre como os estados e municípios vão apresentar os projetos de habitação foi citado.
- O governo deve regulamentar os princípios básicos, a Caixa vai normatizar. Só que a articulação entre estados e municípios será o grande trabalho para fazer os projetos de infraestrutura. As entidades de classe devem cobrar os projetos. Se isso não acelerar, vai atrasar o início e o andamento das obras.
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