Dilma e Mantega chiam contra a "guerra cambial" euroamericana, mas erram o alvo ou desconversam
O que o governo chama de "guerra cambial" entrou em seu quarto ano. Em revanche, o Brasil dá tiros faz uns três anos, mais ou menos. Parece que o governo aperta o gatilho quando o dólar passa pela casa de R$ 1,70, descendo a ladeira.
No entanto, a guerra cambial não é bem uma, ou é uma "drôle de guerre" (guerra de mentirinha), ou um efeito colateral e radioativo de bombas nucleares que explodiram por outros motivos.
Um país em "guerra cambial" em tese tentaria desvalorizar sua moeda a fim de de ganhar mercado ou defendê-los (a desvalorização barateia produtos de exportação e encarece importados). Pelo menos é do que se queixam Dilma Rousseff e Guido Mantega.
Dilma e Mantega voltaram a chiar a respeito da "guerra". Criticam europeus e americanos, que despejam trilhões de dólares e euros nos mercados financeiros mundiais a fim de evitar que suas economias mergulhem no vinagre.
Mas quem faz guerra cambial de verdade são os asiáticos, China e vizinhos. Europeus e americanos não estão bem numa guerra de desvalorização competitiva (para ganhar mercados).
O banco central dos EUA, o Fed, desde 2008 comprou trilhões de títulos de dívida a fim de:
1) Evitar uma liquidação geral desses papéis, o que deprimiria seus preços e provocaria a derrocada da finança;
2) Irrigar os bancos a fim de estimular o crédito;
3) Derrubar as taxas de juros da praça.
O Banco Central Europeu emprestou aos bancos da eurozona € 1 trilhão a juros negativos a fim de:
1) Evitar que o sistema bancário europeu travasse (os empréstimos interbancários secavam na Europa, pois os bancos temiam a quebra dos parceiros);
2) Evitar falências bancárias, dar sangue a bancos mal capitalizados;
3) Irrigar o mercado de dinheiro bastante de modo a fazer com que sobrasse algum para empréstimos a governos mal das pernas.
Portanto, o objetivo do relaxamento monetário americano e, agora, do europeu (disfarçado) era evitar o colapso do crédito e das instituições financeiras.
Mas, claro, o efeito radiativo dessas bombas financeiras dispersa trilhões de dinheiros pelo planeta. "Sobra" capital no mundo. Assim que diminuiu o medo de desastre na Europa, esse dinheiro foi procurar rentabilidade, que não é bastante no mundo euroamericano.
O dinheiro corre então para ativos de risco: Bolsas (que sobem loucamente), commodities (como o petróleo), ativos de países emergentes (como o Brasil e seu real, que se valoriza). Em suma, o Brasil sofre os efeitos da radiação nuclear financeira, mas não foi o alvo da bomba. Seja como for, é nula a hipótese de Estados Unidos e Europa se incomodarem com queixas brasileiras.
Talvez a chiadeira sirva para legitimar as medidas de proteção ao produtor nacional, as intervenções no mercado de câmbio e as tentativas de controles de capitais.
Mas a radiação financeira que valoriza o real vai demorar a passar. De resto, o Brasil tem defeitos que o fazem extremamente suscetível à torrente de dinheiro euroamericano. Proteger-se apenas com esparadrapos não vai funcionar por muito tempo, se tanto.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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