Cristiane Agostine – Valor Econômico
SÃO PAULO - O PT mudou o discurso em relação ao governo federal e pediu a reorientação da política econômica da presidente Dilma Rousseff, depois de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticar publicamente o partido. Em resolução política divulgada ontem, a legenda defendeu a "imediata reversão" da elevação da taxa de juros e a redução da meta do superávit fiscal.
Há menos de duas semanas, no 5º Congresso petista, o PT evitou críticas à política econômica e retirou do documento final propostas que pudessem ser vistas como uma afronta ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e à presidente. Durante o evento, o comando do partido vetou o verbo "alterar" a política econômica e o substituiu por "conduzir" para retomar o crescimento econômico.
A alteração na postura do partido foi combinada com o ex-presidente Lula, em reunião na quarta-feira com o presidente nacional do PT, Rui Falcão. Ontem, depois de reunião da Executiva nacional do PT, em São Paulo, o presidente da sigla anunciou também medidas para democratizar as decisões partidárias, reaproximar a sigla de sua base social e iniciar a criação de uma frente popular, com vistas às próximas eleições. Falcão afirmou que criará um conselho ligado à presidência do PT com a participação de movimentos sociais, integrantes de partidos como PSOL, PSTU, PSB e PDT, empresários e de petistas que não integram o comando partidário. O grupo, que deve ser composto por entre 15 e 20 pessoas, deverá se reunir em um intervalo entre 30 e 40 dias para "trocar ideias". O dirigente não descartou a participação do ex-ministro Gilberto Carvalho, por exemplo, um dos petistas mais próximos ao ex-presidente Lula. O presidente do PT citou também a possível participação do ex-presidente do PSB Roberto Amaral.
Falcão afirmou que o partido criará também grupos de trabalho para ampliar os debates dentro da legenda com petistas que não estão no comando. A decisão foi anunciada quase duas semanas depois do fim do congresso petistas, que não havia sinalizado mudanças na condução do partido nem em seu financiamento.
A resolução política, com mudanças na postura do PT, foi divulgada dias depois de Lula ter dito que o partido está velho e abaixo do "volume morto", criticado os petistas por só pensarem em cargos e ter defendido uma revolução interna na legenda.
As recentes críticas públicas expressam o aumento da ansiedade do ex-presidente em relação à falta de respostas do PT e de Dilma. Lula tem se mostrado impaciente com a demora da presidente em reagir às crises política e econômica e está angustiado com o aumento do desemprego. Segundo amigos do petista, o ex-presidente subiu o tom das reclamações e resolveu expô-las para dar um "chacoalhão" em Dilma.
Lula tem demonstrado irritação com o fato de suas recomendações ao partido e à presidente não serem seguidas nem surtirem efeito, diz um frequentador do Instituto Lula. O ex-presidente está cansado dos reiterados "tropeços" do governo, de acordo com esse petista. "Essas reclamações são a expressão da ansiedade e angústia que ele tem sentido. Tudo o que ele fala ou tenta interferir no governo não tem resultado. Lula está impaciente com a demora das reações do governo e com as respostas que são dadas", disse um amigo do petista. "Há tempos ele falava isso nas reuniões privadas e agora, ao expor, é como se falasse: 'pelo amor de Deus, vamos mexer nos problemas que estão acontecendo'".
Segundo um amigo de Lula, o ex-presidente tem dito que o ajuste econômico não pode ser o único tema do governo e que é preciso "sacudir" a cultura do partido, já que o congresso petista "não produziu nada" para mudar os vícios e problemas.
O ex-presidente está preocupado com o recrudescimento da crise econômica, em especial com o aumento do desemprego, que tem impacto direto na vida dos trabalhadores - e atinge em cheio o legado de Lula, a imagem do PT e do governo. Lula tem dito que a crise é muito grave e que não tem sido combatida da maneira adequada. Dentro do Instituto Lula, a leitura sobre a conjuntura é pessimista e o governo deve passar por um longo processo de "agonia".
Petistas que frequentam o Instituto Lula afirmaram que não há como o ex-presidente dissociar sua imagem da gestão de Dilma e lembram que o ex-presidente foi o primeiro a dizer isso. Em discursos a petistas, Lula tem afirmado que o fracasso da gestão de sua sucessora é fracasso também dele e do partido.
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