- Folha de S. Paulo
A emergência do vírus da zika como foco de atenção mundial que resta ao país, fonte de uma má notícia por dia (a mera hipótese de ser transmissível por saliva surgir à véspera do Carnaval parece pegadinha), é vista como oportunidade por alguns governistas.
A lógica é fazer do Aedes aegypti a velha saúva: ou o Brasil acaba com ele, ou ele acaba com o Brasil. Capitaneada por uma Dilma mata-mosquitos, a campanha galvanizaria apoio à impopular presidente bem no meio da crise econômica, do tiroteio congressual e das operações policiais.
Mesmo sendo verdade que o noticiário de disputa política e escândalos gera apatia neste momento, a aposta parece no mínimo ambígua.
Nosso presidencialismo faz do titular do Planalto o magneto das queixas da nação. Dilma bem o sabe: pagou até parte da conta de Alckmin lá atrás, no começo da crise hídrica.
Como agravante, além da culpa do vizinho (nunca a nossa, claro), governos –o federal em especial– são responsáveis pela desgraça que se abate no melhor estilo praga do Egito sobre o país. Faltou o óbvio: política consistente de combate ao Aedes e investimento em saneamento.
A "guerra contra o mosquito" começou mal, não só pelas batatadas do incrível ministro da Saúde. Em seu tardio e necessário pronunciamento, Dilma falou de parcerias gringas questionadas no dia seguinte. Disse que a zika não é uma jabuticaba. É verdade, mas o que ecoou foi "crise externa", a usual tentativa de culpar outros pelos seus problemas.
Na Idade Média, era senso comum que os cadáveres infectados catapultados por mongóis para dentro do bastião genovês de Caffa (Crimeia) em 1346 estabeleciam o marco zero da Peste Negra. Ainda que o episódio tenha ocorrido, a microbiologia moderna aponta várias outras razões.
Enquanto a Europa buscava bodes expiatórios, uma lista com judeus, turcos e outros, talvez metade ou mais de sua população pereceu.
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