- O Estado de S.Paulo
Temer manteve o mandato, mas precisa agora mostrar exatamente para o quê
O governo Michel Temer, que começou no rastro de um impeachment, já com uma carga naturalmente dramática, conquistou agora uma segunda chance. Não pode desperdiçá-la, mas o presidente consumiu sua energia política e seu “poder de convencimento” garantindo os votos na Câmara contra a denúncia da PGR e não cuidou de algo essencial: uma agenda que, além de sacudir o governo e o Congresso, mobilize a opinião pública.
Até o furacão JBS, Temer se esforçava para “descolar” a economia da crise política. Depois, concentrou-se em “descolar” os votos do Congresso da sua rejeição popular. Deu certo. Barrou a denúncia, apesar dos míseros 5% de popularidade, algo que só um congressista muito experiente como ele conseguiria.
A vitória na Câmara, porém, não encerra a crise, nem a fragilidade do governo, e a única carta na manga de Temer para manter a esperança do setor privado e o fio de ligação com a opinião pública está sendo... a reforma da Previdência, que não é nada popular e os parlamentares estão a quase um ano das eleições.
Assim, o ministro Henrique Meirelles desagradou o Planalto ao acenar, publicamente, com a possibilidade de votação da reforma da Previdência até outubro. Foi um excesso de otimismo que tende a se transformar rapidamente numa grande frustração e deixa o governo pendurado no vento.
Incomodado, Temer despachou o articulador do governo, Antônio Imbassahy, para almoçar com Rodrigo Maia na sexta-feira, na residência oficial da presidência da Câmara. Afinal, quem define a pauta e o cronograma da Câmara e do Senado não é o ministro da Fazenda e sim os presidentes das duas Casas, Maia e o senador Eunício Oliveira.
Imbassahy tem sido o bombeiro nos incêndios entre o Planalto e Rodrigo Maia, depois que a situação de Temer se deteriorou a ponto de o mercado financeiro e o senador Tasso Jereissati, presidente interino do PSDB (partido de Imbassahy), admitirem com naturalidade a troca de Temer por Maia. Outros palacianos passaram a olhar com desconfiança para o “sucessor”, mas Imbassahy tratou de desfazer intrigas.
Se, em algum momento, Rodrigo Maia foi picado pela mosca azul, logo recuou. Ele é mais novo do que as feras do governo e do Congresso, mas não é bobo. Assumir o Planalto com tantas turbulências, a recuperação frágil da economia, a sociedade mal-humorada e o PT precisando ressuscitar? Portanto, pesaram o senso de lealdade, mas também o cálculo político: tudo tem sua hora.
E qual a avaliação de Maia sobre as chances da reforma da Previdência ainda neste ano? Realista, com seu jeitão de dizer as coisas diretamente, sem subterfúgios, ele admite: “É muito difícil”. Ninguém perde ou ganha eleição por votar contra a denúncia de Temer, por mais que ele tenha recorde negativo nas pesquisas, mas votar numa reforma vendida pela esquerda como arma para “tirar direitos dos mais pobres” pode, sim, interferir nas ambições eleitorais de 2018.
Enquanto o governo distrai a plateia com a reforma da Previdência, o Congresso trabalha na reforma política. Sem mudar o sistema, continuam a proliferação de legendas e o naufrágio dos principais partidos, com cidadãos honestos destruindo suas biografias como políticos. Mas, até agora, a reforma só chega a três pontos: cláusula de barreira para reduzir o número de partidos, troca do voto proporcional pelo “distritão” e fim das coligações partidárias.
E essa pauta não é do Planalto, é do Congresso. Não resolve a falta de marca e de agenda de um governo que só fala em cortar despesas, aumentar impostos e rever o teto de gastos que ele próprio acaba de criar a duras penas. Conclusão: Temer conseguiu manter o mandato, mas ainda não mostrou exatamente para quê.
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