-
O Globo
O
fato de os gigantes tecnológicos poderem se tornar mais poderosos política e
economicamente que estados soberanos preocupa governos de todos os matizes
ideológicos, da China aos Estados Unidos, passando pela Rússia e a União
Européia. O presidente Vladimir Putin é um exemplo disto. Falando ontem no
Fórum Econômico Mundial de Davos por videoconferência, ressaltou que a essa
altura as Big Techs - Google, Amazon, Facebook, Apple, Ali Baba- “já não são
simples gigantes econômicos, em diferentes áreas elas já são de fato
concorrentes do Estado”.
Também a nova administração dos Estados Unidos, com Biden à frente, anunciou
ontem a manutenção do veto da empresa chinesa Huawei na disputa do 5G,
iniciativa que havia sido tomada na administração Trump. Quando se trata de
guerra tecnológica, os opostos se encontram. E há propostas de controlar os
grupos tecnológicos que se tornaram grandes demais, e monopolistas. A tendência
é que o Departamento de Justiça derrote as empresas, impedidno o monopólio,
como aconteceu há anos com a telefonia, quando a AT&T foi desmembrada em
várias empresas.
A China, por sua vez, simplesmente calou Jack Ma, o homem mais rico do país,
que ousou criticar o conservadorismo do Partido Comunista, reivindicando mais
espaço para o crescimento de seu império nascido do site de compras on-line Ali
Baba. Uma das empresas, a Alipay, sistema digital de pagamentos, domina o
mercado chinês, a maior economia do mundo. Ma estava ficando mais poderoso do
que gostaria o governo chinês, e foi aberta uma investigação antitruste para
controlar seu crescimento, que é bom para a economia chinesa, mas não a ponto
de desafiar o Partido Comunista.
Os gigantes tecnológicos têm um papel cada vez mais importante na vida da
sociedade. A posição monopolista das grandes empresas de tecnologia “é a
ideal para a organização dos processos tecnológicos e comerciais”, admitiu
Putin. “Mas na sociedade, surge a questão de quanto tal monopolismo corresponde
aos interesses sociais”, destacou o presidente da Rússia, levantando os mesmos
argumentos de defesa da democracia: “Onde está o limite entre os negócios
globais bem-sucedidos, os serviços necessários, a consolidação dos
macroindicadores e as tentativas de controlar grosseiramente, usando seu
arbítrio, a sociedade, de substituir os institutos democráticos legítimos e, em
essência, usurpar ou limitar os direitos naturais da pessoa de decidir como
viver, o que escolher, qual opinião expressar livremente".
Democracia não é exatamente a praia de Putin, assim como a China está mais
preocupada com o controle da atividade econômica do que com as liberdades
individuais. Nos Estados Unidos, há uma discussão sobre a propriedade de novas
tecnologias barrarem, por critérios próprios, o seu uso, como o Facebook fez
com o ex-presidente Trump. A limitação do uso dessas novas mídias, sobretudo na
tentativa de controlar as disputas políticas, deve ser estabelecida, mas a
discussão é sobre quem definirá os critérios a serem adotados. Ou se é mesmo
necessário ter esse controle, que também não pode ser dos governos.
Indigestão cívica
Sob esse título, escrevi ontem sobre corrupção no governo Bolsonaro, e listei
entre os fatos que merecem investigação a compra de alimentos, como R$ 15 milhões
em leite condensado e cerca de R$ 2 milhões em chicletes, entre outras
aparentes extravagâncias.
Explicações extra-oficiais, não o desabafo do presidente Bolsonaro em linguagem
de botequim, me levam a reconsiderar as críticas. Chicletes e leite condensado
são usados pelas Forças Armadas em certas circunstâncias, e seu uso regular
aparece em compras de diversos governos anteriores, segundo afirmou o
vice-presidente Hamilton Mourão. Seria bom que um pronunciamento oficial,
detalhando os gastos e os preços pagos, esclarecesse de vez a questão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário