Ouvir a expressão “estado de sítio” da boca de Jair Bolsonaro causa calafrios. Como o presidente parece gostar de causar repulsa nos brasileiros, ele vira e mexe vem com essa de estado de sítio, sempre lembrando, como fez nesta quinta-feira, que é sua prerrogativa decretá-lo.
Bolsonaro
não fala disso à toa. A nova menção despropositada à medida extrema veio
totalmente fora de contexto, como sempre. O presidente a comparou às restrições
adotadas pelos governadores para conter o avanço da mortandade desenfreada da
pandemia.
Ele
pode ter sido expulso cedo do Exército e não ser muito versado na Constituição,
mas sabe muito bem que essas medidas não guardam qualquer semelhança com estado
de sítio.
Ao
jogar a expressão ao léu e ainda mencionar o artigo 141 da Constituição, que
seus seguidores adoram evocar para pregar intervenção militar, distorcendo seu
sentido, o presidente lança uma isca para esses fanáticos na linha “quem manda
sou eu”, “eu que tenho a caneta Bic”, o tipo de bravata que adora fazer quando
está acuado.
E motivos não faltam para que o capitão esteja acuado. Ele está a cada dia ficando mais encurralado por sua própria obra criminosa no curso de um ano de pandemia.
A
redução diária no chute travestido de previsão, feito pelo general Pazuello,
para a quantidade de doses de vacinas que estará disponível neste mês de março
de carnificina nacional, a insistência do STF em cobrar, de forma cada vez mais
dura, que o governo federal aja na compra desses imunizantes e no apoio aos
estados para enfrentar o colapso iminente do sistema de saúde e a pressão pela
CPI da Covid-19, que envolve diversos partidos, movimentos de direita antes
condescendentes com o bolsonarismo, como o Vem pra Rua, e que já desaguou no
mesmo Supremo, fazem o sinal de alerta de Bolsonaro pulsar.
Mas
o que o atormenta de verdade, e isso está cada vez mais claro, é a volta de
Lula ao cenário eleitoral. E aqui é que reside a gravidade da cartada de falar
em estado de sítio neste momento.
Num
governo coalhado de militares, diante da indisposição da cúpula sobretudo do
Exército com Lula e o PT, expressada em diversas ocasiões, como no tuíte do
general Villas Bôas advertindo o STF em 2018, esse tipo de exortação
irresponsável pode resultar numa movimentação da caserna em reação à anulação
das condenações do petista.
Na
mesma fala, Bolsonaro ainda incitou seus malucos, da forma como sempre faz,
falando como que a título de preocupação, a promover quebra-quebras e saques. O
bolsonarismo sempre funciona assim: o “mito” lança a ideia e sempre há malucos
para executarem.
Foi
assim nos atos antidemocráticos e também quando ele, numa live, mandou as
pessoas invadirem hospitais de campanha para filmar. Parecia da boca para fora,
mas sempre há pessoas dispostas a difundir e executar esse tipo de comando
golpista que parte do presidente da República.
Os
tais quebra-quebras e saques seriam o pretexto que ele quer para falar de
estado de sítio de forma menos “teórica”? Ao falar em greve, o presidente
também dá uma senha aos caminhoneiros, que têm sido adulados por ele justamente
pelo poder que têm de tornar a população refém de seus motins.
Bolsonaro
tem de ser levado a sério em seus arroubos, porque sua tendência autoritária
não é apenas retórica, ela se manifesta em atos e decisões de governo, e os
exemplos são inúmeros.
Com
espaços importantes do Congresso dominados por fanáticos bolsonaristas, como as
comissões, esse tipo de menção a desordem e estado de sítio tem de receber
reprimenda imediata, inequívoca e dura por parte dos ministros do STF, da OAB e
de todos os que têm compromisso com a preservação da democracia.
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