Enquanto
isso, a pandemia avança e colhe mais vidas
O Dia D, de desatinos do presidente Jair Bolsonaro, foi ontem. Mas poderá ser amanhã ou em qualquer outra data daqui por diante. Nunca na história deste país se viu um presidente ler em público a carta de um suposto suicida – no caso, uma pessoa que teria se matado por ter perdido o emprego devido às medidas de isolamento social adotadas no combate à Covid.
Nunca
se viu um presidente chamar de “estado de sítio” o que nem mesmo de lockdown
pode ser chamado, e alertar que “estado de sítio” cabe a ele decretar, não a
governador. Para completar, nunca se viu um presidente dizer que sua caneta
está carregada de tinta e que é muito fácil implantar uma ditadura no país. Nem
os presidentes da ditadura militar ameaçaram o país nesses termos.
Não
durou 24 horas o ensaio de conversão de Bolsonaro ao uso de máscara e à defesa
de providências que barrem o agravamento da pandemia que só faz bater recorde
atrás de recorde em número de mortos e de infectados. Foram 2.207 novas mortes
e 78.297 novos casos nesta quinta-feira, dia 11 de março. No total até aqui,
273.124 óbitos e 11.284.269 de infectados.
Na última quarta-feira, o Brasil era o país onde mais pessoas morriam da Covid no mundo, com 190 mortes a mais por dia do que os Estados Unidos e à frente de México, Rússia e Itália. Era também o país onde o número de mortes mais subia. Apenas 4,39% da população foi vacinada. O Ministério da Saúde recalcula para baixo o número de doses de vacinas que espera receber.
Auxiliares
de Bolsonaro deixaram de fingir que a volta à cena de Lula não abateu seu
chefe. E que a eventual candidatura do ex-presidente no ano que vem acabaria
por beneficiar Bolsonaro ao aumentar a polarização ideológica. Tanto quanto
Bolsonaro, eles estão atarantados. Temem que o avanço da pandemia, a falta de
vacinas, a inflação e o desemprego em alta favoreçam Lula.
Esse
ser sem rosto e sem nome que a imprensa batizou de mercado teme que Bolsonaro
rompa o pacto firmado com ele de fazer as reformas do Estado prometidas pelo
ministro Paulo Guedes, da Economia, o ex-Posto Ipiranga cada vez mais vazio de
combustível e de quinquilharias. Sempre que Guedes afirma que ruim com
ele, pior sem ele, o mercado entende: não vai dar, emperrou.
O
mundo era outro e bem mais esperançoso para Bolsonaro e seus apoiadores, entre
eles o mercado, até que o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal,
suspendeu as condenações de Lula e provocou o furacão que só ganha força. O
efeito Lula tirou a centro-direita do seu berço esplêndido e, ao invés de
enfraquecer candidaturas ainda adormecidas, poderá fortalecê-las.
Sérgio
Moro parecia morto, mas não está. Luiz Henrique Mandetta, em pesquisas que
simulam o segundo turno, bate Bolsonaro. Luciano Huck está mais assertivo
em suas críticas ao presidente acidental. O PSDB assanhou-se para sair a campo.
Esses nomes, ou um nome novo que apareça, só tomarão votos de Bolsonaro. Lula é
o dono dos votos do seu pedaço.
O
risco para todos é que Bolsonaro tente melar o jogo se concluir que não poderá
vencê-lo. Em sua live das quintas-feiras no Facebook, novamente acusou os
governadores de quererem quebrar a economia do país e incitou seus seguidores a
saírem às ruas em desobediência às ordens de isolamento. Falou em possíveis
ataques a supermercados. Tocou horror.
Por
ora, os militares empregados no governo e os reclusos em quartéis estão
calados. Nenhum se aventurou a lançar nota de advertência ao Supremo com a
intenção de pressioná-lo a manter Lula como ficha suja. Mas não se descarte que
isso possa ocorrer, é tudo o que Bolsonaro deseja. E aí veremos se a democracia
brasileira continua sendo a plantinha tenra que já foi no passado.
Tal pai, insensível à vida alheia, tais filhos que o copiam
Na
política, para eles, vale tudo
Seguem
desrespeitando qualquer limite os filhos do presidente da República. O pior é
que agem em sintonia com o pai. Foi-se o tempo em que o vereador Carlos
Bolsonaro, o Zero Dois, que possuía a senha das páginas do pai nas redes
sociais, escrevia nelas como se fosse ele. Provocou grandes confusões com
isso.
Carlos,
ontem, em sessão da Câmara Municipal do Rio, chamou repetidas vezes de canalha
um vereador do PT que chamara seu pai de genocida. Até aí, jogo jogado. Um
filho sai em defesa do pai. Não precisa de sua prévia autorização. Carlos não é
mais o garoto que chegou para tomar posse na Câmara de mãos dadas com o pai.
Mas,
Eduardo, o Zero Três, hein? Que depois de voltar de Israel onde foi obrigado a
usar máscara, gravou um vídeo em resposta a seus críticos mandando que
enfiassem a “porra” da máscara “no rabo?” Em live no Facebook, seu pai havia
falado da carta de um suposto suicida que se matara devido ao isolamento
social.
Momentos
depois, nas redes sociais, Eduardo publicou foto da carta e do cadáver de um
homem que, segundo ele, morreu endividado. “Carta antes do suicídio” foi o
título da postagem. Ele aproveita para dar condolências à família do suposto
suicida. Muitos internautas reprovaram o gesto, mas muitos apoiaram.
Entidades como o Centro de Valorização da Vida (CVV) desaconselham a divulgação de cartas, bilhetes e fotos de suicidas. A Organização Mundial da Saúde (OMS), também. Eduardo e seu pai estão nem aí para o risco de multiplicação do episódio dado ao alarde feito por eles. É a política bandida do vale tudo.
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