Valor Econômico
NME teria sido adotada em abril de 2008,
três anos antes
Em abril de 2008, nós, brasileiros,
vivíamos, ainda que entorpecidos por razoável grau de ilusão, momento
"mágico" de nossa história. A economia, depois de amargar duas
décadas de baixo crescimento, voltou a expandir-se a um ritmo bem mais forte
que o do último decênio do século XX; a inflação fora finalmente domada; a taxa
de investimento das empresas, inclusive, do setor industrial, crescia de
maneira acelerada, assegurando, portanto, que o avanço da atividade econômica
continuaria nos anos seguintes; o índice de desemprego, há muito estacionado no
nível que especialistas chamam de "exército de reserva", começou a
declinar de forma consistente; e, o melhor, o país voltou a distribuir renda,
beneficiando naquele momento especialmente os trabalhadores de baixa renda e o
imenso contingente de cidadãos que depende de transferência direta de recursos
do Estado para viver.
Nos 12 meses até abril de 2008, o IPCA, índice oficial de inflação, estava em 5,04%, pouco acima da meta fixada para o ano (4,5%). Lembremo-nos: em 2002, em meio à turbulência dos mercados provocada pela sucessão presidencial, a inflação chegou a 12,53%, taxa muito alta sob qualquer hipótese. Em abril daquele ano, foi a 17%, porém, fechou 2003 em 9,30%.
Em 2006, derradeiro ano do primeiro mandato
de Lula, a inflação caiu para 3,14%, a segunda menor taxa da história do país -
a menor foi a de 1998 (1,65%); mas, todos sabemos que, embora real (não houve
manipulação de dados), aquele índice refletiu uma situação econômica
insustentável.
Portanto, durante o primeiro mandato de
Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o governo dedicou-se a desinflacionar a
economia e, também, a fortalecer o arcabouço macroeconômico herdado do governo
anterior, de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Isso foi feito por meio de duas
iniciativas. Primeiro, no início de 2004, o BC anunciou que passaria a acumular
reservas em moeda estrangeira, tirando proveito da enorme liquidez
internacional daquele momento.
A escassez de reservas agudizou a crise de
confiança que, por pouco, não levou o Brasil em 2002 a dar novo calote no
pagamento da dívida externa. Por outro lado, a situação fiscal, embora tenha
melhorado de forma significativa desde 1999, não permitiu ao governo acumular
reservas de forma agressiva. Não nos esqueçamos de um detalhe que de detalhe
não tem nada: a compra de reservas é feita por meio de endividamento público.
Como o juro de curto prazo por aqui tem estado sempre entre os mais altos do
planeta, alguns economistas não viam com bons olhos a acumulação de reservas,
uma vez que o Tesouro toma dívida cara no mercado doméstico para comprar
divisas e a aplica os recursos lá fora, essencialmente em papéis do Tesouro
americano, a um rendimento muito abaixo. Esta discussão está ultrapassada - as
reservas constituem uma espécie de seguro anticrise (ainda que mais caro para
nós, brasileiros), como se constatou na crise mundial de 2007-2008.
O fato é que foi possível comprar reservas
porque a política fiscal de Lula entre 2003 e 2006 gerou folga suficiente para
reduzir o tamanho da dívida e, na sequência, o seu custo. A segunda iniciativa
adotada para fortalecer o tripé de política econômica foi justamente a elevação
dos superávits primários das contas públicas, decisão que colocou a dívida pública
em rota de queda.
Ora, a queda dos preços não resultou apenas
da elevação da taxa básica de juros (Selic) em dois ciclos de alta entre 2003 e
2006. Decorreu da combinação de todas essas políticas. A compra de reservas,
obviamente, ajudou a apreciar o real frente ao dólar, e isso, claro, auxiliou o
BC a estabilizar os preços da economia, uma vez que, apreciada, a taxa de
câmbio expõe o mercado interno à concorrência dos importados.
Apesar de todo o alarido produzido por
petistas inconformados com a decisão de Lula de manter a política econômica de
seu antecessor e então maior adversário político, a estratégia de dar
prioridade ao processo de estabilizar os preços se mostrou acertada. Quem diz
isso não é o humilde autor destas linhas, mas os resultados que o país colheu
já no segundo ano do mandato de Lula.
Ministério da Fazenda e BC não viveram em
permanente lua de mel naquele período, como pode parecer a alguns. Mas os
objetivos da política econômica eram convergentes, e isso foi fundamental para
o sucesso alcançado. Em 2006, fim do primeiro mandato de Lula, a inflação caiu
a 3,14%, a segunda menor taxa da história do país.
Retornando abril de 2008, um grupo de
integrantes do governo e de convidados se reuniu com Lula para lhe dizer o
seguinte: aquela política estava tão equivocada que, em 2010, o país chegaria
ao ano eleitoral em meio a uma perigosa crise no balanço de pagamentos. (na próxima semana, a história continua, em
meio ao tempo carregado de nuvens pretas que estacionam no céu de Brasília
nesta época do ano; a história parece se repetir)
Exemplo argentino
Para manter a taxa de câmbio quase fixa
entre 1995 e 1998, o Banco Central usou uma enormidade de títulos da dívida
pública atrelados à correção cambial para tenta convencer os credores - nacionais
e estrangeiros - de que não haveria desvalorização abrupta do real frente ao
dólar, uma vez que o Tesouro (leia-se: nós, todos, pagadores de tributos,
principalmente, os pobres, cuja carga de impostos é maior) seria o primeiro e
maior prejudicado.
Na Argentina, a garantia de que o cidadão
poderia ir a um banco e trocar 1 peso por 1 dólar foi inscrita na Constituição
no início do Plano Cavallo. Um dia antes da avalanche, o ministro da Economia,
Domingo Cavallo, ao deixar a sede do FMI, onde foi pedir socorro para evitar o
caos que se seguiu nos dias, semanas, meses e anos seguintes, declarou, com
aquela calma de ator canastrão, o seguinte: "The convertibility has come
to stay" (a conversibilidade do peso pelo dólar, que manteve a inflação do
país vizinho por quase uma década em níveis civilizados, veio para ficar,
disse)".
“Mas, ministro, as reservas cambiais
argentinas derreteram em decorrência da perda de confiança dos mercados. Como o
banco central garantirá a paridade sem dispor de reservas?”, indagou um
jornalista brasileiro. "The convertibility has come to stay."
Tanto as NTNs-B (atreladas à variação do
dólar) quanto o mantra de Cavallo mostraram a brasileiros e argentinos que
nossas democracias, sem instituições fortes, forjadas na vida democrática, são
frágeis como a vida da desamparada nação indígena Ianomami
Um comentário:
Esse colunista a soldo parece ser um péssimo roteirista de novelas ruins de televisão
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