Valor Econômico
Atual governo flerta com alternativas que, num passado recente, provocaram recessão
Colocar água na fervura foi a opção do
ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao comentar a ata da reunião do Comitê de
Política Monetária (Copom) divulgada ontem. O documento fala em “eventuais
ajustes futuros” na taxa de juros, mas o ministro preferiu enfatizar a mensagem
que os cortes na taxa Selic foram “interrompidos” para melhor avaliação dos
cenários externo e interno.
Fez bem o ministro, ao empurrar o debate para
o campo da normalidade institucional. As bases da política econômica brasileira
estão hoje sob pressão, e isso tem sido ruim.
Gera nervosismo a incerteza quanto à manutenção do tripé que organizou a macroeconomia brasileira nos últimos 30 anos: geração de superávits primários para manter o endividamento sob controle, inflação domada pelo regime de metas e câmbio flutuante.
O atual governo flerta com alternativas que,
num passado recente, provocaram recessão. As exceções são Haddad e a ministra
do Planejamento, Simone Tebet.
Nas celebrações dos 30 anos do Real, alguns
de seus “pais” avaliaram a consolidação do plano nos dias de hoje.
O tripé está um pouco manco, disse Persio
Arida. Referia-se os déficits primários registrados nos anos recentes.
É preciso retornar aos fundamentos do plano
de estabilização, acrescentou Edmar Bacha, ao relembrar a flexibilização do
Orçamento proporcionada pela antiga Desvinculação de Receitas da União (DRU).
Como no passado, a trajetória explosiva das despesas obrigatórias está hoje na
ordem do dia.
Pedro Malan sugeriu a releitura do Programa
de Ação Imediata (PAI), de 1993. É um precursor do Real que enfatiza a
importância de contas organizadas como condição para a estabilidade de preços.
Assim, na visão dos três, ainda há velhos
desafios a serem superados, para se concretizar o projeto de desenvolvimento
econômico, social e político-institucional do país que é o Real.
Eles afirmam, por outro lado, que inflação
elevada não volta, porque os eleitores punem nas urnas os aventureiros que
colocam a estabilidade em risco. Daí a importância da democracia.
Olhando para os 30 anos do Real, é possível
ver que, há dez anos, o país passou por um momento de incerteza parecido com o
atual. A então presidente Dilma Rousseff colocava em operação um modelo
alternativo ao tripé, a Nova Matriz Macroeconômica.
Os dois anos seguintes foram de crise e
retração da economia.
Toda vez que, no atual mandato, o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva demonstra simpatia pelas ideias que orientaram aquele
experimento, a turbulência toma conta dos mercados.
Hoje, por exemplo, há dúvidas quanto ao
futuro da perna fiscal do tripé. E receio de interferência política na perna
monetária.
No fiscal, Haddad e Tebet preparam propostas
para atacar renúncias fiscais e gastos obrigatórios. São temas impopulares. É
pouco provável que Lula dê um sinal mais assertivo de apoio à dupla.
Até agora, o máximo que ele fez foi não
interditar o debate, quando foi apresentado às dificuldades para se fechar a
proposta de Orçamento de 2025. Pelo contrário, deu sinal verde às discussões.
As próximas decisões sobre gastos públicos
dirão qual é o espaço disponível para o ajuste fiscal. No próximo dia 22, pode
ser anunciado um contingenciamento de despesas, de forma a assegurar o
cumprimento da meta de déficit zero de 2024. Se ocorrer, é certa a chiadeira da
ala política do governo. No dia 31 de agosto, será apresentado o projeto de
Orçamento para 2025, com possíveis medidas de contenção de despesas. Mais
chiadeira.
Na política monetária, está em curso a
reconstrução da imagem de independência técnica do Banco Central. O voto
unânime pela manutenção da taxa Selic em 10,5% foi um primeiro passo.
Deve sair hoje o decreto que regula a meta
contínua de inflação. Há um ano, Haddad anunciou que seria de 3%, com margem de
tolerância de 1,5 ponto, para valer a partir do ano que vem.
Aos trancos e barrancos, o tripé vai
resistindo.
Dinheiro, tem
Voltou ontem à Terra a sonda espacial que os
chineses enviaram para coletar material no lado escuro da Lua. Aquele país é
uma potência científica e chegou a esse ponto gastando proporcionalmente menos
do que o Brasil em educação, ressaltou o ex-ministro da Fazenda Mailson da
Nóbrega.
Os números são do Banco Mundial. Em 2020, o
Brasil gastou 5,8% do seu Produto Interno Bruto (PIB) em educação. A China,
3,3% de seu PIB. Com alguns períodos sem informação, a série histórica mostra o
gasto brasileiro acima do chinês desde 1998.
Mas, notou o ex-ministro, os estudantes
brasileiros estão na rabeira do Programa Internacional de Avaliação de
Estudantes (Pisa). Na sua visão, falta qualidade no ensino.
Chamou a atenção de Mailson o olhar proposto por Tebet para os recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Ela destacou que o país aportará R$ 72,4 bilhões no ensino básico em 2028 (ante R$ 2 bilhões em 2007), num momento em que o número de matrículas está em queda e os resultados no Pisa não são bons.
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