quarta-feira, 30 de outubro de 2024

Tarcísio só erra numa direção – Elio Gaspari

O Globo

O governador teve seu momento Pablo Marçal

Pelo andar da carruagem, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, será candidato à Presidência em 2026. Sua vitória eleitoral e muitos aspectos de sua gestão qualificam-no para isso. Ele produziu uma imagem austera, próxima do unicórnio de político técnico. Como se sabe, unicórnio não existe.

Tarcísio de Freitas é um exemplo dos poucos momentos virtuosos na passagem de Jair Bolsonaro pela Presidência da República. Ele o escolheu para o Ministério da Infraestrutura sem conhecê-lo. No Planalto, foi Bolsonaro quem o convenceu a disputar o governo de São Paulo.

Tarcísio seria um bolsonarista moderado. Como ensina a repórter Flávia Oliveira, “bolsonarista moderado é como cabeça de bacalhau, não existe”. Na tarde de domingo, tendo ao lado o prefeito Ricardo Nunes, Tarcísio disse o seguinte:

— Houve interceptação de conversas e de orientações que eram emanadas de presídios por parte de uma facção criminosa, orientando determinadas pessoas em determinadas áreas a votar em determinados candidatos.

Questionado por uma jornalista sobre quem seria o candidato para quem houve a orientação a votar, Tarcísio respondeu:

— Boulos.

As urnas estavam abertas, e as interceptações eram de setembro, anteriores ao primeiro turno, imprestáveis como prova de que Boulos tinha o apoio do Primeiro Comando da Capital. O governador de São Paulo acabava de viver seu momento Pablo Marçal. Horas depois, com as urnas fechadas e Nunes reeleito com mais de 1 milhão de votos de diferença, o governador admitiu que cometeu um erro ao acusar Boulos.

Em março passado, quando a PM de São Paulo barbarizava na Baixada Santista, com dezenas de mortos, e era denunciada à Comissão de Direito Humanos das Nações Unidas, ele disse:

— Pode ir na ONU, na Liga da Justiça, no raio que o parta, que eu não tô nem aí.

Um mês depois, desculpou-se:

— Naquela fala, perdi a paciência, perdi a cabeça.

Seria um bacalhau em busca de uma cabeça, mas Tarcísio só erra numa direção, como o do mercado.

Indo ao erro de domingo, Tarcísio deveria medir o tamanho de sua leviandade no exemplo de um político que sabia jogar sujo. Lyndon Johnson (1908-1973) gostava de contar uma de suas piadas favoritas:

— O candidato a xerife é amigo do dono do jornal e lhe pede que publique que seu rival foi visto tendo relações com um porco. O amigo diz que o outro desmentirá a acusação.

— É o que eu quero — arremata o amigo.

Em outubro de 1968, o mesmo Johnson era presidente dos Estados Unidos, tinha uma guerra no Vietnã e estava pronto para anunciar o início de negociações para buscar a paz. Haveria uma eleição presidencial no dia 5 de novembro, e ele tinha candidato. Seu adversário, Richard Nixon, soube da iniciativa. (A informação veio do professor Henry Kissinger, que tinha um pé em cada candidatura.)

Johnson soube que Nixon torpedearia a iniciativa de paz, pedindo ao Vietnã do Sul que se recusasse a negociar. Grampeou os interessados e interceptou comunicações diplomáticas.

Tinha todas as provas de que o candidato conspirou para travar o acordo, mas ficou calado, e Nixon elegeu-se. Por quê? Pelo estrago que uma denúncia daquele tamanho provocaria no país.

Diferentemente dos episódios de Pablo Marçal e de Tarcísio de Freitas, a denúncia de Johnson seria verdadeira.

 

3 comentários:

ADEMAR AMANCIO disse...

Não entendi o desespero do Tarcísio que não é Meira,eram favas contadas que Nunes seria reeleito com folga.

Augusto disse...

Gaspari na ansia de agradar ao Planalto mistura bugalhos com ...excuse my french...para atacar Tarcisio. Triste velhice de um garachué de Golbery e Geisei se resumir a aplaudir coisas de Lula, Dirceu etc

Anônimo disse...

Gaspari tanto critica quanto elogia Lula e seu governo, acho até que mais critica do que elogia.