terça-feira, 1 de abril de 2025

Acionista majoritário do BRB vive de mesada da União – Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Oferta pelo Master vem de um banco público cujo acionista majoritário, o DF, vive de mesada da União

Na votação do pacote fiscal em dezembro do ano passado, a proposta cuja rejeição mais frustrou a estimativa de corte foi o enquadramento do Fundo Constitucional do Distrito Federal nas regras do arcabouço, que atrela a correção dos recursos à inflação. Com isso, o fundo, que custa à União R$ 25 bilhões por ano (eram R$ 15 bi em 2021), continuou a ser corrigido pela variação da receita corrente líquida da União. Foi a segunda tentativa fracassada, em dois anos, de mudar esta correção.

Convergiram pela exclusão do FCDF das regras fiscais vigentes parlamentares da direita à esquerda. Na votação do ajuste, o relator, deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), foi efusivamente cumprimentado tanto pela deputada Erika Kokay (PT-DF) quanto pelo deputado Alberto Fraga (PL-DF). O fundo, regulamentado em 2002, aporta recursos à segurança, educação e saúde públicas do DF porque a Constituição o trata como uma unidade da federação cujos “compromissos financeiros” cabem à União.

O Distrito Federal é uma das últimas unidades da Federação a controlar um banco público, o BRB. Trata-se de uma instituição financeira de economia mista e uma das poucas que restaram da leva de privatizações.

Na última sexta-feira, o BRB fez uma oferta pelo banco Master que hoje está sob análise do Banco Central e do Cade. Propôs-se a pagar até R$ 2 bilhões por 49% das ações ordinárias. Ou seja, não obteria o controle da instituição, que permaneceria com Daniel Vorcaro, personagem com tapete vermelho em gabinetes estrelados do Congresso e bom trânsito com ministros do Supremo Tribunal Federal e do Executivo.

A operação do BRB/Master varou o fim de semana como o tema mais palpitante da República. O crescimento acelerado do banco, captando dinheiro com uma taxa sem igual no mercado, acabou por gerar desconfiança geral. Os recursos arrecadados eram destinados a operações que nem sempre se mostravam rentáveis ou dependiam de decisões judiciais, como já contou Consuelo Dieguez na “Piauí”, em agosto do ano passado.

A saída vislumbrada para vencer a desconfiança seria aumentar o limite dos investimentos garantidos pelo Fundo Garantidor de Crédito. Mantido pelas instituições financeiras, o FGC ressarce até R$ 250 mil. No segundo semestre de 2024, o senador Ciro Nogueira (PP-PI) propôs elevar a cobertura do FGC a R$ 1 milhão. A proposta, que logo ganhou o nome de “emenda Master”, foi rechaçada.

A aprovação da operação pelo BC é, na definição de um integrante do Executivo com passagem pelo mercado, o “fim do governo Lula”. A liquidação, na visão de um dirigente de instituição financeira, seria a melhor saída, com os investidores ressarcidos pelo FGC. A alternativa, além de levar os bancos a terem que capitalizar o fundo garantidor não resolve a situação de investidores institucionais como a Rioprevidência.

Quanto mais se cava nessa história, menos se tem certeza do que o BRB teria a ganhar com esta operação. Ainda que seus dirigentes garantam rentabilidade, ninguém, de fato, sabe hoje qual o tamanho do passivo do Master. O que não será resolvido, seja qual for a decisão do BC sobre a operação, é a insustentável situação do acionista majoritário do BRB na federação.

Como o acionista majoritário de um banco tão capitalizado a ponto de comprar outro de patrimônio maior que o seu precisa de um socorro anual da União de R$ 25 bi? E não apenas. Além de custear suas políticas públicas, é a União ainda quem se encarrega dos gastos do Distrito Federal com o Judiciário, o Ministério Público. Até o metrô foi executado com o Orçamento federal.

Oliveira Alves Pereira Filho, com duas monografias sobre o Fundo Constitucional do Distrito Federal premiadas pelo Tesouro Nacional, compara o DF ao filho adulto que vive de mesada. Como o dinheiro sobra e não vem do seu próprio suor, pode se dar ao luxo de desperdiçá-lo.

Ao cotejar os indicadores de segurança pública do DF com outras unidades da Federação, Pereira Filho diz que o fundo chega até a piorá-los porque permite um gasto perdulário com o maior salário do país e aquisições desnecessárias, não se importando em aumentar a eficiência de sua gestão. O 8/1 que o diga. A despesa per capita com segurança na capital federal supera em cinco vezes a média dos demais Estados.

Além do FCDF, o Distrito Federal, por ter competências tributárias de Estados e municípios, acumula os repasses federais de um e de outro, como o FPE, o FPM, o Fundeb e os recursos destinados ao SUS. Isso faz com que o Distrito Federal tenha uma receita total per capita equivalente a mais do que o dobro da média nacional e três vezes a média do Nordeste.

A engenharia orçamentária montada para viabilizar a autonomia do Distrito Federal, na verdade, deu na anomalia federativa e no BRBA proposta para a compra do Master nasceu desta abundância.

A receita sem precedentes do Distrito Federal não evitou que em suas cidades satélites se aglomerassem algumas das maiores favelas do país. Permitiu, porém, que o GDF tivesse folga de caixa para capitalizar o BRB e viabilizar uma proposta para que o Master continue com as práticas que levaram à ascensão e queda de um meteoro do mercado financeiro cuja trajetória fulgurante fez a alegria de muitas carreiras - públicas e privadas - em Brasília e além.

 

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