O Globo
Expandir a denúncia é o melhor remédio
O Pé-de-Meia é o melhor programa social do
terceiro mandato de Lula.
Ele busca incentivar jovens carentes a permanecer nas salas de aula do ensino
médio, oferecendo-lhes bolsas de R$ 1.000 ao fim de cada ano letivo concluído.
O repórter André Shalders mostrou que o programa está contaminado por
fraudadores. Numa balbúrdia de estatísticas, há cidades onde o número de
bolsistas é maior que o de estudantes. Riacho de Santana, na Bahia, teve 1.231
bolsistas. A direção do único colégio público da cidade informa que há só 1.024
matriculados no ensino médio. A Secretaria de Educação do estado diz que os
alunos são 1.677. Para o MEC, seriam 1.860. Seja qual for o número certo, há
gato na tuba.
Nos últimos tempos, o MEC teve dois programas ambiciosos: o ProUni e o Fies. O primeiro matriculou em faculdades privadas estudantes bem colocados no Enem. Sucesso, não custou um centavo, pois as bolsas compensavam isenções tributárias concedidas havia tempo. O Fies, em tese, financiava estudantes de faculdades privadas. Fracasso, emprestava sem fiador a jovens com desempenhos medíocres no Enem. Na vida real, repassaram-se para a Viúva as carteiras de inadimplência dos maganos do ensino superior privado. O Fies resultou num rombo estimado em R$ 20 bilhões.
Se o ralo do Fies tivesse sido reconhecido
ou denunciado no primeiro ano da festa, o buraco teria sido menor.
Infelizmente, o governo preferiu fazer o jogo do contente, enquanto as ações
dos grupos que controlavam as faculdades bombaram na Bolsa de Valores.
As fraudes descobertas no Pé-de-Meia são
pontuais, pois o dinheiro vai direto para o bolso dos estudantes ou de suas
famílias. O MEC tem dois caminhos: pode varrer o problema para baixo do tapete
com estatísticas mágicas ou pode cavalgar nas denúncias, expondo os municípios
fraudadores. É difícil imaginar que as fraudes numa cidade partam de iniciativa
dos estudantes. O lance seria impossível sem a mão invisível de gente da rede
pública de ensino.
Além das fraudes que podem desmoralizar o
Pé-de-Meia, sob o guarda-chuva do MEC há hoje outra esquisitice. O Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep)
engavetou dados do seu sistema de avaliação do desempenho dos estados. A
decisão, tomada pela direção, contrariou pareceres técnicos.
Os dados engavetados mostram que alguns
estados vão bem e outros vão mal. O efeito político dessas avaliações é óbvio:
alguns governadores ficarão felizes e outros amargurados.
O Sistema de Avaliação da Educação Básica
(Saeb) é uma conquista da pedagogia nacional. Ele mostra quem vai bem e quem
não vai. Sua utilidade depende da divulgação das pesquisas.
Avaliar para engavetar seria repetir o que
fazia D. Pedro II. Em suas viagens pelo Brasil, além de contar degraus de
escadas, fazia questão de visitar escolas, arguindo professores e alunos. Em
1859 ele foi à Bahia, contou 107 degraus, conversou com diversos professores,
anotou tudo, para nada. Como lembrou Sérgio Buarque de Holanda, naquela figura
avaliadora e paternal havia “muito lastro para pouca vela”.
Os dados do Inep e o Pé-de-Meia não podem
virar lastro de barco sem vela.
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