Ibama acertou ao autorizar pesquisa na Margem Equatorial
Por O Globo
Decisão foi tomada depois que a Petrobras
aprimorou projeto para mitigar riscos ao meio ambiente
Foi sensata a decisão do Ibama de conceder licença à Petrobras para perfurar um poço exploratório na Bacia da Foz do Amazonas, na área conhecida como Margem Equatorial. Não fazia sentido protelar a resposta à petroleira, uma vez que as discussões em torno do projeto se estendem desde 2020. Ministério do Meio Ambiente e Ibama informaram que a decisão resultou de um “rigoroso processo de licenciamento ambiental”, em que os planos da Petrobras tiveram de ser aperfeiçoados, em especial em relação às respostas para situações de emergência.
A fase atual da pesquisa objetiva avaliar a
viabilidade econômica de explorar petróleo e gás. Segundo a Empresa de Pesquisa
Energética (EPE), estudos estimam haver o equivalente a 6,2 bilhões de barris
na área, um salto nas reservas provadas da Petrobras, que hoje alcançam 11,4
bilhões. A preocupação com o meio ambiente sempre foi acertada, e não poderia
ser diferente.
Não se pode dizer que tenha sido
negligenciada. Depois do indeferimento da licença em 2023, a Petrobras
recorreu, dando início a uma intensa discussão que permitiu o aprimoramento do
projeto. Foram exigidos um Centro de Reabilitação e Despetrolização em Oiapoque
(AP), que se junta ao de Belém (PA), além de três embarcações offshore para
atendimento de fauna e exercícios de simulação durante a perfuração do poço.
Além disso, o plano teve de seguir protocolos com estudo de impacto ambiental,
audiências públicas, reuniões técnicas e vistorias nas estruturas de resposta a
emergências. A presidente da Petrobras, Magda
Chambriard, prometeu operar com “segurança, responsabilidade e qualidade
técnica”.
Embora se trate da Bacia da Foz do Amazonas,
o poço fica em águas profundas do Amapá, a 500km da área
onde desemboca o rio. No Sudeste, a exploração do pré-sal ocorre a 300km das
praias, em região de intensa atividade turística, onde não é menor a
preocupação com o meio ambiente e o risco de desastres. O importante é haver
planos de mitigação e recursos para agir diante de eventuais emergências.
Críticos da licença afirmam que ela contradiz
as metas de transição energética e descarbonização da economia. Mas não há
contradição. Ainda que o petróleo contribua para o aquecimento global, a
transição se dará de forma gradual. O Brasil e o mundo continuarão precisando
de petróleo nas próximas décadas. A previsão é que o pré-sal explorado hoje
dure no máximo 15 anos. Se não tiver reservas para atender à demanda, o Brasil
precisará importar petróleo. Não faria sentido. Os compromissos do Brasil para
reduzir emissões seguem os mesmos, independentemente da licença concedida. E a
exploração trará mais recursos para investir na transição energética.
São frágeis também os argumentos que apontam
incoerência do licenciamento às vésperas da Conferência da ONU sobre o Clima
(COP30). O pedido de licenciamento é discutido há pelo menos cinco anos, quando
Belém nem havia sido escolhida como sede.
É justa a preocupação com a proteção da vida
marinha, dos corais ou dos povos da floresta, mas não há motivo para temores
infundados. A Petrobras dispõe de conhecimento técnico e tem histórico
favorável na prevenção e na mitigação de vazamentos. A longa batalha em torno
do licenciamento resultou num conjunto de medidas rigorosas, que seguem padrões
internacionais. Como deve ser quando se trata de projetos estratégicos.
Novo
governo boliviano representa uma oportunidade de regeneração
Por
O Globo
Vitória
da centro-direita encerra 20 anos de domínio populista e é passo na
consolidação da democracia
A
vitória de Rodrigo Paz nas eleições presidenciais bolivianas põe fim a 20 anos
do projeto populista conduzido pelo MAS (Movimento ao Socialismo), criado pelo
ex-presidente e hoje foragido da Justiça Evo Morales.
Paz, de centro-direita, herda uma Bolívia em
grave crise econômica. Precisará ajustar as finanças públicas, questão política
e socialmente sensível num país de sindicatos fortes, meio de onde veio
Morales. É também parte do desafio de Paz zelar pela estabilidade da Bolívia,
que, desde a independência no século XIX, testemunhou cerca de 190 golpes de
Estado, o último deles no ano passado. O rodízio no poder é salutar em qualquer
democracia.
Paz
derrotou no segundo turno o ex-presidente Jorge “Tuto” Quiroga, representante
da direita tradicional. Mais ao centro, atraiu eleitores moderados, desiludidos
com o desfecho das duas décadas em que a esquerda comandou o país. Senador,
filho do ex-presidente Jaime Paz Zamora, contará com o controle do Congresso,
onde seu partido, o Democrata Cristão (PDC), ocupará 47 cadeiras, e a Aliança
Livre, de Quiroga, 37 (do total de 130). Não será difícil selar acordos de
governabilidade no mesmo campo político.
A
campanha eleitoral foi dominada por discussões sobre a economia: inflação,
escassez de combustíveis e falta de dólares para importar bens de consumo. Essa
agenda se justifica pela incompetência do MAS e de Morales no aproveitamento
das grandes reservas de gás e de lítio da Bolívia para criar políticas que
alavancassem o país. A previsão para este ano é de recessão de 2,5%, causada
pela deterioração nos setores de gás, petróleo, mineração e noutras atividades.
Na prática, os governos do MAS faliram a Bolívia.
O
novo presidente assume com o crédito dado pelas urnas, mas terá de correr
contra o tempo para tomar medidas de ajuste fiscal e esperar que gerem efeitos
positivos no menor prazo possível, antes que os custos inerentes a qualquer
programa do tipo alterem o humor de uma sociedade politizada, reunida em torno
de sindicatos. O relacionamento com os Estados Unidos não foi tema de destaque
na campanha, mas o secretário de Estado, Marco Rubio, com a definição do
segundo turno sem o MAS, se disse otimista depois de décadas de
antiamericanismo. Há, portanto, abertura para apoio americano a Paz, ainda que
não necessariamente na mesma intensidade que ao argentino Javier Milei,
alinhado ideologicamente a Donald Trump.
A troca de guarda em La Paz abre caminho para consolidar a democracia boliviana e superar o golpismo como cultura política. Sinal de amadurecimento tem sido o tratamento independente — e implacável — da Justiça a ex-presidentes. Morales é acusado de crime sexual contra menor e tráfico de pessoas. A ex-presidente Jeanine Áñez, que assumiu o governo quando Morales renunciou depois de reeleito num pleito irregular, está presa desde 2021 por ter ocupado o cargo de forma inconstitucional. É excelente notícia para a América Latina a consolidação da democracia na Bolívia, e a eleição de Paz é um passo nessa direção.
Apostar em combustível fóssil é olhar para
trás
Por Folha de S. Paulo
Ibama autoriza Petrobras a iniciar perfuração
na Foz do Amazonas, alvo de pressão política e econômica
Governo Lula crê que petróleo é prosperidade
e tem plano vago para transição energética; seu pacote dito verde destaca gás
natural
Não chegou a
ser surpresa a licença concedida à Petrobras para
a perfuração do primeiro poço em águas profundas na bacia da Foz do Amazonas.
Causa espécie, sim, que a decisão tenha sido tomada a poucos dias da COP30,
a conferência global sobre o clima em Belém,
mas isso não deixa de ser indicativo do real pensamento do governo brasileiro
sobre o tema.
Ressalve-se que, por ora, não se trata de
produção de petróleo.
O que se fará de imediato no oceano, a 175 quilômetros da costa do Amapá, é tão
somente uma pesquisa exploratória para verificar se há jazidas na região em
escala que justifique a exploração. Mas é notório que, em caso positivo, haverá
enorme pressão política e econômica para seguir adiante.
Não por acaso, o processo de
licenciamento foi cercado de controvérsia ao longo de cinco
anos. Em 2023, a área técnica do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama)
recomendou que a autorização fosse negada. Um parecer interno mantinha essa
posição no início deste ano, conforme noticiou a Folha.
A demora causou irritação no Planalto, como
explicitou Luiz Inácio Lula da
Silva (PT)
em fevereiro. "Se depois a gente vai explorar, é outra discussão. O que
não dá é para a gente ficar nessa lenga-lenga. O Ibama é um órgão do governo,
parecendo que é um órgão contra o governo."
A pasta do Meio Ambiente, chefiada por Marina Silva,
tem evitado o confronto aberto. Na segunda (20), o ministério afirmou em nota
que a
licença resulta de um processo rigoroso, que impôs uma série de
exigências à Petrobras. Como revelou este jornal, foram 34 condicionantes, além
da cobrança de R$ 39,6 milhões em compensações ambientais.
Tecnicalidades à parte, resta o fato
incontornável de que o Brasil continuará apostando em mais combustíveis
fósseis, na contramão da agenda de transição energética que se impõe em todo o
mundo. A cobiça despertada pela descoberta de vastos reservatórios na
vizinha Guiana supera
escrúpulos de coerência e desconhece divergências políticas.
Se não partilha do discurso e das práticas
antiambientais de Jair
Bolsonaro (PL), a administração
petista acredita desde os tempos da descoberta do pré-sal que o petróleo
—explorado, é claro, pela estatal do setor— garantirá a prosperidade do país. A
esse desenvolvimentismo obsoleto somam-se forças como o presidente do Senado,
o amapaense Davi
Alcolumbre (União Brasil).
Os planos para a busca da energia limpa são
frágeis. O pacote supostamente verde lançado pelo governo destaca o fomento ao
gás natural, outro combustível fóssil. A indústria automotiva continua a
receber subsídios oficiais, e a importação de carros elétricos teve seus
impostos elevados.
É verdade que, hoje ao menos, combate-se o
desmatamento, principal contribuição do país para o aquecimento global. Quanto
à transição energética, porém, ainda olhamos para trás.
Bolívia abandona populismo de esquerda
Por Folha de S. Paulo
Presidente eleito de centro-direita Rodrigo
Paz enfrentará desafio na economia e para neutralizar Morales
O fato de o eleitorado não ter rumado ao
extremo oposto do espectro indica que ele optou por soluções socialmente menos
invasivas
A vitória do candidato de centro-direita
Rodrigo Paz Pereira na eleição boliviana realizada no domingo (19) interrompe
duas décadas de populismo de esquerda no poder.
E o fato de a mudança de rota não ter seguido
em direção ao extremo oposto do espectro político indica que o eleitorado optou
por soluções socialmente menos invasivas para os graves dilemas econômicos do
país.
O fim do domínio do Movimento ao Socialismo
(MAS) —fundado em 1997 pelo líder cocaleiro Evo Morales,
que governou a Bolívia de
2006 a 2019— já mostrava-se inevitável antes mesmo do primeiro turno, em
agosto. A presença de dois candidatos à direita na segunda fase eleitoral
consolidou tal perspectiva.
Com 97% das urnas apuradas, o moderado Paz,
do Partido Democrata Cristão, abarcou 54,4% dos votos graças às suas promessas
de reduzir a inflação,
abrir o país a investimentos produtivos e não expor os mais pobres a cortes em
subsídios sociais. Já o candidato da Aliança Livre e defensor de uma agenda
ultraliberal, Jorge Tuto Quiroga, obteve 45,6%.
Há dúvidas sobre a real capacidade de o
governo eleito imprimir o pragmatismo prometido aos eleitores a partir de
novembro, quando tomará posse. A economia boliviana
se vê presa ao modelo ideológico estatizante adotado por Morales e abalada por
decisões equivocadas.
Apesar das tentativas da atual gestão
de Luis Arce,
do MAS, de corrigir esse rumo, a população tem sido castigada. A taxa de
inflação acumulada de janeiro a julho alcançou 16,9%, 9 pontos percentuais
acima da previsão oficial para o ano, e a informalidade atinge 84,2% do
trabalho.
Pesam, ainda, a estimativa do Fundo Monetário
Internacional (FMI)
de apenas 0,6% de crescimento real da atividade neste 2025 e as reservas
internacionais minguadas a ponto de limitar a indispensável importação de
combustíveis; a baixa produção de gás natural e de lítio completa o cenário
crítico.
Parece louvável a disposição de Rodrigo Paz
Pereira de formar um governo de conciliação, distante de posições radicais,
capaz de neutralizar o potencial de Evo Morales para causar desgastes e
contratempos, como fez ao
longo desta eleição e da gestão de Arce —que foi ministro das
Finanças de Morales por cerca de 12 anos.
Embora esteja impedido de candidatar-se a cargos públicos e sujeito a 14 processos na Justiça, o ex-presidente esquerdista ainda é uma força política relevante em um cenário delicado. Trata-se de um fato que o governo Paz não poderá ignorar.
Queda do petróleo reforça rota declinante da
inflação
Por Valor Econômico
Com um pouco de sorte é possível que os
fatores favoráveis persistam por um tempo suficiente para derrubar mais
rapidamente a inflação
A queda do petróleo veio agora a se juntar
aos fatores favoráveis ao recuo da inflação no Brasil. A redução dos preços da
gasolina, de 4,9%, ampliou as chances de que o IPCA volte para baixo do teto de
4,5%, o qual ultrapassou durante todo o ano. O índice de inflação de setembro,
de 0,48%, já trouxera indícios de novo arrefecimento das pressões, em especial
em alguns subitens de serviços, que continuam puxando a média muito para cima
(evolução de 6,14% nos 12 meses encerrados em setembro), e alimentos, cujos
preços tiveram a quarta queda consecutiva. Os juros de 15% (com taxa real ao
redor de 10%), os maiores em quase duas décadas, estão esfriando aos poucos a
economia e retirando o calor dos preços.
O cenário externo continua de alta incerteza
e deve continuar assim enquanto Donald Trump for presidente dos Estados Unidos.
Mas também há influências positivas vindas de fora, como a queda do dólar. A
maxidesvalorização do real fez explodir a inflação no fim de 2024 e elevou-a
acima de 4,5% já a partir de janeiro, com efeitos que se prolongaram até meados
do ano. Com Trump e sua guerra comercial total contra o mundo e a perspectiva
de recessão e queda dos juros nos EUA, porém, a moeda americana entrou em
baixa. Mesmo tendo perdido 10% de seu valor diante de uma cesta de moeda fortes
no ano, ele prossegue acima de sua média histórica. Mas não há nenhum fator que
a curto prazo aponte para sua revalorização, pois ele perdeu parte de seu poder
como abrigo internacional de instabilidades econômicas variadas.
A contenção do dólar, ou uma pequena variação
entre R$ 5,40-R$ 5,55, é muito importante para fazer a inflação retroceder. A
determinação do Banco Central brasileiro em manter juros reais altíssimos até
que o IPCA dê sinais seguros de que caminha para a meta tende a amortecer
eventuais impulsos altistas do câmbio, pelo diferencial entre taxas de juros
com os EUA, onde o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) tende a
afrouxar, mesmo que comedidamente, a política monetária.
A desinflação tem contado também com a bênção
dos preços das commodities em queda, no Brasil ainda potencializado por uma
supersafra, derrubando os preços dos alimentos. Os alimentos foram um dos
principais impulsionadores do IPCA quando a inflação disparou e também de perda
de popularidade do presidente Lula no fim do ano passado e início deste ano.
Agora, a variação dos preços do setor cai há quatro meses consecutivos. Há
dúvidas sobre se esse movimento persistirá a curto prazo, embora a abundância
da oferta no mínimo limite o horizonte de elevação de preços.
Em reais, as commodities agrícolas recuaram
11,46% no ano, segundo o IC-Br do Banco Central, que no índice geral no mesmo
período mostra baixa de 10,27%. Ao lado das commodities de alimentos, as de
energia passaram a cair mais rápido, -16,7% no ano. O cartel da Opep, mais
Rússia e alguns outros países produtores, resolveu aumentar a oferta (depois de
cortá-la por alguns anos) no exato momento em que as perspectivas da economia
mundial apontavam uma redução do crescimento, tanto pelos efeitos da guerra
comercial, nos EUA, quanto pela desaceleração na China puxada pelo setor
imobiliário e moderação do consumo. No ano até ontem as cotações do petróleo
tipo Brent haviam declinado 17,12%, para US$ 61,4 o barril. Na ausência de
turbulências no Oriente Médio, uma suposição sempre desmentida pelos fatos, a
oferta deve continuar superior à demanda até o próximo ano, colocando barreiras
a grandes saltos, salvo comoções geopolíticas.
O desempenho benéfico de preços de alimentos,
petróleo e dólar serviu de algum anteparo à pressão dos serviços, que parecem
estar perdendo o fôlego sob impacto dos juros muito altos. No IPCA de setembro,
os serviços subjacentes, mais influenciados pelo ciclo econômico, variaram
apenas 0,03%, embora em 12 meses tenham subido 6,76%. A média móvel trimestral
anualizada e dessazonalizada aponta um ritmo de 4,8%, com queda significada
ante os 5,8% em agosto. Os serviços sensíveis à mão de obra caíram na ponta,
evoluindo 0,33% no mês passado, ante 0,65% no anterior. Mas no acumulado em 12
meses ainda variaram 6,32%. A média dos 5 núcleos inflacionários recuou para
5,09%. O IPCA cheio teria variação próxima de zero em setembro se não fosse
pelo reajuste de 10,3% da energia elétrica (0,06%, segundo Luis Leal,
economista-chefe do G5 Partners).
Com um pouco de sorte é possível que os fatores favoráveis persistam por um tempo suficiente para derrubar mais rapidamente a inflação. A corrida eleitoral, que já começou, joga contra um cenário otimista. O presidente Lula, em campanha, não para de criar novos programas, apesar de ter dificuldades cada vez maiores para fechar as contas, ainda que com déficit primário. Quanto mais tempo os juros permanecerem no nível insustentável em que estão, maior será o preço a pagar em termos de crescimento menor e maior a dívida pública, que crescerá, só pelo efeito dos juros, mais de R$ 1 trilhão neste ano. A reeleição de Lula é o principal objetivo, em detrimento dos custos para isso.
O direito do Brasil de explorar petróleo
Por O Estado de S. Paulo
Licença para perfurar poço na Bacia de Foz do
Amazonas, leiloado em 2013, abre caminho para nova fronteira de petróleo no
País e traz realismo a debate da transição energética
A licença para perfuração de um poço na Bacia
de Foz do Amazonas, dada pelo Ibama à Petrobras às vésperas da COP-30, após 11
longos anos de idas e vindas do processo ambiental, não representa apenas a
chance de o País abrir uma nova fronteira exploratória de petróleo. A
proximidade da decisão com a Conferência Mundial do Clima, pela primeira vez
sediada no Brasil e às portas da Amazônia, no Pará, é a oportunidade de trazer
para o mundo real o debate sobre transição energética e como financiá-la.
Longe de significar uma “sabotagem à COP-30”
como alegam ambientalistas, que ameaçam judicializar a concessão da licença, a
decisão de perfurar em águas profundas na costa do Amapá, na Margem Equatorial,
está cercada de cuidados sem precedentes no País – e talvez no mundo. Tanto na
segurança preventiva quanto na mitigação de riscos em caso de acidente, as
inúmeras exigências ambientais foram acatadas.
A instalação do poço pioneiro será
milimetricamente monitorada, como deixou claro o Ibama nas 29 condicionantes
anexadas à concessão da licença. E ainda frisou que poderá modificar as medidas
de controle, caso considere adequado, ou mesmo suspender ou cancelar a licença
se julgar que algum critério foi violado. A inclusão de detalhes inéditos ao já
rigoroso processo de licenciamento ambiental não deixa dúvidas sobre a
diligência da atividade, distante 500 quilômetros da foz do Rio Amazonas.
Isso posto, é pertinente deduzir que os
protestos contra a exploração da Margem Equatorial não se resumem à preocupação
com o ecossistema da Amazônia – este guarnecido por inúmeros cuidados e
investimentos em proteção e preservação da fauna e flora –, mas sim à obstrução
de toda e qualquer atividade petrolífera. E aí está o cerne da questão: o
Brasil pode renunciar às riquezas naturais sem ao menos verificar a sua
dimensão? Que país abre mão da chance de impulsionar a economia com a
exploração de seus recursos?
A estimativa de que o Estado brasileiro pode
arrecadar em torno de R$ 1 trilhão a partir da produção de petróleo na região,
caso sejam confirmadas as reservas entre 6 bilhões e 30 bilhões de barris da
Margem Equatorial, não pode ser desprezada. Seria um erro brutal desistir de
investimentos com potencial de criação de centenas de milhares de empregos e de
arrecadação inaudita para as Regiões Norte e Nordeste, historicamente as mais
pobres do País.
A transição energética, compromisso assumido
mundialmente para conter o avanço do aquecimento global, levará décadas para
ser concluída. O mundo, ao contrário do que o radicalismo ambiental faz crer,
ainda não pode prescindir do petróleo como fonte de energia e como
matéria-prima para produtos tão diversos quanto plásticos, fertilizantes,
tintas, cosméticos, medicamentos, detergentes e asfalto. O que a indústria
petrolífera mundial busca hoje é diversificar suas fontes de energia e
minimizar a emissão de gases na produção e refino de petróleo. Em ambas as
frentes, o Brasil se destaca.
No ano passado, as emissões absolutas de
gases de efeito estufa das operações da Petrobras foram 40% inferiores ao
patamar de 2015, ano em que o Acordo de Paris (COP-21) estabeleceu metas para
limitar o aquecimento global. Já ultrapassou, portanto, a meta que era de
chegar a 2030 com 30% de emissões a menos. As emissões de metano foram
reduzidas em 70% e os campos do pré-sal estão entre os de mais baixa
intensidade de emissão de gases do mundo.
No que depender do mercado de petróleo, o
Brasil sediará a COP-30 sem motivo para constrangimentos. A decisão de
investigar o potencial do bloco de petróleo de Foz do Amazonas é soberana de um
país que usa mais fontes de energia renováveis do que o resto do mundo. De
acordo com dados da Empresa de Pesquisa Energética, somando lenha e carvão
vegetal, hidráulica, derivados de cana, eólica e solar e outras, nossas
renováveis totalizam 50%, enquanto na matriz energética mundial o porcentual
médio é de 14%. Petróleo e derivados ocupam 34% de nossa matriz, mas fazem
enorme diferença no desenvolvimento econômico.
O poder imperial dos cartórios
Por O Estado de S. Paulo
O STF não pode emascular o Marco das Garantias,
um dos maiores avanços que o Congresso legou ao País em termos de segurança
jurídica, só para atender ao poderoso lobby dos cartórios
Poucas coisas traduzem o anacronismo do
ambiente de negócios brasileiro como os cartórios. Em um mundo cujos avanços
tecnológicos permitem a assinatura de contratos por meio digital, os serviços
prestados por essas repartições caminham rapidamente para a irrelevância,
especialmente desde o Marco das Garantias, que reformulou regras sobre
garantias reais dadas em empréstimos e facilitou a retomada de bens por
credores em caso de inadimplência.
O marco, aprovado pelo Congresso no fim de
2023, foi um avanço na direção da segurança jurídica, da dinamização do
ambiente de negócios e do respeito aos contratos. Embora o projeto tenha sido
originalmente apresentado pela administração Jair Bolsonaro, o governo do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva abraçou a proposta com entusiasmo, a ponto
de o secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, Marcos Pinto,
ter anunciado que o problema do crédito com garantia no Brasil estava
resolvido.
A lei, no entanto, foi alvo de uma Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI) de autoria da União dos Oficiais de
Justiça do Brasil, que questionou o artigo que validava a retomada
extrajudicial de veículos pelos Departamentos Estaduais de Trânsito (Detrans).
Mas o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a constitucionalidade da
legislação.
A questão parecia pacificada, mas o relator,
ministro Dias Toffoli, mudou radicalmente de ideia três meses depois da
conclusão do julgamento – e tudo isso a partir da apresentação de embargos de
declaração pela Associação Nacional dos Oficiais de Justiça Avaliadores
Federais (Fenossojaf) e pela Associação Federal dos Oficiais de Justiça do
Brasil (Afojebra), que atuavam como parte interessada na ADI.
É singela a justificativa de Toffoli. “Após a
oposição dos presentes embargos de declaração, e depois de novo estudo e
reflexão sobre a matéria, evoluí em meu entendimento”, afirmou o ministro.
Segundo ele, o trecho da legislação referente aos Detrans cria uma “cisão no
sistema de execução extrajudicial de bens móveis” e “fragiliza a garantia dos
direitos constitucionais dos devedores”.
A divergência já havia sido exposta pelo
ministro Flávio Dino no julgamento da ADI. Se à época Toffoli a desconsiderou,
desta vez ele transcreveu trechos inteiros do voto de Dino para defender a
posição. Para ele, o artigo questionado pelos cartórios é, agora,
inconstitucional, pois cria um “sistema paralelo” de execução extrajudicial que
“não se sujeita à regulamentação e fiscalização do Poder Judiciário” – como se
os Detrans e as empresas por ele credenciadas não estivessem sujeitas às leis e
à Constituição.
Toffoli se refere a um regulamento do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que padronizou os procedimentos para
processos de busca e apreensão de bens móveis em agosto de 2023. A atribuição
exclusiva aos cartórios, segundo ele, garante “maior segurança jurídica na
aplicação desses institutos” e busca “evitar abusos por parte dos credores,
assegurar os direitos dos devedores e garantir a transparência e a
rastreabilidade das operações para uma fiscalização eficiente”.
A preocupação do ministro com os devedores só
não surpreendeu mais que seu conceito de segurança jurídica, que,
aparentemente, só existirá se estiver sob o olhar atento e a guarda de
cartórios fiscalizados pelo CNJ. Como disse a Associação Nacional das
Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), o modelo de
atuação dos Detrans, ao contrário do que os cartórios alegam, é “seguro,
fiscalizado e rastreável”.
Coube à Federação Brasileira dos Bancos
(Febraban) lembrar ao ministro que a principal salvaguarda dos direitos dos
devedores não reside na natureza do órgão que administra o processo
extrajudicial, mas na garantia constitucional de acionamento do Poder Judiciário
para coibir ilegalidades.
O ministro Gilmar Mendes, felizmente, pediu
vista e suspendeu o julgamento. Espera-se que ele e a maioria do STF não cedam
ao poderoso lobby dos cartórios. Afinal, a segurança jurídica e o direito dos
devedores não podem servir de pretexto para essas repartições manterem uma
valiosa reserva de mercado.
A ‘pax terrorista’ do Hamas
Por O Estado de S. Paulo
O grupo usa o cessar-fogo como uma trégua
tática, para se rearmar e consolidar o poder
O cessar-fogo em Gaza deveria marcar o início
da reconstrução. Em vez disso, expôs o que os simpatizantes do Hamas no
Ocidente relutam em ver: o velho regime de terror nunca acabou – e voltou com
força, à luz do dia.
Desde que as tropas israelenses começaram a
se retirar, terroristas armados tomaram as ruas, executando rivais, caçando
supostos colaboradores de Israel e impondo à população uma nova onda de
repressão. Em Gaza, a trégua com Israel significou apenas a guerra dentro de
casa.
O Hamas jamais teve a intenção de transformar
a pausa em um caminho para a paz. O grupo usa o cessar-fogo como uma trégua
tática, projetada para se rearmar e consolidar o poder. Enquanto o mundo
celebra a libertação dos reféns israelenses, os terroristas recolhem munições
não detonadas, transformam estilhaços em explosivos e retomam o controle das
rotas de ajuda humanitária. O regime que denuncia o bloqueio israelense à
entrada de alimentos é o mesmo que decide quem pode comer e quem deve morrer.
As execuções públicas de palestinos –
transmitidas com orgulho em canais ligados ao grupo – são a prova cabal de que
o Hamas não é um movimento de “resistência”, mas um poder mafioso. Em nome da
“ordem”, seus homens sequestram, torturam e matam. Em nome da “libertação”,
mantêm 2 milhões de pessoas sob terror permanente. A cada silêncio cúmplice do
Ocidente, o mito de uma “Gaza libertada” se torna mais grotesco.
A omissão de quem deveria agir para impedir a
carnificina promovida pelo Hamas é parte do escândalo. Governos árabes que se
dizem mediadores fecham os olhos à barbárie e financiam a reconstrução sem
exigir desarmamento. Militantes ocidentais, que até ontem denunciavam o
“genocídio” em Gaza, se calam diante das vítimas palestinas do Hamas. Essa
hipocrisia é mais do que moralmente repugnante: é politicamente destrutiva.
Alimenta a narrativa de que a tirania é preferível à derrota, e de que a
liberdade palestina só pode florescer entre ruínas.
Washington também tem sua parcela de culpa.
Ao insinuar, ainda que por um instante, que o Hamas poderia restaurar a ordem,
o presidente Donald Trump conferiu legitimidade a um poder homicida. Só depois
de reiteradas atrocidades a Casa Branca corrigiu o tom e exigiu o fim da
matança. Mas enquanto a segunda fase do plano de paz – desarmamento e
governança internacional – continuar no papel, o acordo corre o risco de se
tornar mais uma das miragens diplomáticas do Oriente Médio.
Não há saída sem um ato de coragem – e
coerção. Gaza precisa de uma força internacional de estabilização com mandato
real, capaz de desarmar o Hamas e garantir a segurança dos civis. Precisa de
uma autoridade de transição legítima, que integre palestinos que não tenham as
mãos manchadas de sangue. Sem isso, a trégua será só o interlúdio de uma guerra
pior.
A verdade é simples e dura: Gaza jamais será livre enquanto o Hamas for seu carcereiro. E se a comunidade internacional continuar a confundir solidariedade com conivência, Israel acabará sozinho – e, inevitavelmente, voltará a agir. Paz sem justiça para os palestinos e sem segurança para Israel não é paz. É só o disfarce momentâneo do terror.
O case AWS e o oligopólio das techs
Por Correio Braziliense
Vale lembrar como essas empresas têm
influenciado, também, a geopolítica. A aproximação das big techs com o governo
Trump deixa claro o tamanho alcançado por elas em nossa sociedade
O mundo iniciou a semana com instabilidades
em diversas aplicações influentes em nosso dia a dia. McDonald's, Mercado
Livre, Pinterest, Wellhub e a rede social Snapchat estiveram entre os diversos
serviços com problemas de acesso desde segunda-feira, quando o Amazon Web
Services (AWS) apresentou instabilidades. O AWS é uma plataforma de computação
em nuvem para uso de desenvolvedores de aplicativos e sites, com pagamento sob
demanda. A empresa é considerada líder do mercado de provedores, ao lado do Azure
(Microsoft) e do GCP (Google).
A instabilidade apresentada pelo AWS virou
notícia em todo o mundo, até porque influenciou o comportamento de usuários e
afetou o faturamento de diversas empresas, principalmente as ligadas ao
marketplace. Felizmente para esses desenvolvedores, os servidores apresentaram
melhora no funcionamento nas últimas horas.
No entanto, chama a atenção como o mundo
contemporâneo concentra poder em tão poucas empresas. No senso comum, há sempre
o temor por uma eventual crise bancária que leve ao confisco das poupanças.
Porém, o que acontece com as grandes empresas de tecnologia, as chamadas big
techs, não é tão diferente: somos, como sociedade, cada vez mais dependentes
dessas companhias.
O caso do AWS é emblemático, pois se trata de
um serviço pouco conhecido pelo cidadão médio, mas usado por ele, de maneira
indireta, em diversas requisições a aplicativos diferentes. Por exemplo, ao
pedir um carro de aplicativo para lhe transportar entre sua casa e o trabalho,
você, caro leitor, provavelmente dependerá do AWS ou de um serviço semelhante
de computação em nuvem.
O que a instabilidade noticiada mostra é que
as big techs são, cada vez mais, instituições com poder de influência e com
faturamento semelhante a muitos países. A receita bruta da Alphabet, empresa
que administra o Google, foi comparável ao PIB do Chile em 2023, segundo dados
divulgados pelo Núcleo Jornalismo.
Vale lembrar como essas empresas têm
influenciado, também, a geopolítica. A aproximação das big techs com o governo
Trump deixa claro o tamanho alcançado por elas em nossa sociedade. Desde Elon
Musk, como homem forte da Casa Branca, até Mark Zuckerberg colocando fim às
ferramentas de checagem de informações nas redes sociais da Meta, não há
dúvidas sobre o espaço ocupado por esses atores na maior economia do planeta.
Mas a influência das big techs não se resume
somente aos seus líderes. Como mostrou série de reportagens da Agência Pública
em setembro, essas empresas foram protagonistas no engavetamento do Projeto de
Lei 2630/2020, conhecido como PL das Fake News. A investigação mostra que 683
ações de lobby dessas companhias aconteceram somente em 2023, quando a votação
do texto esteve mais próxima. Esse dado, inclusive, pode ser até maior, já que
o Senado Federal não libera o acesso a essas informações, somente a Câmara.
A mesma reportagem da Pública deixa claro a
aproximação das big techs com o Centrão e a direita brasileira. Essas empresas
encontraram nos políticos mais conservadores a plataforma ideal para proteger
seus interesses, usando a favor um eventual cerceamento da liberdade de
expressão. Um assunto em comum para agradar ambos interessados em cafezinhos,
almoços e drinques informais nos corredores do Congresso e nos gabinetes de
Brasília.
Diante das peças colocadas no tabuleiro, é hora da democracia brasileira demonstrar sua força, mesmo diante de empresas com tanto poder — político e econômico — nas mãos. Se pela via Legislativa o necessário debate sobre esse oligopólio parece distante de acontecer, que o Supremo Tribunal Federal (STF) tome as rédeas da discussão. Claro, com toda parcimônia e comunicação clara que o assunto merece.
A polêmica da Margem Equatorial
Por O Povo (CE)
A descoberta de petróleo na Margem Equatorial
pode ser uma grande oportunidade ou uma grande frustração, dependendo de como
essa riqueza será distribuída
Às vésperas da COP30, após cinco anos de
estudo, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama) autorizou a Petrobras a perfurar um poço exploratório para
verificar a viabilidade econômica da extração de petróleo na Margem Equatorial.
O anúncio do Ibama reavivou uma polêmica que
sempre esteve presente desde que o assunto entrou em pauta.
De um lado, aqueles que se manifestam contra
a exploração, argumentando que os prejuízos ao meio ambiente superam os
possíveis resultados econômicos que serão obtidos com a atividade. Eles afirmam
que insistir no uso do combustível fóssil contribui para o aquecimento global e
contraria a transição energética, assuntos que preocupam governantes em todo o
mundo. Citam ainda o risco para a biodiversidade marinha — e os danos
irreparáveis que poderiam causar um vazamento acidental.
De outra parte, os que se alinham à
perfuração de novos poços, asseguram que todas as medidas de proteção à
natureza foram tomadas, apontando que a própria transição necessita do uso do
petróleo, produto que o Brasil terá de importar a partir de 2030 se não abrir
novas reservas.
Defendem ainda que os ganhos com a
comercialização do petróleo serão um fator de desenvolvimento regional,
principalmente para estados das regiões Norte e Nordeste.
A ministra do Meio Ambiente (MMA), Marina
Silva, afirmou que a competência para avaliar tecnicamente o licenciamento é
responsabilidade do Ibama. Em nota, o MMA afirmou que a operação deve seguir
"os mais rigorosos critérios técnicos, científicos e ambientais",
garantindo "o respeito" aos povos e comunidades da região do
empreendimento. Ou seja, a ministra não se opôs publicamente à autorização do
Ibama.
O tempo que o instituto demorou para preparar
seu relatório, as exigências adicionais que fez à Petrobras para conceder o
licenciamento, e o fato de ter divulgado sua decisão em um momento delicado, no
período da COP30, demonstram que, caso o órgão tenha sofrido alguma
pressão, elas não surtiram efeito.
Mas, no momento em que se volta a falar em
"fundo soberano" para destinar recursos do petróleo à educação, saúde
e preservação ambiental, é preciso lembrar que as mesmas promessas foram feitas
quando da descoberta do pré-sal. O fundo, até hoje existente, foi desvirtuado,
com a ampliação dos segmentos em que os recursos podem ser aplicados.
A descoberta de petróleo na Margem
Equatorial, pode ser uma grande oportunidade ou uma grande frustração,
dependendo de como essa riqueza será distribuída.
Há o adendo que o debate vai continuar, pois
a perfuração autorizada é um teste para verificar a quantidade de petróleo
explorável. No mais, é admitir a existência de argumentos fortes de parte a
parte.
Que prevaleça o que for melhor para o Brasil.
Nenhum comentário:
Postar um comentário