Valor Econômico
Caixa reforçado aumenta cacife de chefes regionais em 2026
Não é produto de política pura e muito menos
uma coincidência o fato de todas as alternativas presidenciáveis à família
Bolsonaro serem de governadores. Cinco de uma vez (Tarcísio de Freitas, Romeu
Zema, Ratinho Júnior, Ronaldo Caiado e Eduardo Leite) é algo nunca visto na
relativamente curta história democrática brasileira, e tanto entusiasmo em
relação a esta turma se explica pela maré favorável generalizada na opinião
pública, manifestada em pesquisas de avaliação de governo. A raiz dessa bonança
é fiscal, como se tentará explicar nesta coluna.
Consistentemente os governadores têm desempenho melhor que o presidente nestes levantamentos, fenômeno que não é restrito aos que sonham com o Planalto. São raros governantes estaduais que contam com menos de 50% de aprovação em seus Estados. Nos dez Estados onde houve levantamentos recentes feitos pela Quaest ou pela Atlas Intel não há nenhum abaixo desse limiar, seja de direita ou esquerda, do norte ou do sul.
Essa circunstância dá aos governantes enorme
força política, tanto em caso de reeleição quanto, nesta hipótese com menor
ênfase, no de articular a eleição de um sucessor. Esta correlação direta entre
aprovação alta e força política é calculada há muito tempo por empresas de
análise política e é famosa a tabela da Ipsos Public Affairs.
A Ipsos tem um banco de dados com o resultado
de mil eleições majoritárias em diversos níveis, realizadas em 35 países desde
1948, para as quais existiam pesquisas confiáveis disponíveis a uma distância
de pelo menos seis meses do pleito.
Governantes com taxa de aprovação antes da
campanha de 50% venceram uma reeleição em 90% dos casos. Com uma taxa de
aprovação menor, na faixa de 40%, a vitória do incumbente ocorreu em 55% das
ocasiões. O sarrafo é consideravelmente mais alto quando se trata de eleger um
sucessor: a continuidade foi garantida quando a aprovação do governante
ultrapassou 60%.
O modelo desconsidera pesquisas realizadas
durante a campanha, porque são contaminadas pela própria dinâmica da disputa
eleitoral. Em um contexto de propaganda das diversas candidaturas, a avaliação
de um postulante incumbente sempre sobe ao longo da corrida. Nas pesquisas
feitas a uma distância de seis meses a um ano das eleições se têm uma
fotografia do momento da largada. E a imagem inicial, construída no momento
pré-campanha, muitas vezes é a que fica.
De acordo com o americano Clifford Young, líder
global de pesquisas eleitorais e políticas da Ipsos, essa tabela
não diz respeito apenas ao que já aconteceu, mas também é preditiva: em 85% dos
casos, a tradição se reafirma. “Não é uma certeza, mas para quem vai jogar em
um cassino, esse nível de acerto do modelo é mais do que animador”, brinca.
Falando sério, o próprio Young pede cautela no uso da ferramenta: “todos no
Brasil vão pensar no caso do Lula, mas o caso dele é diferenciado, porque na
realidade se trata da segunda tentativa da reeleição, ele já está no fim de um
terceiro mandato. É uma situação muito peculiar”.
Em relação aos governadores, a questão é
porque todos eles têm avaliação alta. E um levantamento com dados do Tesouro
Nacional, tratados pelo Observatório de Política Fiscal do FGV IBRE, ajuda a
entender o motivo. A atual safra de governantes está investindo muito mais do
que seus antecessores imediatos. Desde 2021 o gasto com investimentos se eleva,
depois de uma retração entre 2015 e 2020. Voltou-se a um nível de gasto
observado na safra dos eleitos entre 2006 e 2014.
Segundo o coordenador do Centro de Política
Fiscal, Manoel Pires, há um conjunto de fatores que explica o fenômeno. Um dos
mais fortes é a ajuda que os atuais governantes receberam do próprio governo
federal. Não só da atual administração, de Lula, como da anterior, de
Bolsonaro. “Houve um aumento grande de transferências para Estados e
municípios, suspensão de pagamento da dívida no governo passado e renegociação
no governo atual, em um processo que deve ganhar intensidade com o Propag”,
afirma.
Outro fator lembrado por Pires foi o aumento
de operações de crédito e o movimento defensivo dos governadores em se
antecipar aos efeitos da reforma tributária, aumentando onde foi possível as
alíquotas do ICMS. “Houve um aumento de disponibilidade de caixa, com o
incremento de receitas se concentrando em investimento. Não houve muita
expansão de gasto com pessoal”, diz.
O contraste se torna evidente com as amarras
do governo federal, manietado pelo Congresso Nacional pela impositividade
crescente do Orçamento e pela sustentabilidade de sua dívida.
Essa conjuntura favorável aos governadores só
foi freada nas eleições de 2022 pela polarização extremada, segundo o
governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB). Ele lembra que tinha 80%
de aprovação popular no fim de seu primeiro mandato, mas não conseguiu se
reeleger no primeiro turno e venceu por pouco na rodada decisiva. A polarização
nacional, segundo ele, tirou o peso dos fatores locais.
“No ano que vem essas polarização será um
pouco menor com Bolsonaro preso, sem poder participar diretamente das eleições.
A aprovação de gestão vai pesar um pouco mais e isso fortalece os governadores
de modo geral”, afirmou o capixaba. A disjuntiva estabelecida por Casagrande é
outra explicação para o protagonismo dos governadores, que vicejou com mais
força à direita do que à esquerda.
Mesmo que a família Bolsonaro se faça representar nas urnas, com o primogênito Flávio, dificilmente seu desempenho será comparável no primeiro turno ao do pai em 2018 e 2022. Aumenta a chance das disputas locais se descolarem mais da sucessão presidencial.

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