Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Na pressa de reagir ao corte na farra da contratação de parentes imposto pelo Supremo Tribunal Federal, muita gente no Congresso se esqueceu de pôr a máscara da compostura antes de abrir a boca.
Resultado: começou a circular principalmente na Câmara a idéia de um projeto de lei para a instituição de um nepotismo mitigado, mediante o qual havia uma cota reservada à contratação de parentes em cargos de confiança nos três Poderes.
Parece brincadeira, fruto de um devaneio qualquer, mas trata-se da insolência - para não falar em descaramento - de sempre.
O Congresso se faz de morto, não toma nenhuma providência que signifique a subtração de “direitos adquiridos” sobre deformações velhas de guerra e, quando o Judiciário atua nesse vácuo, corre para ver se salva um pedaço das mazelas.
Nos últimos tempos isso tem sido recorrente: a Justiça põe e o Legislativo dispõe o que é possível.
No caso do nepotismo, no entanto, a ousadia ultrapassou qualquer limite. Tanto que muitos falaram, mas poucos tiveram coragem de assinar embaixo da proposta de cotas.
Desse grupo restrito faz parte o deputado José Carlos Aleluia, ex-líder do DEM. Defende cotas pequenas, talvez até de um parente só. “Não se pode nomear a família toda”, pondera.
Aleluia acha a nova norma muito rigorosa. “Em cidades pequenas, por exemplo, são quase todos parentes uns dos outros”, argumenta. Não seja por isso, submetam-se a concursos.
Seja um ou um milhão, o parente fere o princípio da impessoalidade estabelecido para a administração pública na Constituição e quebra o preceito da igualdade uma vez que não considera o mérito profissional como regra acima de todas as outras.
Se o instrumento das cotas já é questionável em alguns setores como garantia para a inclusão de minorias, o que dizer da aplicação do conceito à parentela de agentes públicos com acesso ao robusto naco de postos a serem preenchidos pelo critério único do arbítrio?
A prosperar tal entulho, familiares de poderosos deverão ser vistos como pessoas portadoras de necessidades especiais. No caso, necessidade de levar vantagem sempre que possível, de preferência com o dinheiro dos outros.
A boa notícia é que os presidentes da Câmara e do Senado não aceitaram abrir o debate a respeito da decisão do Supremo. O senador Garibaldi Alves mandou saber quem são os parentes a serem demitidos e começou pelo próprio sobrinho que, a rigor, nem deveria ter sido empregado na Casa.
O deputado Arlindo Chinaglia aplaudiu a decisão do STF e avisou que não põe em votação projetos para mitigar o nepotismo. “Será um erro político dramático”, avalia.
Queira o bom senso que o passar do tempo, a saída do assunto do noticiário e as necessidades decorrentes da disputa pelas presidências da Câmara e do Senado daqui a seis meses não alterem posições.
De Minas
O juiz Marcos Flávio Lucas, do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, não entende que o governador Aécio Neves infrinja a lei quando aparece no horário gratuito de televisão do candidato da coligação PSB-PT, da qual o PSDB não faz parte.
Dessa forma, o prefeito petista de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, não seria avalista de uma ilegalidade por aparecer ao lado de Aécio no mesmo programa.
Para o juiz, não havendo candidato tucano no páreo, Aécio Neves está livre para participar.
Elegante, o governador envia mensagem para contestar análise em artigo de quinta-feira sobre o tema, sem tentar se escorar na decisão judicial.
Diz Aécio Neves: “O impedimento a que você se referiu objetiva coibir a infidelidade partidária. Penso que você se equivocou na análise sobre minha participação no programa de TV do candidato Márcio Lacerda. Tenho participado ativa, e publicamente, da campanha por estar convicto de que ajo dentro da legalidade. O apoio à candidatura foi aprovado em convenção municipal do PSDB, que não integra qualquer coligação na capital. Jamais o faria se houvesse impedimento da lei”.
Tanto o juiz quanto o governador traduzem com liberalidade o artigo 54 da lei eleitoral, que diz o seguinte: “Dos programas destinados à propaganda eleitoral gratuita poderá participar qualquer cidadão não filiado a outra agremiação partidária ou a partido de outra coligação”.
O governador é filiado a uma agremiação partidária e esta não faz parte da coligação. Aécio escolheu Márcio Lacerda e não quis formalizar a aliança para fugir aos efeitos legais do já esperado veto do PT nacional.
Mas sobrou artigo 54, que exclui os integrantes de um partido do rol dos legalmente credenciados a aparecer no horário reservado a outra legenda ou coligação.
Não proíbe o governador de apoiar quem quiser. Apenas não o autoriza a fazê-lo no programa gratuito de televisão.
Fosse tão liberal a legislação, a formalidade seria um dado secundário na construção de alianças eleitorais.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Na pressa de reagir ao corte na farra da contratação de parentes imposto pelo Supremo Tribunal Federal, muita gente no Congresso se esqueceu de pôr a máscara da compostura antes de abrir a boca.
Resultado: começou a circular principalmente na Câmara a idéia de um projeto de lei para a instituição de um nepotismo mitigado, mediante o qual havia uma cota reservada à contratação de parentes em cargos de confiança nos três Poderes.
Parece brincadeira, fruto de um devaneio qualquer, mas trata-se da insolência - para não falar em descaramento - de sempre.
O Congresso se faz de morto, não toma nenhuma providência que signifique a subtração de “direitos adquiridos” sobre deformações velhas de guerra e, quando o Judiciário atua nesse vácuo, corre para ver se salva um pedaço das mazelas.
Nos últimos tempos isso tem sido recorrente: a Justiça põe e o Legislativo dispõe o que é possível.
No caso do nepotismo, no entanto, a ousadia ultrapassou qualquer limite. Tanto que muitos falaram, mas poucos tiveram coragem de assinar embaixo da proposta de cotas.
Desse grupo restrito faz parte o deputado José Carlos Aleluia, ex-líder do DEM. Defende cotas pequenas, talvez até de um parente só. “Não se pode nomear a família toda”, pondera.
Aleluia acha a nova norma muito rigorosa. “Em cidades pequenas, por exemplo, são quase todos parentes uns dos outros”, argumenta. Não seja por isso, submetam-se a concursos.
Seja um ou um milhão, o parente fere o princípio da impessoalidade estabelecido para a administração pública na Constituição e quebra o preceito da igualdade uma vez que não considera o mérito profissional como regra acima de todas as outras.
Se o instrumento das cotas já é questionável em alguns setores como garantia para a inclusão de minorias, o que dizer da aplicação do conceito à parentela de agentes públicos com acesso ao robusto naco de postos a serem preenchidos pelo critério único do arbítrio?
A prosperar tal entulho, familiares de poderosos deverão ser vistos como pessoas portadoras de necessidades especiais. No caso, necessidade de levar vantagem sempre que possível, de preferência com o dinheiro dos outros.
A boa notícia é que os presidentes da Câmara e do Senado não aceitaram abrir o debate a respeito da decisão do Supremo. O senador Garibaldi Alves mandou saber quem são os parentes a serem demitidos e começou pelo próprio sobrinho que, a rigor, nem deveria ter sido empregado na Casa.
O deputado Arlindo Chinaglia aplaudiu a decisão do STF e avisou que não põe em votação projetos para mitigar o nepotismo. “Será um erro político dramático”, avalia.
Queira o bom senso que o passar do tempo, a saída do assunto do noticiário e as necessidades decorrentes da disputa pelas presidências da Câmara e do Senado daqui a seis meses não alterem posições.
De Minas
O juiz Marcos Flávio Lucas, do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, não entende que o governador Aécio Neves infrinja a lei quando aparece no horário gratuito de televisão do candidato da coligação PSB-PT, da qual o PSDB não faz parte.
Dessa forma, o prefeito petista de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, não seria avalista de uma ilegalidade por aparecer ao lado de Aécio no mesmo programa.
Para o juiz, não havendo candidato tucano no páreo, Aécio Neves está livre para participar.
Elegante, o governador envia mensagem para contestar análise em artigo de quinta-feira sobre o tema, sem tentar se escorar na decisão judicial.
Diz Aécio Neves: “O impedimento a que você se referiu objetiva coibir a infidelidade partidária. Penso que você se equivocou na análise sobre minha participação no programa de TV do candidato Márcio Lacerda. Tenho participado ativa, e publicamente, da campanha por estar convicto de que ajo dentro da legalidade. O apoio à candidatura foi aprovado em convenção municipal do PSDB, que não integra qualquer coligação na capital. Jamais o faria se houvesse impedimento da lei”.
Tanto o juiz quanto o governador traduzem com liberalidade o artigo 54 da lei eleitoral, que diz o seguinte: “Dos programas destinados à propaganda eleitoral gratuita poderá participar qualquer cidadão não filiado a outra agremiação partidária ou a partido de outra coligação”.
O governador é filiado a uma agremiação partidária e esta não faz parte da coligação. Aécio escolheu Márcio Lacerda e não quis formalizar a aliança para fugir aos efeitos legais do já esperado veto do PT nacional.
Mas sobrou artigo 54, que exclui os integrantes de um partido do rol dos legalmente credenciados a aparecer no horário reservado a outra legenda ou coligação.
Não proíbe o governador de apoiar quem quiser. Apenas não o autoriza a fazê-lo no programa gratuito de televisão.
Fosse tão liberal a legislação, a formalidade seria um dado secundário na construção de alianças eleitorais.
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