Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO
O deputado Ciro Nogueira (PP-PI) disputa pela segunda vez a presidência da Câmara, sem conseguir se livrar do estigma de "novo Severino Cavalcanti" ou simplesmente de "candidato do baixo clero". É algo que o incomoda, mas que usa habilmente a seu favor. À exceção de meia dúzia de líderes partidários, a grande maioria dos deputados pode hoje ser classificada nessa categoria.
Antes de se dizer vítima de preconceito, como se tornou usual no governo, Ciro prefere o ataque: "É uma cortina de fumaça. É como se baixo clero fosse aquele deputado que luta para liberar emenda parlamentar e levar benefícios para sua cidade" - ironiza - , enquanto "o alto clero é aquela meia dúzia que fica discutindo grandes temas mas o que quer mesmo é nomear o diretor financeiro de estatais".
"Não sei qual é o benefício que uma pessoa pode levar para seu Estado nomeando o diretor financeiro de uma empresa estatal", questiona o deputado.
Aos 40 anos, Ciro exerce o quarto mandato consecutivo na Câmara dos Deputados, é advogado e já ocupou alguns dos principais cargos da Mesa. Não nega a amizade com Severino, 70 anos. Mas adverte que são políticos de gerações diferentes e pede para ser julgado por seus próprios atos.
Ciro é a encarnação de uma maioria que é pouco ou quase nunca ouvida, uma espécie de maioria silenciosa que decide quando se move na mesma direção. Mas o fato é que suas chances dependem de um desacerto na aliança PT-PMDB.
Se o PMDB fizer o presidente do Senado, o comportamento do PT na Câmara em relação ao candidato do acordo, o pemedebista Michel Temer (SP), passa a ser uma incógnita. E não será surpresa se boa parte da bancada petista decidir despejar votos em Aldo Rebelo (PCdoB-SP), candidato historicamente mais próximo do PT que Ciro Nogueira e Michel Temer.
Ciro conhece bem os termos dessa disputa e explora com habilidade o fosso que se criou na Câmara entre "baixo" e "alto" cleros. Não é um novo Severino, mas a nova face da massa que não costuma aparecer na lista da elite parlamentar.
Ciro assegura que não tem uma única indicação para cargos públicos, federal, estadual ou municipal. Acha legítimo o partido do presidente da Câmara, no seu caso, o PP, indicar nomes para o ministério. Mas não acha correto que o presidente da Câmara se transforme no corretor dos cargos do partido - coisa que acredita ter virado rotina nos últimos anos.
"A figura do presidente tem de ser preservada desta situação", diz. "Eu não vejo como o presidente da Câmara, na primeira conversa que for ter com o presidente da República, na primeira meia hora tratar do limite na edição de medida provisória, e na segunda meia hora tratar da nomeação do diretor financeiro de Furnas ou da Caixa Econômica Federal".
Segundo Ciro, o presidente da Câmara acabou se transformando numa espécie de "superlíder" partidário. Se o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) indicasse alguém para um cargo no governo, exemplifica, isso seria um escândalo. Mas "não causam mais surpresa à sociedade" iniciativas iguais dos presidentes da Câmara e do Senado.
A tramitação da emenda que prorrogava a CPMF, em 2007, por exemplo, Ciro acha que se tornou uma "matéria emblemática" - o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) "segurou" o projeto até conseguir uma nomeação que reivindicava para Furnas Centrais Elétricas. "Foi um absurdo, e o que é pior, um negócio muito claro. Perdeu-se o pudor naquela ocasião. São situações como essas que eu acho que não podem ocorrer".
O que ocorreu, segundo o candidato do PP, "foi uma cumplicidade do líder do PMDB e do presidente da Casa com aquela situação". Diz que a Comissão de Constituição e Justiça se transformou num feudo (do PMDB do Rio) e o que o presidente da Casa pode e deve intervir para evitar esse tipo de situação.
O candidato Ciro diz que o presidente da Câmara não tem lado. E que a instância máxima de decisão, se for eleito, será sempre o plenário - ou seja, todos os projetos irão a voto, independentemente do que pensam o presidente, governo e grupos de pressão.
Ciro só não diz como vai contornar a pressão de seu próprio partido, que levou o Ministério das Cidades quando Severino foi eleito na Câmara. Mas isso é algo que só a prática vai dizer. Se ele for eleito e tiver oportunidade de fazer o que diz.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
DEU NO VALOR ECONÔMICO
O deputado Ciro Nogueira (PP-PI) disputa pela segunda vez a presidência da Câmara, sem conseguir se livrar do estigma de "novo Severino Cavalcanti" ou simplesmente de "candidato do baixo clero". É algo que o incomoda, mas que usa habilmente a seu favor. À exceção de meia dúzia de líderes partidários, a grande maioria dos deputados pode hoje ser classificada nessa categoria.
Antes de se dizer vítima de preconceito, como se tornou usual no governo, Ciro prefere o ataque: "É uma cortina de fumaça. É como se baixo clero fosse aquele deputado que luta para liberar emenda parlamentar e levar benefícios para sua cidade" - ironiza - , enquanto "o alto clero é aquela meia dúzia que fica discutindo grandes temas mas o que quer mesmo é nomear o diretor financeiro de estatais".
"Não sei qual é o benefício que uma pessoa pode levar para seu Estado nomeando o diretor financeiro de uma empresa estatal", questiona o deputado.
Aos 40 anos, Ciro exerce o quarto mandato consecutivo na Câmara dos Deputados, é advogado e já ocupou alguns dos principais cargos da Mesa. Não nega a amizade com Severino, 70 anos. Mas adverte que são políticos de gerações diferentes e pede para ser julgado por seus próprios atos.
Ciro é a encarnação de uma maioria que é pouco ou quase nunca ouvida, uma espécie de maioria silenciosa que decide quando se move na mesma direção. Mas o fato é que suas chances dependem de um desacerto na aliança PT-PMDB.
Se o PMDB fizer o presidente do Senado, o comportamento do PT na Câmara em relação ao candidato do acordo, o pemedebista Michel Temer (SP), passa a ser uma incógnita. E não será surpresa se boa parte da bancada petista decidir despejar votos em Aldo Rebelo (PCdoB-SP), candidato historicamente mais próximo do PT que Ciro Nogueira e Michel Temer.
Ciro conhece bem os termos dessa disputa e explora com habilidade o fosso que se criou na Câmara entre "baixo" e "alto" cleros. Não é um novo Severino, mas a nova face da massa que não costuma aparecer na lista da elite parlamentar.
Ciro assegura que não tem uma única indicação para cargos públicos, federal, estadual ou municipal. Acha legítimo o partido do presidente da Câmara, no seu caso, o PP, indicar nomes para o ministério. Mas não acha correto que o presidente da Câmara se transforme no corretor dos cargos do partido - coisa que acredita ter virado rotina nos últimos anos.
"A figura do presidente tem de ser preservada desta situação", diz. "Eu não vejo como o presidente da Câmara, na primeira conversa que for ter com o presidente da República, na primeira meia hora tratar do limite na edição de medida provisória, e na segunda meia hora tratar da nomeação do diretor financeiro de Furnas ou da Caixa Econômica Federal".
Segundo Ciro, o presidente da Câmara acabou se transformando numa espécie de "superlíder" partidário. Se o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) indicasse alguém para um cargo no governo, exemplifica, isso seria um escândalo. Mas "não causam mais surpresa à sociedade" iniciativas iguais dos presidentes da Câmara e do Senado.
A tramitação da emenda que prorrogava a CPMF, em 2007, por exemplo, Ciro acha que se tornou uma "matéria emblemática" - o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) "segurou" o projeto até conseguir uma nomeação que reivindicava para Furnas Centrais Elétricas. "Foi um absurdo, e o que é pior, um negócio muito claro. Perdeu-se o pudor naquela ocasião. São situações como essas que eu acho que não podem ocorrer".
O que ocorreu, segundo o candidato do PP, "foi uma cumplicidade do líder do PMDB e do presidente da Casa com aquela situação". Diz que a Comissão de Constituição e Justiça se transformou num feudo (do PMDB do Rio) e o que o presidente da Casa pode e deve intervir para evitar esse tipo de situação.
O candidato Ciro diz que o presidente da Câmara não tem lado. E que a instância máxima de decisão, se for eleito, será sempre o plenário - ou seja, todos os projetos irão a voto, independentemente do que pensam o presidente, governo e grupos de pressão.
Ciro só não diz como vai contornar a pressão de seu próprio partido, que levou o Ministério das Cidades quando Severino foi eleito na Câmara. Mas isso é algo que só a prática vai dizer. Se ele for eleito e tiver oportunidade de fazer o que diz.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
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