domingo, 12 de abril de 2009

Governo não investe no ritmo em que fala

Regina Alvarez Brasília
DEU EM O GLOBO

Apesar do discurso oficial de que é preciso investir mais devido à crise econômica, o governo federal teve um desempenho tímido no primeiro trimestre: de R$ 48 bilhões previstos para investimento no Orçamento de 2009, R$ 259 milhões (0,7%) foram gastos. Apenas se incluídos os restos a pagar, chega-se a R$ 3,6 bilhões (7,5%), valor semelhante ao gastos em igual período de 2008

Descompasso de cifras e palavras

Discurso de Lula pregando investimento contra a crise esbarra na baixa execução orçamentária

Aexecução orçamentária no primeiro trimestre de 2009 não reflete o discurso do governo de que aumentaria os investimentos para fazer frente à crise global e estimular o crescimento da economia. No primeiro trimestre do ano, esses gastos foram de apenas R$ 3,674 bilhões, 7,5% do total previsto para 2009 — R$ 48,8 bilhões.

A conta já considera a execução de despesas de exercícios anteriores, os chamados restos a pagar.

Se consideradas apenas as despesas do ano, a execução é de R$ 359 milhões (0,7%) da dotação total.

Os gastos nos primeiros três meses de 2009 — incluindo os restos a pagar — estão no mesmo patamar de igual período de 2008, quando não havia crise econômica e o Orçamento nem havia sido aprovado pelo Congresso, o que dificultava a execução das despesas. Entre janeiro e março do ano passado, foram gastos R$ 3,261 bilhões, 6,9% do total de despesas previstas para o ano.

A urgência em concluir as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) nos prazos e a crise econômica aguda exigem uma aceleração no ritmo de execução dessas despesas, o que foi prometido para 2009, mas, até agora, não aconteceu na prática. O próprio presidente Lula fez uma cobrança enfática de celeridade e agilidade na execução das obras do PAC, em reunião com ministros, sexta-feira.

No final de janeiro, o governo fez um bloqueio preventivo de recursos do Orçamento para ter uma avaliação mais precisa do comportamento da arrecadação, mas os recursos para obras do PAC e outros setores considerados prioritários não foram retidos. Esse bloqueio é apontado pela Secretaria de Orçamento Federal, do Ministério do Planejamento, como um dos fatores que justificam o atual nível de execução dos investimentos.

“Só a partir do dia 27 de março, quando foi editado o decreto de programação orçamentária e financeira, com os limites de custeio e investimento para o ano de 2009, é que os órgãos puderam efetivamente iniciar a execução de seu orçamento de investimento”, argumentou a secretaria, por meio da assessoria. O Planejamento pondera também que, como nos anos anteriores, a execução do orçamento de investimentos se concentra mais no segundo semestre, uma vez que, no início do ano, estão sendo executados os restos a pagar do exercício anterior.

Nos Transportes, só 8,5% foram gastos

Mas o Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) mostra que mesmo as áreas não atingidas pelo bloqueio de janeiro têm execução de gastos com investimentos muito baixa no primeiro trimestre.

No Ministério dos Transportes, por exemplo, onde está a maioria das obras do PAC financiadas com recursos do Orçamento Geral da União (OGU), foram executados no período apenas R$ 904,2 milhões, 8,5% do total de recursos previstos para investimentos da pasta em 2009: R$ 10,542 bilhões. Essa conta já considera os restos a pagar, que são a maior parte e chegaram a R$ 784,8 milhões.

O Ministério dos Transportes esclareceu, por meio de sua assessoria, que seus dados indicam o que pagou até março R$ 1,071 bilhão. E que, se forem considerados os pagamentos até 7 de abril, esse montante alcança R$ 1.308,8 bilhão. O ministério alegou também que a execução nos primeiros três meses de 2009 segue uma tendência observada nos anos de 2007 e 2008, quando, devido à extensão do período de chuvas foi registrado um fluxo menor nas medições das obras: “A expectativa do Ministério dos Transportes é que tal fluxo seja recuperado já a partir de maio, com o período de estiagem”.

E acrescentou ainda que, tradicionalmente, 40% dos pagamentos do Ministério dos Transportes tendem a ocorrer no último quadrimestre de cada ano, “quando as obras alcançam um fluxo de execução mais acelerado e são superadas as circunstâncias climáticas”.

— O problema hoje não é falta de dinheiro. É de gestão. Mesmo querendo acelerar os investimentos, o governo não consegue — afirma o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas.

Velloso considera que a burocracia estatal continua dificultando os investimentos, mesmo com uma disponibilidade maior de recursos, e aponta outros entraves que contribuem para a baixa execução orçamentária nesta área. Para ele, o Tribunal de Contas da União (TCU ) estaria assumindo um papel do Executivo, dado o nível de ingerência nas obras e projetos em andamento. E também um excesso de exigências do Ministério do Meio Ambiente para a liberação das obras.

— Se quiser acelerar os investimentos, o governo precisa trabalhar para simplificar esses procedimentos — afirma Velloso.

Considerado uma área chave para fazer frente à crise econômica, por ser responsável pelas obras de habitação e saneamento do governo federal, o Ministério das Cidades executou apenas 4,6% dos investimentos no primeiro trimestre de 2009.

Foram R$ 410,7 milhões, considerando as despesas do ano e os restos a pagar. O orçamento da pasta para 2009 chega a R$ 8,884 bilhões.

No caso do Ministério da Integração Nacional, que também executa obras do PAC, os gastos com investimentos foram de apenas 2,4% do total previsto para o ano, considerando gastos de 2009 e despesas de outros anos pagas no primeiro trimestre. Os gastos foram de R$ 124 milhões para um Orçamento de R$ 5,164 bilhões.

Na área social, a execução de investimentos também foi muito baixa nos primeiro três meses do ano. O Ministério da Educação gastou apenas 8,2% da dotação total. Foram R$ 412,5 milhões de um Orçamento de R$ 5,023 bilhões. No Ministério da Saúde, foram gastos 9% do total de investimentos previstos para o ano — R$ 321,3 milhões de R$ 3,571 bilhões.

O melhor desempenho na área foi do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, que executou R$ 44 milhões em investimentos, 17,2 % dos gastos previstos para o ano e restos a pagar.

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