DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Segundo ex-embaixador, radicalização teria objetivo de marcar a diferença entre a conduta do Itamaraty no governo Lula e a da era FHC
Denise Chrispim Marin, BRASÍLIA
Na reta final do mandato e diante da missão de eleger sua sucessora, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu uma guinada mais à esquerda em sua política externa. O contorno partidário - petista, obviamente - tornou-se inconfundível, assim como o uso de questões diplomáticas para fazer propaganda sobre a inserção internacional do Brasil e uma liderança que o atual governo teria conquistado. Observada ao longo dos últimos dez meses pelo embaixador Rubens Ricupero, essa radicalização de perfil teria o claro objetivo de, em tempos eleitorais e de fim de governo, marcar a diferença entre a política externa de Lula e a adotada nos oito anos da administração de Fernando Henrique Cardoso.
"O governo está moldando o perfil com o qual quer entrar para a História. A política exterior tornou-se mais identificada ao governo e também a seu partido, o PT. Não está mais identificada ao Estado", afirmou Ricupero ao Estado.
Em um balanço preliminar da política exterior do governo Lula, Ricupero lembrou-se de uma emblemática declaração de Tancredo Neves (1910-1985), presidente da República eleito em 1984. "Se há um ponto na política brasileira que encontrou um consenso de todas as correntes de pensamento, esse ponto é exatamente a política externa levada a efeito pelo Itamaraty", afirmara Tancredo. "Esse consenso não existe mais", completou Ricupero.
Atual diretor da Faculdade de Economia da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP) e presidente do Instituto Fernand Braudel, Ricupero explica que, mesmo quando algumas decisões de política externa são justificadas pelas circunstâncias, elas compõem um mesmo padrão de adequação às linhas do PT e de culto à personalidade do presidente Lula.
OPÇÕES
A insistência do atual governo em receber o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, que havia suspendido sua visita de maio passado, é um caso de predomínio de convicções partidárias nas decisões de política externa. A opção de posicionar-se contra Bogotá em vez de atuar como um moderador, na polêmica gerada pelo acordo militar firmado pela Colômbia e os Estados Unidos, é outro exemplo.
Essa "crise do consenso", para Ricupero, também se traduziu no empenho do governo do presidente Lula pela adesão plena da Venezuela ao Mercosul e em sua omissão na controvérsia entre Argentina e Uruguai em torno de investimentos da indústria de papel e celulose na fronteira.
Ao longo dos últimos 6 anos e 11 meses, entretanto, esse dilema foi percebido e apontado nos três eixos da diplomacia - a ambição do Brasil por uma cadeira permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, a conclusão da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) e a construção de um espaço de preponderância brasileira na América do Sul.
Nenhuma das três prioridades foi atingida. "Nos dois primeiros eixos, o governo quer, mas não pode. No terceiro, o governo pode, mas não quer", arrematou Ricupero.
IMAGEM
Esse movimento, para o ex-embaixador do Brasil em Washington e um dos articuladores do Plano Real, não se restringe aos domínios da diplomacia. Alcança também áreas nas quais o governo Lula pretende imprimir e legar uma imagem própria para a história e, em um cenário de curto prazo, para os resultados das eleições gerais de 2010. No setor econômico, o que era um "pecado" no início do governo - a expansão dos gastos públicos - transformou-se em uma "virtude".
Para Ricupero, o papel dos bancos oficiais foi expandido, em consonância com o discurso em favor da maior presença do Estado na economia, e a tentativa de anulação da política de privatização do setor de petróleo - uma marca do governo Fernando Henrique - ganhou fôlego.
Na área de infraestrutura, desapareceram duas iniciativas do governo Lula que alçaram a imagem pública da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff: os leilões de privatização de rodovias e a Parceria Pública Privada. "Aplaudido, Lula liberou-se do compromisso de continuar a política econômica de FHC", avaliou.
Segundo ex-embaixador, radicalização teria objetivo de marcar a diferença entre a conduta do Itamaraty no governo Lula e a da era FHC
Denise Chrispim Marin, BRASÍLIA
Na reta final do mandato e diante da missão de eleger sua sucessora, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu uma guinada mais à esquerda em sua política externa. O contorno partidário - petista, obviamente - tornou-se inconfundível, assim como o uso de questões diplomáticas para fazer propaganda sobre a inserção internacional do Brasil e uma liderança que o atual governo teria conquistado. Observada ao longo dos últimos dez meses pelo embaixador Rubens Ricupero, essa radicalização de perfil teria o claro objetivo de, em tempos eleitorais e de fim de governo, marcar a diferença entre a política externa de Lula e a adotada nos oito anos da administração de Fernando Henrique Cardoso.
"O governo está moldando o perfil com o qual quer entrar para a História. A política exterior tornou-se mais identificada ao governo e também a seu partido, o PT. Não está mais identificada ao Estado", afirmou Ricupero ao Estado.
Em um balanço preliminar da política exterior do governo Lula, Ricupero lembrou-se de uma emblemática declaração de Tancredo Neves (1910-1985), presidente da República eleito em 1984. "Se há um ponto na política brasileira que encontrou um consenso de todas as correntes de pensamento, esse ponto é exatamente a política externa levada a efeito pelo Itamaraty", afirmara Tancredo. "Esse consenso não existe mais", completou Ricupero.
Atual diretor da Faculdade de Economia da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP) e presidente do Instituto Fernand Braudel, Ricupero explica que, mesmo quando algumas decisões de política externa são justificadas pelas circunstâncias, elas compõem um mesmo padrão de adequação às linhas do PT e de culto à personalidade do presidente Lula.
OPÇÕES
A insistência do atual governo em receber o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, que havia suspendido sua visita de maio passado, é um caso de predomínio de convicções partidárias nas decisões de política externa. A opção de posicionar-se contra Bogotá em vez de atuar como um moderador, na polêmica gerada pelo acordo militar firmado pela Colômbia e os Estados Unidos, é outro exemplo.
Essa "crise do consenso", para Ricupero, também se traduziu no empenho do governo do presidente Lula pela adesão plena da Venezuela ao Mercosul e em sua omissão na controvérsia entre Argentina e Uruguai em torno de investimentos da indústria de papel e celulose na fronteira.
Ao longo dos últimos 6 anos e 11 meses, entretanto, esse dilema foi percebido e apontado nos três eixos da diplomacia - a ambição do Brasil por uma cadeira permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, a conclusão da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) e a construção de um espaço de preponderância brasileira na América do Sul.
Nenhuma das três prioridades foi atingida. "Nos dois primeiros eixos, o governo quer, mas não pode. No terceiro, o governo pode, mas não quer", arrematou Ricupero.
IMAGEM
Esse movimento, para o ex-embaixador do Brasil em Washington e um dos articuladores do Plano Real, não se restringe aos domínios da diplomacia. Alcança também áreas nas quais o governo Lula pretende imprimir e legar uma imagem própria para a história e, em um cenário de curto prazo, para os resultados das eleições gerais de 2010. No setor econômico, o que era um "pecado" no início do governo - a expansão dos gastos públicos - transformou-se em uma "virtude".
Para Ricupero, o papel dos bancos oficiais foi expandido, em consonância com o discurso em favor da maior presença do Estado na economia, e a tentativa de anulação da política de privatização do setor de petróleo - uma marca do governo Fernando Henrique - ganhou fôlego.
Na área de infraestrutura, desapareceram duas iniciativas do governo Lula que alçaram a imagem pública da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff: os leilões de privatização de rodovias e a Parceria Pública Privada. "Aplaudido, Lula liberou-se do compromisso de continuar a política econômica de FHC", avaliou.
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