A disputa pelos royalties está caminhando para um acordo entre estados produtores e não produtores que colocará o Executivo contra sua própria base congressual, na defesa dos interesses da Petrobras e das demais companhias que exploram o petróleo brasileiro.
A solução de consenso parece ser a alteração do decreto que define o pagamento das participações especiais, mesmo que a Petrobras e o Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), que representa as companhias petrolíferas que atuam no Brasil, digam que isso seria uma quebra de contrato.
As participações especiais representam a parte a ser paga sobre o que as petroleiras ganham, similar ao Imposto de Renda, e que acabou na troca de regime de concessão para partilha.
Elas são baseadas em "grande produção ou grande rentabilidade", dentro do princípio de que produziu mais do que o normal, ou ganhou mais do que o normal, tem que pagar mais, progressivamente.
As companhias petroleiras alegam que os contratos estão ligados ao decreto de 1998, e uma mudança do decreto seria uma mudança nas bases do contrato, o que é ilegal.
A proposta dos estados produtores é baseada na alteração do cálculo das participações especiais, sob alegação de que as tabelas e as alíquotas não estão incluídas no contrato nem na lei, ao contrário, por exemplo, dos royalties, cujo percentual está expresso na lei.
Se fosse para congelar o decreto, por que não fizeram como no caso dos royalties e publicaram as tabelas?, argumentam os defensores da tese.
O fato é que os estados não produtores estão cada vez mais aceitando a proposta dos produtores, e, se fizerem uma aliança, o governo não conseguirá controlar no Congresso onde, historicamente, quando se entra em questões regionais, não há controle partidário, ou de bloco, nem voz unida.
Tudo indica que rolo compressor não funciona em matérias como essas. O governo pode vir a ter que escolher entre ele próprio e a Petrobras.
O nó político é que a saída que os estados produtores estão encontrando é aumentar as participações especiais dos campos atuais e distribuir também entre os não produtores.
Essa, aliás, era a saída para adaptar o regime de concessão ao pré-sal, sem precisar criar essa confusão política. A proposta foi feita até mesmo pelo IBP, que levou ao ministro Edison Lobão o apoio ao aumento das participações especiais em campos com elevado potencial exploratório, como as áreas no pré-sal.
É claro que eles estavam falando sobre campos ainda não licitados, mas os defensores da mudança imediata usam esse exemplo para dizer que é possível mudar o decreto.
Por sua vez, os estados não produtores não querem saber de esperar pelos supostos lucros do pré-sal em cinco ou dez anos, querem resultados imediatos, que só as PE podem dar.
A negociação virou um jogo de pôquer. No que o governo está apostando é que os estados produtores estão com uma espada sobre a cabeça, porque, se o veto do presidente Lula for a votação, ele deve ser derrubado, e eles perderão tudo.
Mas quem está com problemas parece ser o próprio governo, pois o texto que foi vetado acabou ficando muito mal escrito.
Os representantes do Rio já avisaram aos estados não produtores: se derrubarem o veto, a questão vai para a Justiça.
O texto vetado está cheio de inconsistências, sendo que uma é básica: quando a Constituição fala que cabe aos estados e municípios produtores participar do resultado da exploração, como compensação financeira, a única maneira de mandar dinheiro para o não produtor é a União dar através dos Fundos de Participação de Estados e Municípios.
Outra maneira de distribuição, como a prevista no projeto de deputado Ibsen Pinheiro e do senador Pedro Simon, seria inconstitucional.
Se o Estado do Rio não receber nada, quebra financeiramente e, meses depois, vai ter que parar de pagar despesas fundamentais como Segurança, Saúde, Previdência. Quem vai bancar esse ônus?
Os governadores Eduardo Campos, de Pernambuco, Marcelo Déda, de Sergipe, e senadores como Wellington Dias, que estão negociando pelos estados não produtores, estão se aproximando do acordo.
E o líder do PMDB Henrique Alves também está chegando a essa posição. Apesar de que esse aumento nas participações especiais vai certamente provocar uma corrida aos tribunais por parte das petroleiras, o risco desse recurso jurídico é percebido como menor do que o risco do embate federativo, que embute inclusive um risco social e político gravíssimo.
O senador Lindbergh Farias vai hoje à tribuna fazer um pronunciamento em nome dos estados produtores, reafirmando que é inaceitável alterar as regras em campos já licitados sob o regime de concessão, incluindo o pós e o pré-sal.
Além do princípio de preservação dos contratos, ele dirá que alteração nos campos licitados traria graves consequências imediatas às finanças públicas dos estados produtores.
Lindbergh defenderá a tese de que, dado o novo patamar de arrecadação advindo do pré-sal, os recursos oriundos da exploração de petróleo devem servir também para reduzir desigualdades regionais, portanto, parcela maior desses recursos deve ser destinada à repartição pelos estados e municípios não produtores.
A referência, lembrará, deve ser o acordo celebrado com o presidente Lula, na presença da então ministra Dilma Rousseff.
Como a produção do pré-sal não licitado só se tornará significativa a partir de 2016-2017, a proposta dos estados produtores é instituir uma regra de transição com a criação de um fundo a ser distribuído, desde já, para estados e municípios não produtores, com base nas participações especiais.
Lindbergh apresentará recente estudo do FMI que aponta o Brasil como o país que menos cobra entre uma dúzia de países, já excluídos os árabes, saltando aos olhos, segundo ele, a pouca progressividade com respeito ao preço do óleo e aos custos de extração, que seria justamente a função da PE no regime de concessão.
A forma como as tabelas progressivas foram fixadas não permitiu à PE "captar os ganhos extraordinários decorrentes da expressiva elevação dos preços, dentre outros fatores que melhoraram a produção e a rentabilidade na extração de óleo e gás no Brasil", na opinião dos estados produtores que o senador vocalizará na tribuna.
Logo, "o equilíbrio contratual, que foi perdido nesses anos, precisa agora ser recomposto".
FONTE: O GLOBO
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