De passagem por Paris, a presidente de todos os brasileiros, Dilma Rousseff, não perdeu tempo e anunciou a construção de oitocentos terminais de aeroportos nas cidades brasileiras com mais de 100 mil habitantes. Não foi mania de grandeza, mas acidente numa informação de dados que não cabem mais nas próprias fronteiras e fazem extra onde for possível. Por aqui, 283 cidades têm 100 mil habitantes e, na metade dessas, aviões levantam voo e descem normalmente. Menos, presidente. Menos ênfase. Dilma foi mais longe como candidata ao próprio lugar, para não deixar o concorrente pré-histórico desistir e jogar a toalha quando 2014 já está à vista. Ele, Lula, mantém preferência pelo tipo que faz desde que entrou em cena, no fim do século, e quer continuar como foi ao preço de ocasiões.
Não faltará oportunidade para Dilma Rousseff ratificar a ênfase ética, objeto de repúdio por parte do competidor, com quem não tem a aprender mais do que defeitos que as pesquisas de opinião deixam de lado para não perderem tempo. A aura que a classe média brasileira — a tradicional e não a que está chegando ainda sem jeito para a coisa — viu na presidente é a saída para o beco em que, pela via eleitoral, o país se meteu no começo do século, e a cercou de simpatia (o chá ficou de fora, pois ainda é costume restrito a uma parcela insuficiente de eleitores).
Afinal, 2014 vai ter, se tudo chegar até lá como está, um encontro de águas capaz de gerar uma pororoca histórica: de duas candidaturas fazer uma única, quando o outro é o próprio, não se pode desejar senão aquele cuidado equivalente ao caldo de galinha recomendado sempre pela garantia de que não faz mal a ninguém.
Quem conhece Lula, como é o caso da sucessora dele, deve ter o cuidado ao usar frase de efeito fora do contexto. Ele pode, ela não, vender gato por lebre quando fala em caça às bruxas a propósito de casos de polícia e intencional confusão entre público e privado, que a classe média não perdoa. Tem lá as suas razões. A temporada a que se referiu a presidente como de caça às bruxas foi de natureza ideológica e ocorreu quando a Guerra Fria exacerbou a expectativa do desfecho atômico entre Estados Unidos e União Soviética, nos anos 50. Era muito mais do que uma ação policial para comprovar corrupção endêmica, e não mais epidêmica, que se estabeleceu no Brasil, com raízes históricas, e resiste de dentro para fora.
No fundo do palco, o senador mineiro Aécio Neves botou as cartas na mesa, ao apagar das luzes de um ano que oferece estatísticas ainda não devidamente digeridas: deixou claro que está aí para dizer, com todo respeito, o que pode ser entendido desde já como mais do que um modo de observar. Este é o pior momento da economia brasileira desde o começo do século. Um PIB no diminutivo, um crescimento infantil de 0,7% em relação ao ano anterior, comprometedor de um país adulto pelo menos em economia. Fecha este ano um mísero 1% de crescimento econômico.
Não dá para sair e entrar na Historia com uma inflação que sobe como foguete enquanto os investimentos descem, avalia o senador mineiro, que lança a preocupação com os dois anos perdidos, este pior que o anterior. Fica subentendido que os fatos autorizam a elevar o tom crítico e modelam a candidatura mineira à República.
Não se trata, quando nada, de falar pela oposição afônica na matéria eleitoral, mas de vocalizar a classe média que dá a medida da necessidade política esvaziada pela crise moral que patrocina os costumes e envenena a democracia. Cada situação tem sua hora. E quem sabe ainda faz a hora.
Aquele leve toque de hesitação no começo das frases de Aécio Neves é o charme com que Minas — como dizia Leonel Brizola — costeia o alambrado da sucessão. O Brasil é o fecha-alas dos emergentes — Rússia, China, Índia — e o senador Aécio Neves mandou às favas o centro da meta onde a presidente Dilma Rousseff, inconscientemente por certo, localizou a inflação como o bezerro de ouro.
Fonte: Jornal do Brasil
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