Por Guilherme Serodio
RIO - O símbolo do anarquismo ostenta o muro branco ao lado do portão do campus da Praia vermelha da URFJ. A letra A envolta em um círculo também é vista em pichações ao lado de palavras de ordem na fachada da Câmara Municipal, da Assembleia Legislativa e de outros prédios do centro do Rio de Janeiro, além de figurar nas bandeiras pretas dos Black Blocs a cada nova manifestação.
A ideologia anarquista no discurso dos jovens que frequentam protestos no Rio ocupa o lugar deixado pela decepção com a política partidária. Entrevistados pelo Valor na última grande manifestação no Rio, no dia 15 - que resultou em conflito com a polícia e na prisão de 84 pessoas -, jovens e professores disseram não saber em quem votarão para presidente ou governador. Todos afirmaram não se sentir representados pelos principais pré-candidatos na eleição aos dois cargos em 2014.
Poucos partidos têm agido para reverter essa descrença e abrigar as demandas em seus discursos para a campanha e em ações concretas nos parlamentos estadual e municipal no Rio.
"As pessoas estão carentes, órfãs. Acho difícil essa molecada votar", diz o contador Arthur Leitão, 30 anos. entrevistado enquanto a polícia reprimia um manifestante com cassetete e sob as vaias de cerca de 400 jovens na Cinelândia. Leitão percebe a proliferação do discurso anarquista adotado pelos jovens Black Blocs como um escape para a decepção com a classe política. "Há um crescimento do anarquismo. [Mikhail] Bakunin, [Henry] Thoreau. Nunca tinha visto esses autores na rua", diz o contador que tem frequentado os protestos desde junho. "Mas os partidos identificados com a rua podem ganhar muito em cima disso", avalia, citando o PSOL e o PSTU.
O clima de decepção também é sentido entre os mais velhos. "Tenho vontade de anular [o voto]", diz o Analista de sistemas Sérgio, 43. "Só vejo uma turma de aproveitadores", afirma sobre os pré-candidatos à corrida ao governo do estado. Ao seu lado, a professora de história Elisabeth Rodrigues, 67, classifica a lista de pré-candidatos como "uma decepção total".
Mesmo Marina Silva, possível candidata à Presidência pelo PSB não é lembrada como uma opção de oposição ao status quo pelos manifestantes. Professora de nutrição da Unirio, This Salema, 34, votou em Marina em 2010 mas não sabe se vai repetir o voto. "Voto em quem busco acreditar. Não sei se a Marina é minha opção agora. Acho que ela perdeu com esse acordo com o PSB", critica. Para ela, a disputa ao governo do Rio é "um desastre". "Nessa não há ninguém em quem eu acredite".
Enquanto observa policiais atirarem bombas de gás, o ator Vítor, 27, afirma que já era hora de as pessoas tomarem as ruas. "O foco agora não são os partidos, mas como o povo está se comportando diante do panorama político", diz. Morador da Lapa, ele votou para presidente apenas uma vez, aos 16 anos, na primeira eleição do Lula. "Não me considero de esquerda. Não acredito em política", afirma, antes de assumir ter votado no deputado Marcelo Freixo (PSOL) na eleição à prefeitura em 2012.
Únicos partidos lembrados como opção de voto na oposição em 2014 por professores e jovens ouvidos pela reportagem, PSOL e PSTU prometem levar bandeiras das ruas à disputa pelo governo estadual. Os partidos devem lançar uma chapa única à disputa estadual que conte também com o PCB. A valorização do professor, a crítica aos gastos com a Copa e ao transporte público são citados por integrantes do PSOL.
"Falta dinheiro na saúde e educação. É uma vergonha o que se paga ao professor. Mas sobra dinheiro para esses sarcófagos de luxo", diz o ex-deputado federal Milton Temer (PSOL) sobre os estádios da Copa. "A esquerda precisa ter um candidato que possa confrontar tudo que é denunciado desse governo estadual nas ruas", defende Temer, possível candidato do partido ao Palácio da Guanabara.
Desde o começo dos protestos o PSOL se destaca por abrigar as demandas das ruas na Câmara e na Alerj. É de um vereador do partido, Eliomar Coelho, o pedido de abertura de uma CPI que investigasse os contratos das empresas de ônibus com a Prefeitura do Rio, em julho. Seu correligionário Renato Cinco é o autor do pedido de liminar - já revogada - que cancelou na Justiça a audiência da Câmara que aprovou a portas fechadas o plano de cargos e salários dos professores municipais em primeiro de outubro. Na Alerj, o deputado Marcelo Freixo já requereu mais de uma CPI para apurar irregularidades da administração do governador Sérgio Cabral desde o início dos protestos em junho.
Nas ruas, o PSTU tem voz entre jovens militantes e membros do Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação (SEPE), que comanda a greve da classe. "O partido vai levar para a disputa eleitoral a agenda das ruas, que em grande parte é a agenda do partido", diz o presidente estadual do PSTU Cyro Garcia, frisando que a lei do passe livre aprovada no Rio é da legenda. "Em relação ao transporte público, achamos que a CPI que está sendo feita no Rio vai dar em pizza", diz Cyro. "O que a gente tem que apoiar na voz que vem das ruas é a estatização dos transportes".
A resposta do PMDB, partido que detém a prefeitura da cidade e o governo do Estado, passa longe do diálogo. O governador Sérgio Cabral decidiu voltar atrás em decisões relacionadas sobretudo ao Maracanã, em julho. Mas vem apoiando a atuação da polícia, questionada por prisões arbitrárias e flagrantes forjados. Seu correligionário, o prefeito Eduardo Paes, afirma que não vai negociar com os professores em greve. Os professores pedem a revogação do plano de cargos e salários e a volta das negociações entre prefeitura e sindicato. O PMDB também detém a presidência da CPI dos Ônibus na Câmara, criticada por abrigar apenas vereadores governistas.
Fonte: Valor Econômico
2 comentários:
Essas atitudes vindas da parte de nossa população ocorre pelo fato de que realmente, políticos não querem se eleger para ajudar a população e sim se beneficiar de algo.
A cpi dos ônibus foi instituída de forma democrática. É natural a que a bancada seja composta pela maioria de pessoas ligadas ao governo por essa TER a maior representatividade dentro da Câmara. Acho que a oposição quis criar um circo pra angariar eleitores.
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