- O Estado de S. Paulo
O regime democrático pressupõe a existência e a independência entre si dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Pressupõe, também, que todo poder emana do povo e em seu nome deve ser exercido. Mas, infelizmente, não é isso que ocorre.
A disputa pelos cargos do Executivo e do Legislativo é feita em eleições marcadas pela forte influência do poder econômico e, uma vez eleitos, os "representantes" do povo, salvo exceções, se voltam para os próprios interesses e da corporação. Talvez incomode usar o "salvo exceções", mas a tal da governabilidade cria um conluio de interesses políticos voltados à preservação do poder, e isso desvirtua princípios e afasta esse poder da sua origem.
A disputa por cargos é a moeda de troca da governabilidade. O Executivo, que dispõe deles em profusão, distribui os cargos entre os partidos políticos e constitui a maioria que lhe garante governar sem maiores problemas. Isso cria estruturas burocráticas pesadas, com órgãos desnecessários, custosos e, por vezes conflitantes, que paralisam a ação de governo, voltando-o cada vez mais para dirimir conflitos e cuidar para que não perturbem o sistema estabelecido.
Os órgãos da administração direta e indireta (estatais, autarquias e fundações) são ocupados sem a devida competência técnica e política. Os escolhidos devem corresponder ao interesse do partido que os colocou lá e, por vezes servem ao interesse partidário para acomodar cabos eleitorais e outras menos nobres.
É crescente o custo da máquina governamental para satisfazer a governabilidade. São os prefeitos constituindo maioria nas câmaras municipais, os governadores nas assembleias legislativas e o Presidente da República na Câmara Federal e no Senado. Esse custo é suportado pela sociedade e reduz o montante de recursos que deve ser voltado para os interesses da população, especialmente no campo da educação, saúde, bem estar social e segurança. Multiplicam-se os casos de desvios, corrupção e a ética na política vai se esvaindo.
Dificilmente um governante, ao iniciar seu mandato, volta-se para os que o elegeram. Volta-se cada vez mais para o aparato institucional que o rodeia. Passa a governar para o dia a dia e perde cada vez mais a visão estratégica que um estadista deve ter.
Promessas de campanha vão sendo abandonadas e justificado o não cumprimento pela desculpa da falta de recursos. As manifestações de junho do ano passado, que atingiram em cheio o poder constituído independente de partido, expressaram a insatisfação da população com o que recebe em troca do que paga para mantê-lo. Os governantes, em resposta procuraram se defender colocando a culpa na falta de recursos. Novas promessas foram feitas. A mais ridícula delas foi a de "resolver" o problema da mobilidade urbana com R$ 50 bilhões, que o governo federal cederia aos Estados.
Além de não se falar mais no assunto, essa questão se agravou, pois a presidente continua a forçar a Petrobrás a subsidiar a gasolina, o que estimula o uso do transporte individual. Isso entupiu a Petrobrás de dívidas e reduziu pela metade o valor patrimonial da empresa. O desastre de Pasadena e os atrasos crescentes no programa do pré-sal e na superação da dependência externa dos derivados de petróleo marcam esse governo.
O fracasso na condução da economia, marcado pelo baixo crescimento, descrédito nas contas fiscais, rombo nas contas externas, aumento dos juros, inflação crescente, atraso nos investimentos, previsões macroeconômicas longe da realidade e uso populista das estatais caracterizam a incompetência e total ausência de visão estratégica, que infelizmente domina esse governo, cercado por uma base "aliada", que lhe dá a frágil governabilidade existente. Com tanto fracasso torna-se cada vez mais difícil governar e aumenta o poder de barganha dos "aliados".
Mas, será que pode existir outra forma dentro da democracia que evite e/ou minimize esses problemas? Talvez. Não quero ser idealista, mas penso que um bom governo é o que é reconhecido pelos seus atos pela maioria da população e, assim, caso obtenha sucesso em suas ações, esse reconhecimento se amplia, facilitando o diálogo político e a própria ação de governo.
Isso pressupõe competência técnica e política. Saber priorizar e executar com os recursos disponíveis as ações de maior alcance social, manter diálogo aberto com a sociedade visando informá-la sempre que necessário para esclarecer problemas que possam surgir e de medidas presentes e futuras. É sempre melhor fazer sem prometer do que prometer e não cumprir. Nada melhor do que o sucesso na ação para dar força política. Essa força não emana do poder institucional, que pode aprisionar, mas do interesse coletivo que é atendido. A política se move fundamentalmente de olho no sucesso ou insucesso econômico.
Eleições. Após a Copa as atenções vão se voltar à disputa presidencial. A herança do fracasso na condução da economia vai pesar no próximo mandato. O cenário externo não será favorável, pois a Europa luta para sair da estagnação, a China desacelera e os Estados Unidos se ergue de forma lenta e ainda duvidosa. Isso leva à continuidade da forte disputa internacional pela colocação dos produtos nos mercados. O País não se preparou para enfrentar essa disputa. Em nome do controle da inflação, o pé câmbio flutuante do tripé afundou faz muito tempo pela ação do Banco Central de forçar o câmbio a se manter valorizado para baratear o produto importado e frear as exportações.
As pesquisas de opinião ainda mantém a vitória em primeiro turno da presidente, mas as quedas na popularidade continuam. É provável a ocorrência de um segundo turno, com o crescimento natural dos demais candidatos, que passam no processo eleitoral a serem mais conhecidos. Em havendo segundo turno, o candidato que conseguir mostrar maior capacidade de fazer mudanças pode ganhar a disputa. Aí será testado se vai continuar essa forma de governo cercada pela governabilidade nos moldes que funcionaram até agora. O País merece um sistema político que possa ter o respeito da sociedade. A conferir.
Nenhum comentário:
Postar um comentário